Primeira-dama ganha o cinturão no Vale Tudo do Maracanãzinho
Edmundo Siqueira 24/07/2022 22:12 - Atualizado em 24/07/2022 22:13
REUTERS/Ricardo Moraes

O público presente no Maracanãzinho daquele 28 de agosto de 1995 estava confiante. Todos torciam pelo bicampeão Amaury Bitetti, que disputava mais uma vez o Desafio Internacional de Vale Tudo, e novamente estava na final. A vitória era certa, mas o que os apreciadores dos combates sangrentos viram foi um guarda municipal de 33 anos e lutador de capoeira, chamado Mestre Hulk, finalizar o favorito em 23 segundos.
Mestre Hulk depois de nocaute sobre Amaury Bitetti.
Mestre Hulk depois de nocaute sobre Amaury Bitetti. / Reprodução.
O público presente no Maracanãzinho desse 24 de julho de 2022 (veja matéria da Folha1, aqui) também estava confiante. E saiu de lá ainda mais, depois do discurso (veja íntegra em matéria do Poder360, aqui) da primeira-dama, Michelle Bolsonaro. Numa espécie de vale-tudo para a reeleição do marido Jair, ela afirmou: “ele é o escolhido de Deus!”.
Possivelmente, os bolsonaristas que idolatram o atual presidente foram ao estádio para ver um show do “mito”. Alguma ameaça golpista, algum palavrão ou ameaça a outro poder. Esperavam ver alguma reafirmação — contumaz e necessária para ele — de sua masculinidade. E viram. Mas, quem roubou a cena foi a “dona de casa que cuidava dos filhos para ele ter paz”.
Talvez pela certeza de que o Brasil sofre uma ameaça comunista ou talvez pelo fanatismo religioso,  o fato é que Michelle demonstra realmente crer que é casada com um messias. Um escolhido. Alguém com “um propósito de cura para nosso Brasil”.
— Deus tem promessas para o Brasil. E todas as promessas irão se cumprir. — Disse Michelle Bolsonaro, de vestido verde, enquanto colocava a bandeira do Brasil nos ombros, dada por um torcedor da plateia. “Eu oro na cadeira dele. Quando o Planalto se fecha, eu entro com os meus intercessores e eu oro na cadeira ele e declaro todos os dias: Jair Messias Bolsonaro, sê forte e corajoso. Não temas, não temas. Ele é um escolhido de Deus”, continuava a primeira-dama.
No seu vale-tudo eleitoral, ainda na arena do Maracanãzinho, Michelle continua o round: “A reeleição é por um propósito de libertação, para um propósito de cura para nosso Brasil”. E para criar empatia com o público presente, golpeia: "foi a preço de sangue”.
Para ganhar o cinturão da noite, e para suavizar a imagem de misógino do marido, recorre mais uma vez a Bíblia: “Essa luta não é contra homens e mulheres, é contra potestades e principados. A palavra do Senhor não vai voltar vazia”, finaliza.
Principados e potestades são referências a seres espirituais que podem ser bons ou maus, ou seja, podem se referir tanto a anjos de Deus como a demônios. A eterna luta do bem contra o mal. 
A Bolsonaro, o telecatch 
A um emocionado Bolsonaro coube o telecatch — um espetáculo pueril de luta circense, com bizarros movimentos acrobáticos e combates armados —, afinal, seria a modalidade que fica mais confortável:
“Nós somos a maioria, nós somos do bem, nós temos disposição para lutar pela nossa liberdade, pela nossa pátria. Convoco todos vocês agora para que todo mundo, no 7 de setembro, vá às ruas pela última. Estes poucos surdos de capa preta têm que entender o que é a voz do povo. Têm que entender que quem faz as leis é o poder Executivo e o poder Legislativo. Todos têm que jogar dentro das quatro linhas da Constituição”, disse o presidente performático, convocando para mais uma aventura golpista em setembro.
Em 1995, Royce Gracie já havia conquistado três das primeiras quatro edições do UFC (maior torneio de MMA do mundo, até hoje). Para derrubá-lo era preciso procurar um lutador à altura. Hulk, campeão no Maracanãzinho, sequer chegou a enfrenta-lo.
Em 2022, Bolsonaro conta com forte rejeição e o segundo lugar de todas as pesquisas eleitorais (veja no Blog Opiniões de Aluysio Abreu Barbosa, aqui). Para vencer em outubro, terá que lutar capoeira, jiu-jitsu e telecatch ao mesmo tempo. Ou terá que aceitar que, até no Vale Tudo, existem regras.

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