Sob o tapete do Porto do Açu
Aluysio Abreu Barbosa 11/02/2017 23:12 - Atualizado em 15/02/2017 12:04
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“Suspeita-se que tenha muita sujeira debaixo do tapete (...) Vamos investigar!” É isso que o deputado estadual Bruno Dauaire (PR) diz pretender com a CPI das Desapropriações para a instalação do Porto do Açu, que propôs e deve presidir na Alerj — tema de reportagem investigativa do jornalista e ex-deputado Fernando Gabeira, que a GloboNews exibe neste domingo (12). Alternando a veemência, sobretudo para falar do líder Anthony Garotinho (PR), Bruno também analisou o momento presente e possibilidades futuras da política campista e sanjoanense.
Folha da Manhã – O deputado federal Paulo Feijó (PR), que vinha se distanciando do ex-governador Anthony Garotinho (PR) desde a votação do impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff (PT), em abril de 2016, recentemente abriu diálogo com o prefeito Rafael Diniz, a quem se dispôs a ajudar. E você, estaria disposto a dialogar e ajudar o novo governo de Campos?
Bruno Dauaire – Assim que os novos prefeitos assumiram, eu mantive a mesma conduta que tive com os prefeitos que saíram, que foi colocar meu mandato à disposição. Essa é a minha linha política, fazer do meu mandato um instrumento capaz de conquistar benefícios para a população. Não me interessa qual a sigla partidária do prefeito, minha obrigação como parlamentar é atender quem está lá na ponta, que é o cidadão. Só não tem a minha ajuda o prefeito que não quiser e estiver amarrado em uma política ultrapassada.
Folha – Como foi à conversa que você e Rafael mantiveram na tradicional festa de Santo Amaro? Ela rendeu algum resultado prático? Sobre o que falaram?
Bruno – Foi um encontro rápido em dia de festa e de devoção. Foi uma conversa cordial, como sempre tivemos, mesmo antes de exercermos nossos mandatos. Lembramos da convivência política da minha família e a de Rafael, uma vez que meu avô, Alberto Dauaire, foi contemporâneo político de Zezé Barbosa. Me coloquei institucionalmente à disposição pelo povo de Campos.
Folha – Como está sua relação com Garotinho? Você é muito ligado ao filho dele, Wladimir Matheus, que estaria tendo cada vez mais discordâncias com o pai, pela maneira personalista como este conduz seu grupo político. No que você acha que poderia ser diferente?
Bruno – Minha relação com o presidente estadual do PR, Garotinho, é boa e está muito tranquila, até porque comungamos das mesmas ideias em relação ao pacote de maldade do Governo do Estado. Ele tem se posicionado firme em defesa do servidor e está muito preocupado com a situação de calamidade do Estado. Inclusive tem apresentado nas reuniões de trabalho algumas sugestões para a saída da crise sem penalizar a população e os servidores. Quanto às discordâncias, sempre haverá pensamentos diversos. Afinal, é um partido vivo e em movimento, em que todos precisam colocar as suas opiniões, nada mais do que isso.
"Não vou aumentar desconto do servidor" (Bruno Dauaire)
Folha – Independentemente das eventuais discordâncias, como líder da bancada do PR, você vai votar de acordo com a determinação de Garotinho, contrário às propostas do governador Luiz Fernando Pezão (PMDB) que serão votadas na Alerj no correr da semana. Os demais deputados do PR seguirão sua orientação?
Bruno – Eu entendi e acatei as vozes das ruas, por isso voto contra o pacote. Vou orientar a minha bancada pelo voto contrário ao pacote do Pezão. Não vou mudar minha postura política depois de dois anos de um mandato, que generosamente tem sido bem avaliado pela população. Respeito meus colegas deputados que, para enfrentar a crise, pensam de outra forma. Mas eu não poderia votar a favor de um projeto que quer fazer de fiador de má gestão um inocente que é o povo. Quem quebrou o Estado foram eles. Não vou aumentar desconto de servidor e diminuir salários de categorias que já estão sem aumento há muito tempo. Quanto à Cedae, tem aí um fator histórico agregado, é uma empresa que gera recursos e tem um patrimônio bilionário e que não pode ser negociada em uma canetada.
