Quatro meses após operação, sensação ainda é de insegurança
Victor Azevedo 08/12/2018 15:25 - Atualizado em 10/12/2018 14:10
Isaías Fernandes
Há exatos quatro meses, Campos recebia a única operação da intervenção federal da segurança pública no município. A área escolhida foi o subdistrito de Guarus, local onde os números da criminalidade impressionam, principalmente na área denominada “Faixa de Gaza”. De agosto - mês em que ocorreu a intervenção - aos dias atuais, a média de homicídio em relação aos meses anteriores até sofreu uma pequena redução, mas o medo ainda é presente nos bairros que seguem sob o fogo cruzado das facções criminosas do tráfico de drogas. A violência durante o ano chegou até a fechar escolas do subsdistrito.
A megaoperação “Cruzada”, realizada no dia 9 de agosto, foi a única do interior do estado realizada pela intervenção federal, que está em atuação desde fevereiro deste ano. A ação contou com 800 agentes do Exército Brasileiro, Corpo de Bombeiros e polícias Militar, Civil, Rodoviária Federal, além do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco). Trinta pessoas foram presas, entre flagrantes e cumprimento de mandados, e 100 casas de moradores que haviam sido expulsos por traficantes, retomadas. Dois veículos blindados do Exército e um do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope), modelo Urutu, também atuaram nas ruas de Guarus.
Nos dois meses anteriores, a criminalidade chegou a números alarmantes, principalmente na “Faixa de Gaza”, área que engloba os parques Eldorado, Santa Rosa, Santa Clara, Silvestre, Nova Campos, Novo Eldorado, Prazeres e Bandeirantes, além da Codin, Terra Prometida e Custodópolis. Segundo dados da Folha da Manhã, em junho, dos 15 homicídios registrados, nove aconteceram na “Faixa de Gaza”. Já em julho, dos 18 assassinatos praticados, nove foram na área de conflito.
Em agosto, foram 13 homicídios, cinco deles na área de conflito. Dos 20 homicídios de setembro, sete ocorreram na “Faixa de Gaza”. Em outubro, dos quinze assassinatos, oito foram na área da violência, onde, no mês seguinte, em novembro, praticaram nove dos 20 homicídios de Campos.
Um morador do Parque Santa Clara, que preferiu não se identificar temendo retaliações, afirmou que a situação pouco mudou depois da operação da intervenção federal.
— O medo segue instalado por aqui. Sempre tem polícia andando por aqui e, mesmo assim, o clima é pesado. Parece que estamos em um barril de pólvora prestes a explodir. A situação ainda é muito tensa — ressaltou.
Outra moradora, esta do Eldorado, afirmou que até 18h ela anda na rua: “Depois nem pensar. Ultimamente não tem tido toque de recolher; mas, mesmo assim, fico com medo e só saio de casa à noite com muita necessidade”, disse.
Segundo o comandante do 8º Batalhão da Polícia Militar, tenente-coronel Fabiano de Souza, a intervenção federal contribuiu para uma sensível redução nos índices de criminalidade em Guarus.
— Algumas ações da intervenção federal funcionaram, como a prisão de várias pessoas envolvidas com a criminalidade, principalmente na operação “Cruzada”. Também tivemos as ações noturnas com os blindados nas áreas de conflito, por alguns dias. Tudo isso contribuiu para que houvesse uma sensível melhora na questão da criminalidade em Guarus - disse ele.
Mudança reduz morte - Ainda segundo o tenente-coronel, nos últimos dias, uma mudança estratégica de policiamento reduziu ainda mais a criminalidade no subdistrito.
— Mudamos de forma estratégica o policiamento feito pelo 8º BPM, principalmente na última semana de novembro e início de dezembro e a gente acredita que, através dessa mudança, estamos conseguindo reduzir ainda mais a criminalidade. Desde que houve essa alteração, não tivemos registros de homicídios em Guarus. E o policiamento é dinâmico. A gente começa com um modus operandi e segue até o ponto que dá certo. Mas chega em um momento que temos que mudar, por que o crime também estuda a nossa estratégia e cria a dele - concluiu o comandante.
