Arthur Soffiati - Manguezais do norte fluminense: uma revisão
* Arthur Soffiati - Atualizado em 07/12/2024 09:13
A zona costeira da região norte fluminense se estende entre os rios Itabapoana e Macaé, apresentando uma singular unidade: ela não conta com nenhuma formação pedregosa natural. Apenas com pedras colocadas por ação humana. Essa unidade pode ser estendida até o rio Itapemirim, no Espírito Santo. Em frente à foz deste, existe uma ilha pedregosa. Até o rio Guaxindiba, a costa é caracterizada por barreiras. Daquelas encontradas por Pedro Álvares Cabral. Do rio Guaxindiba ao rio Macaé, a costa é nova, lisa, baixa, rasa. Trata-se de duas restingas de idades diferentes ligadas por uma faixa de areia com 28 quilômetros de extensão. Diante da foz do rio Macaé, as formações pedregosas naturais aparecem novamente na forma de ilhas. É o arquipélago do Santana.

Essa costa situa-se na região intertropical. Desembocam nela os rios Itabapoana (usado como limite entre os estados do Espírito Santo e Rio de Janeiro), Guaxindiba, Paraíba do Sul e Macaé. No passado, existia o rio Iguaçu, hoje transformado na lagoa do Açu. Também, o canal da Flecha, aberto pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento, pode hoje ser considerado um grande rio. Entre os rios Itabapoana e Guaxindiba, fluem alguns córregos com pequeno volume de água e que não conseguem manter suas barras abertas para o mar durante o ano todo. Entre o canal da Flecha e o rio Macaé, os prováveis rios que chegavam ao mar, hoje são lagoas perpendiculares à costa. Só com abertura mecânica ou com enchentes extraordinárias, elas chegam ao mar.

Em todos os rios e em quase todos os córregos com foz no mar, crescem plantas de mangue, formando ou não um bosque. O maior manguezal desse trecho costeiro é o do rio Paraíba do Sul. Ele se concentra na margem esquerda do rio. Já foi considerado o maior do estado. É o mais diversificado, contando com as quatro espécies exclusivas de manguezal da Região Sudeste do Brasil. Ele sofre dois fortes impactos: o da substituição de seu bosque por pastagens e o da expansão da vila de Gargaú. Existe ainda a sobrecoleta de caranguejos.

O segundo maior bosque encontra-se na foz do rio Itabapoana. A parte menos agredida situa-se na margem esquerda, no Estado do Espírito Santo. Do lado do Rio de Janeiro, a vila de Barra do Itabapoana já tomou mais de 80% da área de bosque e prossegue em sua marcha. Agora, uma grande ameaça para todo o manguezal é a instalação do Porto Central, um megaempreendimento, no lado do Espírito Santo.

A terceira área de manguezal está teoricamente protegida pelo Parque Estadual da Lagoa do Açu (PELAG). Contando com três espécies exclusivas de mangue, o bosque se estende por oito quilômetros. É um dos muitos manguezais enclausurados existentes no norte fluminense e no sul capixaba. As lagoas de Gruçaí e de Iquipari, no passado integrantes do grande delta do Paraíba do Sul contam também com remanescentes de manguezal, sendo o mais conservado aquele existente na lagoa de Iquipari.

Entre a lagoa do Açu e o canal da Flecha, pode-se especular que a lagoa do Lagamar conta ou contou com remanescentes de manguezal, pois ela é o alagoamento do antigo rio Bragança, um braço defluente da lagoa Feia que abria sua barra para o mar extraordinariamente. Trata-se de um campo de pesquisa aberto.

Logo abaixo, localiza-se a foz do canal da Flecha, aberta sobre a antiga barra da vala do Furado. O contato permanente com o mar permitiu a entrada de sementes de espécies de mangue (propágulos) que se fixaram no estuário. O canal serve de limite entre Campos e Quissamã. O bosque mais extenso cresceu na ilha da Carapeba, do lado de Campos. É o único manguezal a contar com uma área expressiva de apicum. Do lado de Quissamã, formou-se o pequenino manguezal da igreja São Miguel numa área de alta salinidade. Na foz do canal, também cresceu um bosque de manguezal que vem se diversificando.

Em seguida, até o rio Macaé, nenhum sinal de manguezal. Ele só volta a aparecer na foz do rio Macaé. Fica neste rio a extremidade meridional de uma espécie exclusiva desse ecossistema, cujo ponto setentrional situa-se na Flórida. Esse bosque foi praticamente detonado com as obras executadas pelo Departamento Nacional de Obras e Saneamento e com a instalação da Petrobrás. A expansão urbana e a poluição por óleo são os principais responsáveis pela supressão do bosque. As poucas plantas que vingam nos córregos entre os rios Itabapoana e Guaxindiba desparecem e voltam a se enraizar.

Há muito tempo, destruição é a regra para os manguezais do norte fluminense. Não existe qualquer programa de restauração e revitalização mesmo com a importância que eles ganharam como armazenadores de gás carbônico, ajudando a minorar as mudanças climáticas. O decreto federal 12.045, de 5/6/20024 e os programas do estado do Rio de Janeiro não saem do papel. Trata-se de um ecossistema altamente ameaçado. Pelo menos no estado do Rio de Janeiro.

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