Guilherme Belido Escreve - Nostalgia e saudosismo em bucólica noite chuvosa
02/12/2017 16:36 - Atualizado em 04/12/2017 14:40
Noite chuvosa, atmosfera bucólica no ar... tudo conspirando para recordações... e numa conversa transversa, que acabou derivando para outro assunto, vi-me, nostalgicamente, frente a viés – por assim dizer, costume – fortemente presente numa parte da minha infância e adolescência: o convívio frequente com pessoas bem mais velhas – o que não é comum.
Contudo, fácil de explicar: por circunstâncias de família, filho único do casamento, desde cedo ‘andava’ muito com meu pai que, por sua vez, contava 35 anos quando nasci.
Portanto, nos meus 12, 13, 15... beirava ele os 50, com ‘conhecidos’ e amigos na faixa de 40 a 70 – uns menos, outros até mais, coisa comum nas relações entre as pessoas.
Meus amigos, contudo, – aqueles da minha idade – dificilmente tinham contato com os bem mais velhos, senão na própria família. Entretanto, como mencionado, as circunstâncias assim fizeram... as quais guardo na lembrança com saudades.
Ocorria o seguinte: acostumado desde muito cedo frequentar jornal, alguns dias da semana saía do colégio e arranjava uma desculpa para aparecer em A Cidade. ‘Matava’ o almoço em casa e forçava a barra para almoçar com Vivaldo Belido, que praticamente só comia fora, não raro com um ou dois amigos.
E assim ia eu, de pidão, abelhudo mirim, para o Planície, A Francesa, Monte Líbano, Ponto Azul, Capital, Hotel Flávio, Palace, etc. Mas gostava mesmo do Planície – churrasco Pinheiro Machado.
Na verdade, Vivaldo Belido tinha reservas com isso. Queria que tivesse uma rotina “saudável”. Do colégio para casa, comida caseira, etc. Muitas vezes, brigava e mandava o motorista me levar embora. Mas, filho único... enfim... a tolerância era enorme.
E quando me botava pra casa, eu aparecia lá no final da tarde – até gostava mais – porque aí saía pra jantar, ficava mais tempo e encontrava com mais pessoas.
E tanto não teve jeito que o hábito de comer fora me acompanha até hoje.
O jeito de agir de cada um
É uma marcha à ré e tanto... Mais de 40 anos, quando aquele menino, curioso e metido a gente, se enfiava no meio daqueles senhores de terno e gravata e tentava entender do que conversavam...
Eram políticos, advogados, médicos, intelectuais, funcionários públicos, fazendeiros, comerciantes, jornalistas, empresários de diferentes áreas, contabilistas, poetas e gente que nunca soube ou não me lembro o que faziam – se é que ainda faziam alguma coisa
Com 15, já era ‘reconhecido’ – era o “filho de Vivaldo”, ou “filho de Belido”, e ficava todo bobo. Evidente, não participava das conversas. Só ouvia. Mas os mais atenciosos – simpáticos e generosos – me incluíam no papo e, claro, era desses que mais gostava.
Enfim, como não poderia ser diferente, essa gente teve influência na minha formação; e de tanto ouvir, e ouvir e ouvir as conversas sobre os mais diferentes assuntos, com predominância para a política, tinha que assimilar alguma coisa.
Não que o ‘aprendizado’ fosse dos temas focalizados – nada disso – mas do jeito de ser, de pensar, de agir, de reagir e do comportamento de cada qual. Absorvia a maneira geral com que cada um – e todos – se posicionava ante a vida.
Lista interminável
Quase que paro por aqui e deixo essa ‘coisa’ saudosista – que não é crônica... não é nada... é algo meio esquisito – para a próxima semana, no intuito de não cometer tantas omissões. Mas o adiantado da hora não permite. Então, vamos lá... sem distinguir nem mesmo os que ainda estão por aqui dos que já se foram, com as devidas escusas pelas omissões inevitáveis de última hora.
Traído pela memória, tem muita gente que não vou lembrar, inclusive entre os que mais gostava; até porque, daqueles que não gostava – que também não eram poucos – irei, mesquinhamente, pular de propósito.
Também devo ressalvar que não falo apenas dos ‘contatos’ do Centro da cidade, dos cafés e principalmente restaurantes, mas daqueles que se davam em lugares específicos, particularmente no Rio. Deixo de fora os que trabalharam ou frequentavam o jornal com assiduidade, porque aí não teria fim.
Como segunda ressalva, acrescento que com alguns desses, os quais conheci de calça curta, mantive o convívio anos afora... E alguns poucos, até hoje, quando os 56 anos pesam e deixam longe aqueles bons tempos em que tudo era festa.
