Guilherme Belido Escreve - Muita confusão na marca dos 100 dias de Bolsonaro
06/04/2019 15:00 - Atualizado em 10/04/2019 15:34
Parece que foi ontem, mas na próxima quarta-feira (10) o governo do presidente Bolsonaro completa a emblemática marca dos 100 dias, período que se mostrou marcado por improvisação e desacerto, ou, melhor dizendo, por uma série de trapalhadas que nem com toda boa vontade do mundo pode ser atribuída à fase de ajustes.
Ajustar, é uma coisa! Bastando a carroça andar e logo alguns metros à frente as melancias vão se ajeitando. Contudo, na ‘carroça de Bolsonaro’, as melancias não se acomodam e seguem batendo umas nas outras; rolam pra lá e pra cá e muitas acabam no chão.
Com efeito, o tempo próprio para ajustes não ajustou nada e o desajuste emerge como marco na marca dos 100 dias de governo, acompanhado de toneladas de amadorismo e da visível falta de traquejo do que seja exercer a Presidência da República. Em outra palavras, pouco trato para com a liturgia do cargo.
Ressalve-se, as observações não miram apenas a figura do presidente... a pessoa de Jair Bolsonaro, mas todo o entorno. Há um ambiente desordenado, confuso, no qual, para surpresa geral, os ministros militares é que respondem pelo ponto de equilíbrio do governo.
Exemplo ainda latente dessa imaturidade político-administrativa do Planalto foi a desastrosa ida de Paulo Guedes à Câmara dos Deputados para explicar a proposta de reforma da Previdência.
“Tchutchuca é a mãe, é a avó”
A audiência na Comissão de Constituição e Justiça da Câmara, ocorrida na quarta-feira passada (03), em que o ministro Paulo Guedes ‘pretendia’ falar sobre a PEC da Previdência, teve desfecho que mostra com clareza a ausência de estratégia e de um mínimo de faro político por parte do Planalto.
Dentro do que é possível deduzir, o titular da pasta da Economia foi para lá desavisado e sem os devidos alarmes do ambiente que possivelmente iria encontrar na CCJ. Resta claro, não foi apropriadamente instruído para lidar com os deputados e com os percalços mais que previsíveis.
Não que estivesse despreparado quanto às questões técnicas que envolvem a Previdência e os desdobramentos da reforma pretendida. O despreparo aqui aventado remete ao trato, à forma de lidar com os parlamentares e do providencial tangenciamento ante o confronto. Guedes fez o contrário.
Além do mais, foi infeliz ao definir os aposentados como o “passado”. Ora, o passado é algo morto. Os aposentados não fazem parte do passado, mas sim do presente do Brasil. Trabalharam os anos previstos em lei para que tivessem direito à aposentadoria. A defesa do ministro de que é preciso investir na Educação – o “futuro”, em sua visão – é pertinente. Mas a abordagem com viés de exclusão foi desastrosa.
Gesticulando e exagerando nas ênfases, descortinou temas sensíveis aos deputados e acabou abrindo amplo espaço para provocações e embates. Até as verdades que disse, as disse na hora e no lugar errados.
Resumindo, Paulo Guedes foi o antipolítico em pessoa. Acendeu o próprio pavio sabidamente curto e deu um presente à oposição. Favoreceu o ambiente hostil, ouviu desaforos, disse desaforos, bateu boca e acabou sendo chamado de “Tchutchuca”. Um episódio cujo resultado bem expressa o momento do governo.
Governo segue em queda
De acordo com pesquisa XP/Ipespe, realizada entre os dias 1 e 3 de abril, a aprovação do governo manteve a curva descendente, ainda que o recuo de mais 2 pontos esteja dentro da margem de erro. Alarmante, contudo, foi a queda no percentual de otimismo com o mandato, que em janeiro era de 63% e agora, segundo a XP, caiu para 50%.
Não é difícil imaginar que os números refletem as falas desnecessárias e as iniciativas muitas vezes infelizes de Bolsonaro: 1) A intromissão dos filhos nos assuntos do governo, espécie de ‘filhos presidenciais’; 2) Episódios como um ministro de Estado ser desmentido pelo filho do presidente, o que caberia aos canais competentes da Presidência; 3) O vídeo obsceno mostrado no carnaval, que acabou dando divulgação ao que desejou combater; 4) A troca de farpas com Rodrigo Maia; 5) A história de rememorar (antes comemorar) o Golpe de 64; 6) A insistência em citar “política velha” quando se discute a reforma da Previdência, – citação que irrita os políticos. E segue...
Sem política, não dá
Bolsonaro foi eleito pelas propostas que apresentou e perderia a identidade se fizesse diferente do que disse ao povo. Contudo, é preciso levar em conta que o sistema presidencialista no Brasil é de coalizão, o que significa reconhecer forte viés de parlamentarismo.
O toma lá, dá cá deve, de fato, ser abolido. Mas fazer política faz parte do jogo democrático. O desemprego subiu, a produção industrial recuou e há dúvidas se a crise econômica, de fato, está no passado. O presidente precisa ampliar sua base e transformar lideranças partidárias em aliados. Não se governa com um Congresso hostil.
Ninguém esperava que os problemas do Brasil fossem resolvidos em 30 ou 60 dias. Mas, já caminhando para o primeiro quadrimestre, as realizações estão bem abaixo das expectativas.
De toda forma, é relevante notar que o presidente não crava para fazer prevalecer sua vontade e está longe da figura inflexível que muitos temiam. Ao contrário, sabe recuar quando a coisa aperta e na adversidade busca a conciliação – o que é muito bom.
Só precisa corrigir a mira para acertar nos alvos. Afinal, é capitão.

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