Qual o futuro do Morar Feliz?
Marcus Pinheiro 22/04/2017 16:48 - Atualizado em 24/04/2017 13:02
Antônio Leudo
Morar Feliz / Antônio Leudo
“Era uma casa muito engraçada; Não tinha teto; Não tinha nada”, a poesia de Vinícius de Moraes, em 1970, parece ter sido escrita para ilustrar, 47 anos após a sua criação, o cenário de sobrevivência dos moradores do Morar Feliz Ururaí III, em Campos. O Programa orçado com aditivos na casa dos R$ 1,05 bilhão, aliado a outros 16 condomínios pertencentes ao maior e mais caro programa de habitacional, criado pela Prefeitura e executado pela Odebrecht – investigada em esquemas de corrupção e lavagem de dinheiro envolvendo obras públicas na Operação Lava Jato –, talvez não tenha sido “feito com muito esmero”.
Das 10 mil casas prometidas à população carente pela então prefeita Rosinha Garotinho (PR), durante os dois mandatos (2009-2016) apenas 5.954 foram entregues. Outras 32 foram invadidas ao fim das obras, mesmo após atos de vandalismo, motivados pela demora na conclusão do projeto, destruírem os imóveis. Sem telhas, portas e janelas, outros 682 imóveis inacabados e em estado de abandono, que deveriam ter sido entregues até dezembro de 2016, estão servindo de abrigo para diversas de famílias.
Este é o caso da desempregada Ângela Maria Diamantina, de 49 anos, que há seis meses mora em uma das casas inacabadas: “Estamos aqui desde o mês de outubro. E continuamos na expectativa por respostas. Estamos investindo em melhorias necessárias, como pintura, reparos na laje, por conta da ausência de telhado. Enquanto isso, improvisamos uma varanda e tampões para as portas e janelas. Gastamos aproximadamente R$ 1,5 mil. Mas, não temos garantia se poderemos permanecer no imóvel”.
  • Obra do Morar Feliz de Ururaí não foi concluída

    Obra do Morar Feliz de Ururaí não foi concluída

  • Obra do Morar Feliz de Ururaí não foi concluída

    Obra do Morar Feliz de Ururaí não foi concluída

  • Obra do Morar Feliz de Ururaí não foi concluída

    Obra do Morar Feliz de Ururaí não foi concluída

A construção de casas do Morar Feliz foram citadas, em delações premiadas da operação Lava Jato. Segundo o ex-superintendente da Odebrecht – empreiteira responsável pela execução das obras – Leandro Azevedo, os dois editais vencidos pela companhia, foram montados para favorecer a empresa. Somados, os contratos chegaram, segundo Leandro, a ordem dos R$ 833 milhões. “Um dos primeiros editais que ela homologou logo depois da eleição foi um edital para a construção de 5.100 casas populares. No valor mais ou menos de R$ 357 milhões. Isso chamou minha atenção porque casas populares, geralmente, você vê no mercado sendo construídas em vários lotes e aqui foi feito em lote único e a esse valor. Isso fazia com que as empresas pequenas não tivessem condições de participar. E as empresas grandes não tinham interesse. E de fato aconteceu isso. Para não participarmos sozinhos da licitação, nós pedimos para que a Queiroz Galvão e a Carioca Engenharia dessem um preço acima do nosso. Essas duas empresas aceitaram fazer isso. Em 2012, a prefeita Rosinha foi reeleita e ela lançou um segundo programa chamado ‘Morar feliz 2’. Foi uma nova licitação. Nessa licitação nós participamos sozinhos, sem ninguém. Se a Odebrecht não tivesse participado, ia dar vazio. Eu fiz o ‘Morar feliz 1’. A gente tinha uma equipe mobilizada, tinha uma expertise em construir casas. Então, ela lançando um projeto desses, é óbvio que eu ia participar do ‘Morar feliz 2’. O valor foi um pouco maior, foi R$ 476 milhões”.
Após tomar posse neste ano, o atual prefeito Rafael Diniz (PPS), informou que auditaria as obras do Morar Feliz. Em nota, a secretaria de Transparência e Controle afirmou que finalizou a auditoria dos contratos firmados entre o município e a Odebrecht e o resultado está sendo encaminhado à Câmara Municipal, ao Tribunal de Contas do Estado (TCE) e também ao Ministério Público.
Sobre a retomada das obras, o secretário de Infraestrutura e Mobilidade Urbana, Clédson Bitencourt, informou que será necessário licitar novamente as obras, porém, depende de disponibilidade financeira.
Moradores ainda aguardam uma solução
Sem informações sobre possíveis transferências para as casas do Morar Feliz ou sobre a conclusão do procedimento de desapropriação iniciado durante a gestão anterior, moradores que permaneceram na comunidade Margem da Linha, na Tapera, após a demolição de dezenas de imóveis, questionam o silêncio da atual gestão e apontam dificuldades de sobrevivência na localidade.
— Minha casa está rachando, Quando chove mola tudo. Tenho muito medo de morar aqui, mas, infelizmente, não tenho outro lugar para ir. Como disseram que a minha casa também seria demolida, fico com receio de ajeitar ela e depois a Prefeitura derrubar. Além de perder a casa, eu perderia o dinheiro que investi, que já é tão sofrido. Preciso de uma confirmação. A minha esperança era poder ficar aqui, onde sempre vivi. E aos poucos, com muito trabalho ir ajeitando a minha casa”, contou a cozinheira, Sílvia Nascimento Nunes, de 47 anos, que mora em uma casa de três cômodos às margens da linha, com o filho ajudante de pedreiro, de 25 anos.
Antônio Leudo
Moradora Sílvia Nascimento Nunes / Antônio Leudo
A secretária de Desenvolvimento Humano e Social, Sana Gimenes, informou que aguarda parecer dos órgãos competentes, que estão recebendo o resultado da auditoria, para dar prosseguimento ao diálogo com as famílias cadastradas, dentro do perfil. Apesar de depender de dotação orçamentária para dar continuidade às ações relativas ao programa, a secretaria está aberta ao diálogo.
Em Santo Eduardo, obra parou em 2014
No ano de 2012, a então prefeita Rosinha Garotinho anunciou que os moradores do distrito de Santo Eduardo seriam beneficiados com o programa Morar Feliz, mas as 150 casas nunca saíram do papel. Em 2015, reportagem da Folha da Manhã mostrou que apenas a terraplanagem foi feita no local e o canteiro de obras estava parado desde dezembro de 2014.
No site oficial, o governo municipal chegou a informar que a previsão era que a construção iniciaria em dezembro de 2013, o que não ocorreu. A estrutura do canteiro foi montada e, de acordo com moradores, no segundo semestre de 2015 foi totalmente esquecida. Nem mesmo um vigia, que antes tinha no local era mais visto na época e a depredação do canteiro acabou acontecendo.
No projeto, que nunca saiu do papel, a intenção seria construir 150 casas no terreno. A construção em Santo Eduardo, paralisada em 2014, faria parte da segunda fase do Morar Feliz e seria para atender famílias mais distantes do perímetro urbano.
Hoje no local, nem o serviço feito com a terraplanagem existe mais e o dinheiro foi desperdiçado.

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