Os que Dão... (Do Face ao Blog)
Murilo Dieguez 18/02/2015 07:46
- Alguns dias são especialmentes bons de acordar. Esta quarta feira é absolutamente um destes. Entre uns goles de café forte, abusando do WIFI da Florindo, na Pelinca, esbarro numa rede social, com esta peça magnífica. Esta remexida nas cinzas, pelo imortal José Cunha Filho; faz voláteis às minhas vistas; as Fênix, Medéias, Bobos, amizades, delícias, muitas "traquinagens e traquitudes¹" e as delíciosas bulinagens nas "Fhadinhas juvenis" de nossas memórias momescas, quase recentes. Zé; meu carnaval foi todo "rebrincado" neste seu texto. Isquindô lelê véi...
Os Que Dão... José Cunha Filho - Tô com sono! E medo dos índios! Vambora! - Ainda não passou o último bonde! Vai sair agora o “Deixa que Eu Chuto” com Zazau fantasiado de chinesa, espera mais um bocadinho... - Só se me der mais algodão doce. Era domingo de carnaval? Campos inteira aglomerada na Praça das Quatro Jornadas pra ver passar os cordões, os blocos de índio, a velha Santa Casa iluminada tendo ao lado a Igreja Mãe dos Homens, fechada. Com o padreco escondido numa das torres vigiando os pecadores e, principalmente, as pecadoras a desfilar em carro aberto no corso. Que ia e vinha pelo circuito que incluía a Alberto Torres e a praça principal. Um palmo de coxa a descoberto e... - Vou sair no sujo. Acabaram de formar uma boneca lá no Turfe, tem até porta-bandeira! - Boneca com porta-bandeira, onde se viu? - Pior! É macho e tá levando o estandarte com a pintura de um jacu num toco. O nome do bloco é “Há Jacu no Pau” - Não passa! Nem chega no Jardim São Benedito! A polícia especial prende e baixa o cacete em todo mundo! - Tem nada errado, cabrunco de cara ranheta! Jacu é uma ave, sua besta! Já vi no dicionário. Lá diz que é uma “ave galiforme”. - Sei, explica isso pro locutor da rádio que vai dizer o nome do bloco na hora que ele passar no centro. Se passar... E não é que passou?! O locutor fingiu que não viu. Um farrancho atrás do estandarte, milhares de “clóvis” a bater tamborim, um que outro pierrô a pinicar uma viola de brinquedo e vamos que vamos. Com direito a soldado da policia especial. Capacete branco feito de penico e tudo mais. Batucada, não escola de samba. Atrás, boi pintadinho com condutor repleto de cachaça e direito a paradinha pra alma do boi esvaziar a bexiga. Tome rodouro metálica no ar, colombina de vidro pra cheirar no lenço amarrado no punho, aquele zumbido de fim de mundo, os clarins anunciando os blocos de salão, “Almirantes” do Saldanha, “Caveiras” do Automóvel Clube e era tudo uma festa só. Levava-se hora e meia para atravessar a praça e chegar ao Boulevard. Quem não gostava do carnaval preferia rir com a sessão comédia gigante no Trianon. Com direito a, no escurinho do cinema, trocar a lança-perfume pelo toque macio dos seios úmidos da namoradinha, recém-saídos da espuma do De Millus. Passou. Criaram regras e normas, desfiles oficiais e lá se foi o improviso, a brincadeira, a originalidade, a criatividade. Sumiram, esfumaram-se blocos, escolas de samba, o corso, os ranchos, os cordões, os bois pintadinhos. Durante algum tempo, ainda se brincava sem regras e preconceitos, brigas e furdunços na então tranquila São João da Barra onde não havia desfiles oficiais. Com passeata de mascarados que durava quatro dias e noites, gente indo e vindo pela avenida principal. Em silêncio uns, outros buzinando, alguns de quepe de capitão de fragata braços dados com os vestidos como cafetão de gravata. Confundir dá zebra. Só nos resta torcer e esperar pelo último bloco a desfilar, orgulhoso porta-estandarte a anunciar que “Os Que Dão Vem Atrás”. Virão?
[caption id="attachment_7796" align="alignleft" width="100"]José Cunha Filho José Cunha Filho[/caption] . Jornalista, cronista e escritor imortal da Academia Campista de Letras(ACL) e autor dos livros de crônicas “O Lornhão de Bauxita” (1990) e “Morte na Redação”(2000)
. Traquitudes¹.: Dialeto Gargauês

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