Guilherme Belido Escreve - Há 40 anos um jornalista visionário fundou a Folha
06/01/2018 18:10 - Atualizado em 08/01/2018 13:48
A Folha da Manhã nasceu na década mais transformadora e revolucionária do século XX. No mundo inteiro, os anos 1970 foram os novos portais até então impensados e o Brasil não se acanhou ante aqueles tempos de modernidade, realizações e reformas.
‘De cara’ veio o tri da Copa do Mundo – um marco para a ‘paixão nacional’ que colocou o futebol do Brasil em patamar único. Outro orgulho, a Ponte Rio Niterói – na época lembrada como a “8ª maravilha do mundo”.
Década, ainda, em que o País deu os primeiros passos rumo à redemocratização, tempos de emancipação da mulher, de desbravamento, do encontro do romântico com o objetivo e de grande frenesi no mundo cultural e no cenário sócio-econômico.
Diga-se, uma década diferenciada não apenas por ter feito florescer os novos conceitos iniciados em 60 mas, em especial, como precursora dos valores de modernidade que iriam mudar o planeta nos 20 anos seguintes.
O leque de transformações, notadamente na cultura, confere aos anos 70 condição de divisor de águas em particular da 2ª metade do século passado.
Assim, também a Folha da Manhã, criada em 1978, absorveu essa atmosfera de mudanças sendo, em parte, fruto da metamorfose iniciada no início da década.
Fácil entender, muito embora o Brasil tenha experimentado grande desenvolvimento industrial dos anos 30 aos 50, as duas guerras e os regimes ditatoriais da 1ª metade do século inibiram os avanços sócio-político-culturais na maior parte do mundo, não sendo diferente em nosso País, que igualmente se viu refém desses entraves.
Com efeito, se os anos 50 e 60 foram de reconstrução da Europa pós-conflito, de realinhamento dos Estados Unidos perante a Guerra Fria e de instabilidade política no Brasil, – a década de 1970 foi a que rompeu as barragens e libertou os anseios sociais e culturais que se viam represados.
Emancipação e revolução sexual
Vale sublinhar, até mesmo a pílula anticoncepcional, que começou a ser comercializada no Brasil nos idos de 1960, delimitando um novo comportamento que iria pautar as gerações futuras – marco da revolução sexual e emancipação feminina – precisou de considerável tempo de maturação para superar as dúvidas, a inibição e a camuflagem observada na fase inicial.
A pílula contraceptiva, muito embora uma realidade, enfrentou dilemas. Movimentos advertiam que o remédio era fruto de um complô para conter o aumento populacional de grupos marginalizados. Além disso, havia temor e desconfiança de sua eficácia (muitas mulheres tinham receio de engravidar apesar da pílula) bem como o medo de danos à saúde.
Outro fator residia num certo acanhamento moral de se chegar numa farmácia e pedir o remédio – uma espécie de rótulo, como se revelasse algo de comprometedor.
Por tudo isso, só na década de 70 a revolucionária pílula se livrou das amarras e efetivamente alcançou a extensão e os objetivos que inspiraram sua criação.
A anistia como pré-condição
Apesar da Ditadura Militar fortemente presente, os anos 70 foram de aguda libertação cultural, ainda que precisando driblar as botinas dos generais e fugir de seus porões.
Mais ainda, a despeito do regime, coube também à década de 70 dar os primeiros passos rumo à redemocratização que viria nos anos 80, através de sucessivos enfrentamentos e pressão que culminariam na anistia política de 1979 e no retorno ao Brasil de suas principais lideranças – primeira grande conquista que demarcou o início do fim do regime autoritário.
Antes, em 1978, o general Ernesto Geisel usaria o AI-5 – o pior dos atos institucionais da ditadura – pela última vez. Revolução cultural – Os anos 70 responderiam, ainda, por uma nova forma de fazer música, derivada da cultura pop: a “disco music”. Envolvente como ela só, nascia ali o empolgante som das discotecas que explodiu nas boates do mundo inteiro a partir do filme “Os Embalos de Sábado à Noite” (77) e da revolução nas pistas protagonizada por John Travolta no papel do irreverente Tony Manero.
No Brasil, a novela ‘Dancing Days’ (78), logo na sequência e em clara conexão com os “Embalos” (Saturday Night Fever) fez proliferar os espaços de discotecas de norte a sul do País.
Filmes – Num período de frenética criação artística – literária, em especial – que influenciou diretamente a vida das pessoas (afinal, “a vida imita a arte”) a produção cinematográfica não ficou atrás.
Para citar apenas 10 de uma lista interminável de grandes filmes, os anos 70 encantaram as plateias do mundo todo com ‘Operação França’, ‘O Poderoso Chefão’, ‘Maratona da Morte’, ‘Todos os Homens do Presidente’, ‘Inferno na Torre’, ‘Tubarão’, ‘Um Estranho no Ninho’, ‘Taxi Driver’, ‘Guerra nas Estrelas e ‘Noivo Neurótico, Noiva Nervosa’ – entre tantos outros que seja naquela época, antes ou nos dias atuais, figuram no topo do cinema mundial.
Um jornal do seu tempo
De certa forma, também a Folha da Manhã assimilou um pouco de tudo da década mais icônica do século 20 e não por acaso adotou como slogan ‘ser um jornal do seu tempo’.
Sobre as inovações que o jornalista Aluysio Barbosa trouxe para a Imprensa do interior fluminense, muitas outras matérias – melhores e mais extensas – cuidaram ao longo desses 40 anos.
Contudo, como observei no modesto depoimento que escrevi para o caderno de aniversário mas que, numa falha indesculpável, esqueci de enviar no prazo e penso não tenha dado tempo de ser inserido, a Folha separou – como até então pouco se fazia – a notícia da opinião, adotando o padrão jornalisticamente correto.
Assim, pôs em perspectivas distintas: 1) A noticia, que é a comunicação do fato; 2) A interpretação, que é a qualificação da noticia através da explicação do fato; 3) A opinião, que é a orientação tendo em vista o interesse público.
As vezes, são necessárias longas matérias. Noutras, poucas palavras contam a história toda, como fez Elio Gaspari, por coincidência na década de 70, para ‘dizer tudo’ de Carlos Lacerda por ocasião da morte daquele que foi o mais brilhante líder da direita de sua geração, mas ferrenho comunista na juventude: “Carlos, como Marx, Frederico, como Engels, Werneck de Lacerda, Lacerda como só ele sabia ser, morreu ontem”.
Há 40 anos um jornalista diferenciado fundou a Folha, que nas últimas quatro décadas representa, reivindica, cobra, informa, opina e orienta. 

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