Reerguer a história
lucianaportinho 24/01/2013 08:33

[caption id="attachment_5647" align="alignright" width="390" caption="Ft. Phillipe Moacyr"][/caption]

O Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, através da 2ª Promotoria de Justiça de Tutela Coletiva do Núcleo Campos, emitiu parecer sobre a demolição do antigo Casarão, localizado na esquina da Rua Treze de Maio com Saldanha Marinho. O documento assinado pelo promotor de Justiça Marcelo Lessa considera a demolição do prédio, avaliado como patrimônio histórico de Campos, como “fato criminoso que parece se adequar ao tipo do art.62 da Lei nº 9.605/98” e solicita certidão de inteiro teor do imóvel para que se saiba quem é o atual proprietário, além de indicar que através de ação civil pública pedirá a reconstrução do imóvel “tal como era antes”, caso se configure por inteiro o ato ilícito.
No despacho, datado do dia 16 deste mês, Marcelo Lessa solicita “buscas físicas, examinando inquérito por inquérito, armário por armário” para que o inquérito civil nº 236/03 seja remetido com urgência ao MP. Ele pede que se oficie ao cartório do registro de imóveis, para que seja expedida a certidão de inteiro teor. Este tipo de certidão corresponde a um raio X do imóvel. Nela, se saberá quem é o atual proprietário e quando este último adquiriu o casarão, demolido sem autorização do poder público municipal, durante a noite do sábado, dia 5, deste mês, como noticiou anteriormente a Folha.
O objetivo final do despacho do promotor, com múltiplas solicitações, sugestões e recomendações apontam para a reconstrução do imóvel demolido, visto que os indícios sugerem que foi demolido à revelia de decisão judicial, inclusive sem autorização do Município. Ainda, indica pedido de “indenização pelos danos ao patri-mônio histórico”.
Para Orávio de Campos, presidente do Conselho de Preservação do Patrimônio Municipal (Coppam), a medida do MP cor-responde exatamente ao pensamento do conselho.
— É uma decisão que respalda a manifestação da maioria absoluta dos representantes da sociedade civil presentes naquela reunião, também histórica, do Coppam e do Concultura, no Teatro de Bolso [também na última quarta-feira]. Defendemos que o ato de demolir foi uma evidente desobediência civil. A medida da reconstrução reclamada é drástica. Que sirva de exemplo, para que não se brinque com o patrimônio cultural e histórico — frisa Orávio.
Mesmo que a reconstrução do prédio se confirme, os debates que envolvem o tema preservação histórica não serão encerrados. É que o assunto se mostra amplo e complexo para os pesquisadores, que avaliam a questão da autenticidade dos prédios. Para o coordenador do Centro de Me-mória Fotográfica de Campos, Leonardo Vasconcelos, a reconstrução é um equívoco.
— A reconstrução seria a edificação de um falso histórico, uma arbitrariedade. O que adianta levantar uma construção co-mo a anterior se não houver uma função para o prédio? Temos um exemplo de reconstrução em Campos na Formosa, esquina com São Bento, que é horroroso e sem funcionalidade. Em casos como esse o local deveria ser transformado em espaço público. Sou frontalmente contra a reconstrução — expôs.

Interesse por réplica não é unanimidade

Também contra reconstruções de prédios antigos, o arquiteto Humberto Neto Chagas disse que uma punição ao proprietário seria o bloqueio de novas construções no espaço. Para ele, o valor histórico e estético já foi perdido.
— Existem vários autores e documentos internacionais que tratam a reconstrução como a criação de um falso histórico. É como se estivéssemos criando um clone — comparou.
Mestre em Artes pela Universidade Federal do Espírito Santo (UFES), na linha de pesquisa “Patrimônio e Cultura”, Humberto citou o teórico italiano Cesare Brandi, referência em restauração. No trecho do livro “Teoria da Restauração”,  ele diz que “A cópia é um falso histórico e um falso estético e por isso pode ter uma justificação puramente didática e rememorativa, mas não se po-de substituir sem dano histórico e estético ao original”. Como exemplo, ele indicou o Campanário de São Marcos, em Veneza, que para Humberto tem um valor didático e não histórico.
Por sua vez, Leonardo Vasconcelos afirmou que é preciso fazer uma triagem dos imóveis que merecem ser preservados a todo o custo. “Porém, não se pode simplesmente obrigar o proprietário a preservar sem saber se ele tem condições de fazer isso. Quem é que vai bancar o custo de preservação/ manutenção? A Prefeitura tem feito isso com os prédios sob seu cuidado? São questões que precisam de reflexão”, pontuou.
Segundo o secretário municipal de Cultura, Orávio de Campos, todos os prédios históricos sob responsabilidade da Prefeitura estão sendo mantidos.

Luciana Portinho e Talita Barros

* Capa da Folha Dois, ontem 23/o1/13.

 

 

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

    Sobre o autor

    Luciana Portinho

    [email protected]

    BLOGS - MAIS LIDAS