Socióloga critica modelo adotado
Megaoperação em Guarus
Megaoperação em Guarus / Antônio Leudo
Recentemente, o presidente eleito, Jairo Bolsonaro (PSL) afirmou que não prorrogará a intervenção federal na segurança pública do Rio. No entanto, sugeriu que poderá manter a Garantia da Lei e da Ordem (GLO), o que garantiria a presença das Forças de Segurança no estado. Para a socióloga Luciane Dias, a intervenção contribuiu muito pouco para o combate a criminalidade no Rio de Janeiro.
- A forma como a intervenção foi anunciada logo após o Carnaval, gerou uma série de dúvidas. Ela se concentrou, como sempre, com os blindados de guerra no Rio de Janeiro e avançou na questão de roubo de cargas, que teve um efeito positivo com a redução dos casos; mas, no resto, é fato que faltou um repasse de investimento no processo da intervenção. Ela não é o melhor caminho para resolver a situação de desigualdade, principalmente para as regiões de favela. Para mim, a intervenção acabou reforçando esse apartheid que está posto no Rio, com a morte de civis inocentes e, não raras vezes, crianças, ao longo do ano.
Para Luciane, em Campos a intervenção federal da segurança pública não teve, efetivamente, nenhuma utilidade.
- Eu não sei, de fato, o que ela chegou a fazer no território. Acho que o blindado se concentrou em Guarus, onde mais uma vez ficou evidente a escolha por territórios considerados criminógenos. Mas, na verdade, esses atos espetaculares sempre acabam por esconder o que de fato é necessário. O que é preciso para controle da violência numa cidade como Campos é investimento em viaturas. Nós não precisamos de um espetáculo; nós precisamos de real policiamento, bem treinado, bem formado, que compreenda o lugar do cidadão, e, definitivamente, a intervenção não é uma opção inteligente do ponto de vista da segurança pública”. finalizou a socióloga.
Ausência políticas públicas citada
Até o fechamento da edição, Campos havia registrado 213 homicídios em 2018. O número é bem superior ao do ano passado, quando foram registrados 185 assassinatos. O principal foco da violência no município foi em Guarus, onde a violência desenfreada causou reflexos também nas escolas do subdistrito, trazendo prejuízo a milhares de alunos. Por várias vezes, as unidades de ensino foram fechadas por determinação do tráfico.
Os primeiros casos ocorreram em marco, quando três mil alunos de oito escolas dos bairros Parque Eldorado e Codin ficaram sem aulas. Na ocasião, vários cartazes foram espalhados em postes próximos, ameaçando quem insistisse em assaltar os comércios locais, usar drogas ou traficar perto das unidades de ensino, além de desrespeitar crianças, meninas e funcionários. A determinação teria partido da facção Amigos dos Amigos (ADA).
O fechamento das escolas em março foi uma determinação da Secretaria Municipal de Educação, Cultura e Esporte (Smece). A medida tinha como objetivo proteger a integridade física de funcionários e alunos.
Em junho, escolas do Parque Santa Rosa também tiveram aulas suspensas devido à troca de tiros na comunidade. A janela da Escola Municipal Eunícia Ferreira da Silva foi atingida por estilhaços de bala, mas ninguém ficou ferido. Mais de 2.600 da unidade e das escolas Lions I, Ciep 270 Ataíde Dias e a Creche Escola Zumbi dos Palmeiras ficaram sem aulas diante do quadro de violência.
Autoridades de segurança pública de Campos sempre questionaram a falta de políticas públicas em Guarus. Em uma audiência pública da Câmara Municipal, o delegado da 146º Delegacia de Polícia (Guarus), Luís Maurício Armond, criticou a falta ações no subdistrito. Para ele, a polícia não é remédio e sem apoio do poder público a Guarus, será difícil combater a violência. O discurso de Armond corrobora com o comandante do 8º BPM, tenente-coronel Fabiano de Souza, que ressaltou a importância de uma melhor infraestrutura.
 
 

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