Gente como doutor Edgard Alvarenga, médico afetuoso, de fino trato, todas as noites no Monte Líbano com seu inseparável blazer Príncipe de Gales e chapéu marrom; dr. Barbosa Guerra, também médico, que – arrisco dizer – muito contribuiu em minha educação. Coronel Vicente Vasconcellos, uma raposa, escola de vida, que tanta atenção dispensava àquele menino.
Chaquib Estefan, um diplomata, fidalgo nato, outro que estendia ao ‘filho de Vivaldo’ tratamento de gente grande e com quem tenho o prazer de manter vínculos até os dias de hoje. Falando nele e nos vivos, Rockefeller de Lima, uma simpatia ímpar, com seu elegante cigarro Charm e todos os demais traços de uma figura contagiante.
Bem... Alair Ferreira – aqui devo abrir parêntesis – nada de Centro, mas nos encontros no jornal, em seu escritório da Graça Aranha, no Rio, e nos almoços no Planície, talvez a pessoa que mais tenha me influenciado depois de meu pai e com quem estive, por mais de duas horas, num almoço no Clube Ginastico Português, uma semana antes de sua morte.
Nasme Farah Jaber, autodidata, também do Boulevard diurno, que fazia questão de ‘puxar’ minha opinião em assuntos para adultos. José Geraldo Assade – daquela ‘turma’, um jovem advogado, de quem me valia para que meu pai me deixasse ir ao cinema de noite. José Jaber, com seu super-esportivo Dodge Charger, que descia, imponente, a 7 de Setembro e estacionava defronte ao Império. Armindo e o irmão Antonio, do Sagres, também um jovem naquele grupo de senhores.
Impossível não citar: seu João Correa, jornalista, diretor da Folha do Commércio na época em que meu pai arrendara aquele jornal, uma das figuras mais polidas que conheci da vida, com seu tradicional terno Taylor 120, marfim; Fernando da Silveira, uma simpatia de pessoa, bem humorado, culto, que 10 anos depois viria a ser meu professor na Faculdade de Direito; Hécio Bruno, uma figura diferenciada e, entre os que convivi, o de maior conhecimento jurídico, que não se incomodava com minhas incessantes perguntas – parecia até gostar.
E mais e mais...
Caro leitor, o assunto, pra lá de cumprido, daria um suplemento. Logo, preciso encurtar (brincadeira falar em “encurtar”) e fechar como der. Mas afigura-me absurdo deixar de fora, entre outros, Heli Ribeiro Gomes, não do Centro, mas das visitas a Cambaíba, em noites seguidas de confraternização em volta da sinuca, em especial na pré-campanha para prefeitura (72), onde tinha, como companheiro de idade, Mauricinho Cordeiro, infelizmente falecido precocemente, filho de dr. Maurício Cordeiro, como meu pai, secretário do governo Rockfeller de Lima.
Enfim... do Centro, dali e acolá – mas da minha adolescência – me rendo ao rigor da falta de espaço que impede que a todos teça comentários personalizados, os quais seriam absolutamente pertinentes mas que, tão significativos quanto, cito Nilo Arêas, Manuel Luis Martins Neto – outro jovem daquele grupo –; Oswaldo, do Ponto Azul; Argeu, da Guarany; um senhor da Confeitaria Império que não consigo lembrar o nome (que me desculpem seus familiares, é questão de estar escrevendo no apagar das luzes); Irineu Marins, Divaldo Cunha – destacado advogado de sua época – dr. Ebenézer Soares Ferreira – nossa!... quanta influência na minha formação –; Yvan Senra Peçanha, José Maurício Linhares, irmã Maria das Graças, do Auxiliadora (será que estou acertando o nome de uma das pessoas mais doces que conheci na vida?), Percy Rangel, Jonas Lopes de Carvalho, Pedro Rufino de Carvalho, Almeida Gusmão, Benedito Marques, Cyro Braga, Fernando Gomes, Sérgio Siberath, Walter Sanz, Homero Braga, Pedro Manhães, Walter Siquera, Cehil Tinoco, Danilo Kniffes, Belcy Drumond e segue, e segue...
Por fim, registro, posto que não poderia deixar de citar, e com muito orgulho, Evaldo Ribeiro Gomes, meu tio, de quem sou único sobrinho; Eliane Auxiliadora Ribeiro Gomes, minha tia; Humberto Belido de Almeida, também meu tio, já falecido, e... já abusando do texto pessoal, Maria Edyr Ribeiro Gomes Belido, minha mãe, acerca de quem gostaria de ter tido mais contato.
Desculpe, leitor! Isso mais parece álbum de família. Mas, acho que tolerável desde que de 40 em 40 anos.

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