Folha – Com o quadro falimentar do Estado, ser do contra ajuda? Quanto pior administrativamente ao atual governo, e consequentemente à população, melhor politicamente para quem ainda sonha em voltar ao Palácio Guanabara?
Bruno – Foi ao contrário, foi uma década perdida de má gestão, onde o “pior administrativamente” foi escondido debaixo do tapete para facilitar a permanência deles no Palácio Guanabara. No meu ver foi fraude eleitoral, que serviu apenas para fins de eleição. Esqueceram da população. Aumentaram despesa, se endividaram até não poder mais, abriram mão de receita e não criaram novas receitas, além de acabarem de forma criminosa com fundos vitais, como o Rioprevidência. Esconderam a realidade para o povo, o povo tinha o direito de saber. Não existe torcida, este modelo de governança que está aí é causa e efeito e o único responsável pelo quadro falimentar que se encontra o Estado do Rio. Hoje, nós da oposição somos os que mais apresentamos alternativas para ajudar o Estado.
Folha – Se vai votar contrário às propostas de Pezão, qual seria, em seu entender, a solução para o Estado do Rio? Como e por que ele chegou ao atual ponto?
Bruno – O primeiro passo é estancar o mau uso do dinheiro público. Lógico que a mudança é estrutural, mas já comecei a fazer a minha parte, naquilo que me compete, ou seja, na prática estou fechando as bocas de lobo que queimam o dinheiro público. Aprovei por unanimidade no parlamento uma lei que acaba com os incentivos fiscais fraudulentos, recheados de vícios e desvio de finalidade. Serão milhões que deixarão de sair e outros milhões que poderão ser recuperados judicialmente. Outra medida é a repatriação e recuperação do dinheiro desviado para os cofres públicos que tem sido oriundo de corrupção. Apresentamos um projeto na semana passada sobre isso. E aí vai ter que devolver dinheiro para a Previdência, para servidores, para prefeituras. Fui também autor de uma emenda que estendeu aos municípios a possibilidade de aumentar a sua receita, através da compensação de ICMS com as concessionárias do Estado. Consegui que prefeituras acolhessem responsabilidades do Governo do Estado, como o restaurante popular e outros serviços, para não serem interrompidos.
Folha – Com a prisão do ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB) pelo juiz Sérgio Moro, e do ex-governador Sérgio Cabral e do empresário Eike Batista pelo juiz Marcelo Bretas, acredita que há algum líder político do PMDB fluminense, no grupo iniciado lá atrás por Garotinho, e depois abandonado por este, que esteja dormindo tranquilo? Na condição de deputado próximo ao presidente da Alerj, Jorge Picciani (PMDB), como está o clima na cúpula da política fluminense?
Bruno – Não tenho intimidade com os políticos do PMDB em relação ao problema e acho que eles nem teriam liberdade comigo para tocar neste tipo de assunto. Afinal, sou um deputado novo, de oposição e estamos de lados opostos. Quanto ao presidente Jorge Picciani, ele tem sido sempre acolhedor, respeita a minha postura política e o meu voto no plenário, mesmo quando diverge da sua posição. Afinal, ali é o parlamento, onde as ideias diferentes se enfrentam democraticamente e tem que ser assim.
Folha – Nos meios jurídicos, políticos e midiáticos, há quem diga que Marcelo Bretas é ainda mais rigoroso do que Sérgio Moro? Comunga dessa opinião? Por quê?
