Hoje Na Curva: Abstinência
Suzy 04/07/2012 14:34

Ela levantou no meio da noite. Fazia tempo que não conseguia dormir. Como nas outras madrugadas, ligou a TV e viajou com o controle pelos 100 canais disponíveis. Nada lhe interessava. Ligou o Iphone: todas as músicas pareciam fazer sentido demais. Desistiu. Começou a andar pela casa, perseguida pelo som de seus próprios passos.

Na cozinha, tentou a geladeira, mas nenhum doce tinha sabor, o leite não trazia o sono, a água não saciava sua sede. Nenhum congelado conseguiu aplacar sua – falta – de fome. Ainda assim tentou pegar o copo – um suco talvez... – mas os tremores de suas mãos o derrubaram. Estava derrubando tantas coisas ultimamente. Sabia que uma hora aquilo teria que melhorar, só não imaginava quando.

Pensou em ligar para o psicólogo, mas àquela hora não havia dinheiro que pagasse. E também iria ouvir o que? “Isso passa” “Os primeiros dias são mais difíceis”. Esse discurso sabia de cor e, embora ficasse registrado em sua mente, até o momento tinha pouca, ou nenhuma, eficácia na prática.

O barulho do copo ecoou madrugada a fora. O cachorro do vizinho começou a latir desesperadamente e, com sinceridade, se tivesse uma arma dispararia contra ele. Cachorro enlouquecido enlouquecia ainda mais sua cabeça. O coração disparou sem razão. Tomaria outro calmante? Talvez junto com o remédio de enxaqueca. Será que faria mal com o vinho tomado antes? Estava com jeito de que iria terminar como as estrelas de cinema – overdose de medicamentos e bebida. Morta e mal falada.

Ainda bem que não bebera o suco, as náuseas agora eram intensas. Quase chorou, mas não tinha mais lágrimas. Sentiu sono. Deitou-se mais uma vez. Do cochilo, despertou assustada. Também, dormir como? Tinha sono o dia inteiro para a noite vagar, acompanhando a despedida da lua e a chegada do sol. Pensou em parar de pegar sol, com tanto que se fala em câncer de pele, sabe-se lá. Deus! Estava ficando paranoica total.

Não aguentava mais. Parava outro dia, talvez daí a um mês, um ano, talvez a vida se encarregasse de desintoxicá-la. Começou a procurar. Onde estava? Não conseguia encontrar. Queria pela última vez. Só mais uma vez, jurava para si mesma. A última, a penúltima, mas necessitava como o ar que ainda conseguia respirar.

Pegou o celular. Parou. Por hoje não. Não ligaria para ele.

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    Suzy Monteiro

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