Cidade da Criança e da propina
Aldir Sales 25/11/2017 19:29 - Atualizado em 28/11/2017 15:42
Cidade da Criança
Cidade da Criança / Paulo Pinheiro
A semana da política campista e nacional foi marcada pela deflagração da operação Caixa d’Água, que levou para a cadeia os ex-governadores Anthony e Rosinha Garotinho, além de empresários locais, e revelou um esquema de propinas dentro da Prefeitura de Campos que seria comandado por Garotinho e possuía até um braço armado, que seria o empresário e policial civil aposentado Antônio Carlos Ribeiro da Silva, conhecido como Toninho, e que usava arma de fogo para extorquir empresários, segundo as investigações. Toninho também foi preso e, segundo a denúncia do Ministério Público, ele seria sócio da empreiteira Ribeiro e Azevedo Construções Ltda, que ganhou várias licitações durante a gestão Rosinha, uma delas foi para construir a Cidade da Criança junto com outras duas construtoras. De acordo com as delações, 10% do valor de todos os contratos de obras no município voltavam em propina para Garotinho, que teria arrecadado R$ 1,7 milhão só na polêmica obra feita também por Toninho.
Inicialmente orçada em R$ 10,5 milhões, a obra demorou três anos para ser concluída e foi inaugurada no dia 22 de dezembro de 2015. Depois de diversos termos aditivos, terminou custando R$ 17 milhões aos cofres públicos e ainda ganhou o apelido de “Disney campista” pela então vereadora rosácea Auxiliadora Freitas (PHS), enquanto obras importantes como o Hospital São José, nunca foram finalizadas.
Além da Cidade da Criança, a Ribeiro e Azevedo ganhou diversas concorrências para obras menores, como a recuperação de ruas e estradas em Travessão e na região do Imbé, abertura do canal Boa Vista, reforma do campo de futebol de Lagamar e manutenção das estruturas dos Centro de Referência da Assistência Social (Cras) e abrigos como o CentroPop e a Casa de Passagem.
Garotinho e Rosinha presos
Garotinho e Rosinha presos / Agência O Dia e Paulo Pinheiro
Na denúncia, a promotoria eleitoral afirma que Anthony Garotinho exercia o cargo de comando da organização. Seria de sua responsabilidade determinar as funções de cada integrante do grupo, desde quem faria a abordagem dos empresários-colaboradores, passando por quem recolheria os valores e qual destino deveria ser dado aos recursos arrecadados. Segundo o documento, Garotinho tinha o poder de subjugar as empresas abordadas e seus sócios, de modo que a não contribuição para campanhas eleitorais poderia acarretar na retenção de pagamentos às empresas devidos pela Prefeitura.
Além de Garotinho e Rosinha, também foram presos o ex-secretário de Governo, Suledil Bernardino, o advogado e ex-subsecretário da mesma pasta, Thiago Godoy e do empresário Ney Flores, sócio da Macro Engenharia, outra empreiteira que seria uma das maiores arrecadadoras do esquema.
A Justiça Eleitoral também determinou o sequestro dos bens móveis e imóveis, bem como o bloqueio de dinheiro existente em nome de Ney Flores e de Toninho, além da busca e apreensão de telefones celulares, computadores, mídias, pen drives ou documentos de todos os presos.
“Garotinho cobrava 10% de propina”
Em depoimento à Polícia Federal, o empresário José Gomes Ribeiro de Castro, sócio da Conan Construções, afirmou que era obrigado a devolver 10% de todos os pagamentos que recebia da Prefeitura para o grupo de Garotinho. O dinheiro, segundo ele, era entregue em espécie Toninho.
Segundo o empresário, havia também um esquema de direcionamento de licitações. Ele afirma que, após a publicação dos editais, Garotinho determinava qual empresa deveria executar a obra, por ser o “prefeito de fato da cidade”. As construtoras, então, se reuniam na sede do sindicato para definir quem iria “dar cobertura” à proposta vencedora.
  • Obra na avenida Nazário Pereira Gomes

    Obra na avenida Nazário Pereira Gomes

  • Obra na avenida Nazário Pereira Gomes

    Obra na avenida Nazário Pereira Gomes

Caso o relato de José Gomes seja verídico, Anthony Garotinho teria arrecadado em propina pelo menos R$ 1,7 milhão com a Cidade da Criança, R$ 2 milhões nas obras na região do Imbé, R$ 1,8 milhão no Parque Guarus, além de R$ 10 milhões no Cepop, que custou cerca de R$ 100 milhões, e R$ 1,8 milhão nos arcos da Beira Valão, orçada em R$ 18 milhões.
A defesa do Casal Garotinho nega todas as acusações e diz que são perseguidos pelo grupo político liderado pelo ex-governador Sérgio Cabral (PMDB).
Outras empreiteiras são citadas por delator
Na decisão que sustentou a prisão de todos os réus, o juiz Glaucenir Oliveira, então responsável pela 98ª Zona Eleitoral, transcreveu o trecho da delação premiada do empresário André Luiz da Silva Rodrigues, proprietário da Ocean Link, empresa utilizada, segundo ele, para repasse de caixa 2 da JBS para Garotinho.
Nesta parte, o delator relata que em setembro de 2014 foi convocado pelo ex-governador para uma reunião no escritório de campanha. E “que quando entrou na sala estavam presentes Thiago Castro, Zezé, seu pai, ambos da empresa Construsan; Paulo César, da empresa Imbeg e ainda Mazinho, da Cofranza, além do Sr. Ney Flores, da empresa Macro e Maurição, da empresa Hidrolumen, todas elas com contrato com o município de Campos”.
André fala ainda que “Garotinho entrou na sala muito irritado, ficou em pé na cabeceira da mesa e disse que seria breve e que precisava de 5 milhões de reais para a campanha e que era para cada um dos presentes dar 1 milhão de reais”. E ainda: “que Zezé da Construsan falou que Ari Pessanha, grande empresário de Campos e envolvido com a política e dono da construtora Avenida não se fazia presente, mas mandou oferecer 500 mil reais para ajudar”. Porém, “Garotinho disse ‘que era para mandar Ari enfiar os 500 mil no c..., que eu não quero essa p... desse dinheiro dele, porque ele está lá fazendo campanha para Pezão’”.
A Macro, do empresário Ney Flores, preso na Caixa d’Água, foi responsável por obras como o reparo da pavimentação em estradas nas localidades de Rio Preto, Itereré e Morangaba, orçado em mais de R$ 20 milhões, e a reforma da Unidade Básica de Saúde Jamil Abdu, na Pecuária, e as recuperações da avenida Nazário Pereira Gomes e ruas Santa Maria e Presidente João Goulart, no Parque Guarus, que custaram R$ 18 milhões.
A equipe de reportagem tentou contato com todos os empresários e construtoras citadas, mas não obteve resposta ou não foram localizados até o fechamento desta matéria.

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