Bruno – Existem vários mitos em relação a juízes. Não consigo avaliar e nem comparar o rigor entre eles. Seria leviano. Só sei que ambos são da mesma escola jurídica e estão rompendo paradigmas. São momentos singulares pelos quais passa a história política do nosso país e somente a história, com seu devido tempo, vai poder avaliar melhor esses perfis. Mas que no Estado do Rio o quadro de corrupção é pior que nos demais estados, isso é verdade. Talvez isso possa estar relacionado a um rigor maior do juiz carioca.
Folha – Por conta da Operação Chequinho, na denúncia de utilização de Cheque Cidadão na compra de votos na eleição municipal de Campos, Garotinho já entrou com pedido de habeas corpus preventivo no Tribunal Regional Eleitoral (TRE). Acredita que ele possa ser preso novamente? Por quê?
Bruno – Diferente de Sérgio Cabral, que foi preso acusado por corrupção, lavagem de dinheiro etc, a prisão de Garotinho foi por questão eleitoral e que aconteceu em um momento muito confuso, tanto que o plenário do TSE entendeu de modo diverso. Decisão judicial se cumpre. Porém, como advogado, não vejo qualquer elemento para uma nova prisão.
Folha – O que também tem tirado o sono de muita gente, nos meios políticos e empresariais, é a CPI das Desapropriações do Porto do Açu, que você propôs e, se aprovada, deve presidir. O jornalista e ex-deputado Fernando Gabeira levará ao ar um programa sobre o caso, neste domingo, na Globo News. Qual será o rito da CPI e o seu objetivo?
Bruno – Vamos esperar a publicação e consequente aprovação da CPI para que o rito seja iniciado. O projeto de resolução que apresentei prevê 90 dias, prorrogáveis por mais 60, para a conclusão do trabalho. É preciso que muita coisa seja explicada desse processo estranho e truculento das desapropriações em São João da Barra. Suspeita-se que tenha muita sujeira por debaixo do tapete. Ainda tenho esperança que os pequenos produtores do quinto distrito e os cofres do município sejam devidamente indenizados. Vamos investigar!
Folha – Em entrevistas a várias emissoras de TV aberta, como InterTV RJ, SBT e Record, você tem deixado claro não ser contra o Porto do Açu, fundamental à economia da região, mas à maneira como ele teria sido imposto, com indenizações bem abaixo do valor real pagas aos donos das terras desapropriadas. Quem deveria pagar a diferença: O Estado, a Prumo, outras empresas? E de que soma de dinheiro estamos falando?
Bruno – Não sou contra o Porto do Açu de forma alguma. Sua contribuição para a região é indiscutível. A questão é exatamente essa, a forma como foram feitas as desapropriações e que tipo de facilitações ocorreram. Quem deve pagar a diferença são os responsáveis por essa covardia, sejam eles quem forem. Estamos falando é de uma área cheia de vida e muito extensa, com valor de R$ 2 bilhões, que foi desvalorizada para poucos milhões de reais por um suposto esquema denunciado pela PF.
"Política de Campos sem novidade a curto prazo" (Bruno Dauaire)
Folha – Além da questão do preço defasado pago na desapropriação das terras para a implantação do Porto, desde que assumiu a parte da LLX no Porto do Açu, a Prumo, com sede nos EUA, tem sido alvo de muitas queixas pela postura “imperial” e a falta de interação com a comunidade na qual se instalou. Concorda com essa visão? Por quê?
Bruno – Concordo que a empresa precisa interagir melhor com a comunidade. Se faz, é em grau muito pequeno. Ela pode e deve desempenhar um importante papel social para São João da Barra e região. Não pode ser isolada do restante da região. O Porto do Açu é da nossa região e não a nossa região que pertence ao Porto. Uma das questões que merecem destaque é o conteúdo local com a contratação de trabalhadores e empresas locais. E, obviamente, uma melhor parceria com as prefeituras da região.
