'Meus filhos escorregaram de minhas mãos', diz pai de menino sírio
bethlandim 03/09/2015 22:14

Foto chocante de menino morto revela crueldade de crise migratória

Corpo de garoto foi encontrado em praia turca após naufrágio. Jornal inglês questiona se poder da imagem fará Europa mudar política.

As imagens de um menino sírio morto numa praia da Turquia viraram símbolo da crise migratória que já matou milhares de pessoas do Oriente Médio e da África que tentam chegar à Europa para escapar de guerras, de perseguições e da pobreza.

O corpo do menino apareceu nesta quarta-feira (2) em Bodrum depois que duas embarcações com imigrantes naufragaram. Pelo menos nove sírios morreram, segundo a agência AFP -- outros veículos já citam 12. As duas embarcações haviam partido de Bodrum e tentavam chegar à ilha grega de Kos, anunciaram as autoridades locais.

A foto virou um dos assuntos mais comentados no Twitter e diversos veículos da imprensa internacional o destacaram como emblemática da gravidade da situação, até mesmo com potencial para ser um divisor de águas na política europeia para os imigrantes.

"Se estas imagens com poder extraordinário de uma criança síria morta levada a uma praia não mudarem as atitudes da Europa com relação aos refugiados, o que mudará?", questiona o jornal britânico "Independent". As fotos são "um forte lembrete de que, enquanto os líderes europeus progressivamente tentam impedir refugiados e imigrantes de se acomodarem no continente, mais e mais refugiados estão morrendo em seu seu desespero para escapar da perseguição e alcançar a segurança", acrescenta.

"The Guardian", outro jornal britânico, disse que as fotos levaram para as casas das pessoas "todo o horror da tragédia humana que vem acontecendo no litoral da Europa".

O americano "Washington Post"  classificou a imagem de "o mais trágico símbolo da crise de refugiados do Mediterrâneo".

Grave crise O mundo enfrenta a pior crise de refugiados desde a Segunda Guerra Mundial, segundo organizações como a Anistia Internacional e a Comissão Europeia. Mais de 350 mil imigrantes atravessaram o Mediterrâneo desde janeiro deste ano e mais de 2.643 pessoas morreram no mar quando tentavam chegar à Europa, segundo dados da OIM (Organização Internacional para as Migrações).

Quase 220 mil chegaram à Grécia e quase 115 mil, à Itália. Mais de 2 mil chegaram à Espanha e uma centena a Malta. O número no decorrer de 2015 supera com folga o total de 2014, quando 219 mil migrantes tentaram atravessar o Mediterrâneo.

A maioria dos migrantes que chegam à Grécia por mar são sírios em fuga da guerra em seu país. Entre os que chegaram à Itália, os mais numerosos são os eritreus.

A travessia do Mediterrâneo é feita em botes ou em embarcações superlotadas, sem os mínimos requisitos de segurança, por traficantes de pessoas. A viagem pode custar mais de R$ 10 mil por pessoa, o que torna o negócio altamente lucrativo - uma única embarcação pode render US$ 1 milhão.

O pai de Aylan Kurdi, o menino sírio de 3 anos que foi encontrado morto em uma praia da Turquia e cuja foto se tornou uma das mais representativas da crise migratória na Europa, falou nesta quinta-feira (3) sobre a tragédia. Abdullah Kurdi perdeu também a mulher e outro filho de 5 anos no naufrágio. "Meus filhos escorregaram das minhas mãos", disse à agência de notícias turca Dogan.

"Tínhamos jalecos salva-vidas, mas o barco afundou porque várias pessoas se levantaram. Carreguei a minha mulher nos braços. Mas meus filhos escorregaram das minhas mãos", contou ele.

Abdullah disse que a família pagou para atravessar da Turquia para a ilha grega de Kos duas vezes. “Numa delas, os guardas nos pararam. Aí fomos libertados. Da segunda vez, os organizadores não cumpriram com a promessa e não trouxeram o barco. Então conseguimos um barco por nossos próprios meios", relatou à agência turca.

Abdulla Kurdi, pai do menino sírio que morreu em naufrágio na Turquia (Foto: Arte/G1)

"Mas, depois de navegarmos 500 metros, começou a entrar água no barco. Nossos pés ficaram molhados. Criou-se um pânico, e quando as pessoas tentaram ficar de pé, a situação piorou", disse. Abdullah e a família tentavam reencontrar parentes no Canadá, embora o pedido de asilo tivesse sido negado, de acordo com o site "National Post". Após o naufrágio, na quarta-feira (2), Abdullah ligou para a irmã, que mora em Vancouver há 20 anos, e disse que seu único desejo é voltar para a cidade de Kobane para enterrar seus familiares e ser enterrado ao lado deles.

De acordo com ele, 16 membros de sua família que combatiam o grupo jihadista Estado Islâmico (EI) morreram na sua cidade natal.

Depois que o naufrágio se tornou público, o Canadá ofereceu asilo a Abdullah, mas ele afirmou que rejeitou a oferta, segundo a agência EFE.

"Recebi uma oferta do governo do Canadá para morar lá, mas depois do que aconteceu não quero ir. Vou levá-los primeiro a Suruç [cidade turca na fronteira com a Síria] e depois a Kobane, na Síria. Passarei o resto da minha vida lá", afirmou.

Apelo... O sírio também fez um apelo à comunidade internacional que faça o possível para evitar sofrimentos como o seu.

"Quero que o mundo inteiro nos escute e veja onde chegamos tentando escapar da guerra. Vivo um grande sofrimento. Faço esta declaração para evitar que outras pessoas vivam o mesmo", disse Abdullah Kurdi nesta quinta a jornalistas turcos diante do Instituto Médico Legal da cidade de Mugla.

Teema Kurdi, irmã de Abdullah, disse ao "National Post" que o pedido de refúgio havia sido negado em junho pelo Ministério da Cidadania e da Imigração do Canadá devido a complicações envolvendo os pedidos de refúgio para estrangeiros. Policial paramilitar recolhe o corpo de uma criança morta que apareceu em praia da ilha de Kos, na Grécia. Vários migrantes morreram afogados e alguns seguem desaparecidos após botes lotados naufragarem durante tentativa de chegar ao território grego (Foto: AP/DHA)

 

Nilüfer Demir disse ter ficado "petrificada" com a cena e contou que também viu Galip, irmão de Aylan, no chão, a 100 metros dali. “A única coisa que eu poderia fazer era tornar seu clamor ouvido. Naquele momento, eu pensei que poderia fazer isso ao acionar minha câmera e fazer sua foto”, afirmou a fotógrafa.

Demir cobre as imigrações na região há 15 anos. “Eu testemunhei muitos incidentes com imigrantes nesta região, suas mortes, seus dramas. Espero que isso agora mude. Fiquei chocada, me senti mal por eles. A melhor coisa a fazer era tornar sua tragédia conhecida.”

O primeiro-ministro da França, Manuel Valls, disse que a morte do menino sírio mostra a necessidade de ação urgente da Europa na crise migratória. "Ele tinha um nome: Alyan Kurdi. Ação urgente é necessária – uma mobilização da Europa inteira é urgente", escreveu Valls em sua conta no Twitter nesta quinta-feira.

Na quarta-feira, Itália, França e Alemanha assinaram um documento conjunto pedindo pela revisão das atuais regras da União Europeia sobre garantia de asilo e uma distribuição "justa" de imigrantes no bloco, informou o Ministério das Relações Exteriores da Itália

Solidária a dor desta família e de tantas outras...

O mundo precisa refletir...

Com afeto ,

Beth Landim.

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