Folha – No grupo de Garotinho, não há nada que garanta que você vá ter novamente o apoio integral de Wladimir, considerado fundamental em sua eleição. Aventa-se que, dependendo da conjuntura, o próprio filho de Garotinho possa concorrer à Alerj em 2018. Do outro lado, há o grupo de Rafael, com alguns nomes já se colocando à disputa de deputado estadual. Por onde tentará sua reeleição? Corre o risco de ficar sem espaço?
Bruno – Meu espaço é consequência do trabalho que desempenho. Estou exercendo um mandato tão intenso, tanto em plenário, como nas comissões que presido, ao ponto de não pensar ainda em eleição, mas existe uma leitura diferente e mais atualizada, feita por pessoas que estão mais próximas do meu convívio e do convívio de Wladimir. Agora, uma reeleição está fundamentada em três pontos: compor partido, apoio político e atuação parlamentar. Graças a Deus, minha atuação como deputado tem se expandido e tenho conquistado novos espaços. Estamos formando um grande arco de alianças com pessoas que foram eleitas em diversos municípios ou foram bem posicionadas eleitoralmente. O que me empolga muito são os segmentos da sociedade e entidades civis espalhadas pelo Estado que estão reconhecendo o meu trabalho e minhas posições. Esse eleitor não pertence a partido e nem às lideranças. Acho que na eleição de 2018 haverá muito voto de opinião. O eleitor está mais atento e mais exigente.
Folha – Com a situação jurídica complicada de Garotinho, confinado num apartamento do Flamengo, no Rio, proibido pela Justiça de voltar à sua cidade natal, e algumas queixas surgindo sobre o governo Rafael, parece haver espaço para uma nova oposição em Campos. Concorda com essa visão? Se espaço vazio é espaço ocupado, quem poderia preencher essa aparente lacuna? E como?
Bruno – Você disse bem, a lacuna é aparente. A política municipal em Campos não aponta para uma novidade política a curto prazo. O ex-governador, mesmo ausente temporariamente, pelo seu histórico e currículo, é a liderança de oposição. Porém, as referências de oposicionistas e governistas, essas sim vão sendo reveladas pouco a pouco e ocupando cada um o seu quadrado. Não existe espaço vazio em política.
Folha – E em São João da Barra, berço político tradicional da sua família? Muito popular, a prefeita Carla Machado (PP) começa a fazer uma administração aparentemente melhor que a de Neto (PMDB), tarefa em parte facilitada pelo contraste com a desastrosa administração anterior. Acredita que os Dauaire possam recuperar o protagonismo no município que já foi governado por seu pai e seu avô? Como?
Bruno – Não se recupera aquilo que não se perdeu. Meu pai ainda é o maior protagonista da oposição em São João da Barra, mesmo ele não querendo ser. Quem falou isso foram as urnas. Na eleição de 2012, afastado do poder, ele teve mais de 10 mil votos e na última disputa entre Carla e Neco, o ex-prefeito, concorrendo à reeleição, não chegou à votação que o meu pai teve em 1997. Agora, não seria justo fazer uma crítica a uma gestão que começa, até porque podem confundi-la com uma defesa da administração anterior, mas eu espero que a atual prefeita mude o modelo político que ela implantou e que perdura por dois mandatos dela como prefeita e uma do seu candidato Neco. Ou seja, é a mesma coisa há 12 anos. O mundo mudou, evoluiu, e o governante tem que estar antenado, em permanente capacitação. O governo de São João da Barra voltou no tempo. Aonde levou este modelo político atualmente? Em pleno 2017, desemprego, e os políticos celebrando conquistas antigas, garantidas desde 1997, que foram destruídas gradativamente. Vai da retirada de lixo, da comemoração de pagar o servidor em dia, passando por transporte de estudantes e por aí vai, até ao funcionamento da Santa Casa. Algo que é um direito conquistado pelo povo há décadas e que se perdeu. O modelo tem que mudar, não podemos ser a Venezuela do Norte Fluminense. O que eu puder ajudar vou ajudar, sem pensar em protagonismo ou antagonismo.

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