Há mais de 30 anos e 10 governos
Aluysio Abreu Barbosa 25/02/2017 15:11 - Atualizado em 02/03/2017 09:17
Nos últimos 30 anos, 10 foram os prefeitos que serviram a Campos. Ou foram eleitos para fazê-lo. Zezé Barbosa (1982/88), Anthony Garotinho (1988/92 e 1996/98), Sérgio Mendes (1992/96), Arnaldo Vianna (1998/2000 e 2000/04), Carlos Alberto Campista (quatro primeiros meses de 2005), Alexandre Mocaiber (2005/08), Roberto Henriques (março a abril de 2008), Rosinha Garotinho (2008/16), Nelson Nahim (julho a dezembro de 2010) e Rafael Diniz (2017). E uma mesma pessoa serviu a todos: José da Conceição Pereira Viana, o Seu Zé, hoje com 75 anos e ainda em plena atividade, famoso pelo café cremoso que prepara e serve sempre quente, com açúcar, adoçante ou amargo, à escolha dos ocupantes e visitantes da Prefeitura de Campos, ao longo de mais de três décadas.
Seu Zé entrou na Prefeitura em 1986. Na época, era garçom do hoje extinto Café Ouvidor, na rua Marechal Floriano. O então prefeito Zezé Barbosa entrou no estabelecimento, acompanhado do deputado federal Alair Ferreira e o fiscal de renda J. Costa:
— Quando fui anotar o pedido, Zezé falou que precisava almoçar em 10 minutos. E perguntou se eu conseguia providenciar. Fui à cozinha e trouxe voando um frango desossado grelhado com creme de espinafre. Foi tão rápido que o próprio Zezé se espantou: “Já está pronto?”. Na saída, fiquei com vergonha de fazer o pedido. Mas ele voltou, eu tomei coragem e perguntei: “O senhor não arruma um emprego pra mim na Prefeitura?”. Ele me disse: “O que o senhor quer?”. Eu respondi: “O que o senhor estiver para mim, está bom”.
No dia seguinte, uma quarta-feira, Seu Zé foi ao antigo Matadouro, onde Zezé costumava despachar. Mas lá foi informado que o chefe do Executivo não estava atendendo. Ao voltar na quinta, conseguiu falar com o prefeito, que o mandou procurar José Almeida, chefe de gabinete, na sexta na Villa Maria. Feito isso, já na segunda começou a trabalhar na Prefeitura como garçom, função na qual impressionara Zezé pela presteza e agilidade.
Do que lhe abriu as portas ao serviço público, Seu Zé revela o segredo pelo qual se manteve tanto tempo, numa função tão íntima dos bastidores do poder goitacá, passando por 10 prefeitos — 11, se contado Geraldo Pudim, que chegou a ser prefeito por apenas um dia, em 2004: “A gente tem que pegar o jeito do prefeito. Isso costuma levar uma semana”.
Mas o tempo pode ser menor. Neto de Zezé, a quem Seu Zé já impressionara pela rapidez com que tirou um almoço, Rafael foi surpreendido já em seu segundo dia de mandato, quando além do café e água habituais, o veterano garçom lhe trouxe cajá cortado em fatias, fruta da predileção do novo prefeito:
— Logo no primeiro dia eu conversei com assessores mais próximos de Rafael, que me disseram que ele era louco por cajá. Aí arrumei as frutas, descasquei, cortei e temperei com um pouco de sal. Tira a acidez e o cajá fica docinho. Ele tomou um susto, mas adorou.
Nestas mais de três décadas servindo diariamente os líderes políticos mais importantes da cidade, além de se adaptar aos seus gostos, Seu Zé também registrou diferenças de estilo:
— Zezé tinha muita personalidade. O que ele falava com os secretários tinha que ser ali, na hora. Não tinha essa história de deixar para depois, não. Os secretários tinham muito respeito por ele. Nas audiências com gente de fora, sempre mandava servir caldo de cana com biscoitos de champanhe. Foi um ótimo prefeito!
Se Zezé costumava dizer que prefeito em fim de mandato, quando pede um café, só vem meia hora depois e frio, Seu Zé garante que é só parte do folclore do líder político que, em seu auge, chegou a ser chamado pela imprensa carioca de “Rei no Norte”. De quem o substituiu, o garçom também revela os gostos e estilo:
— Garotinho tinha pressão alta. Então eu sempre fazia para ele suco de carambola. Gostava do café bem quente e forte. E adorava comer quibe cru. Quando ele almoçava e jantava na Prefeitura, eu ia de carro até o Kantão, trazia e servia comida libanesa. Também era firme com os secretários. Dizia: “Eu mandei você fazer isso. Por que você não fez?”
A mesma personalidade, segundo Seu Zé, não se repetiria no prefeito seguinte:
— Com Sérgio Mendes o governo saiu da Villa Maria e foi para a antiga Casa Rosada (na av. Alberto Torres, diante ao Cartório do 1º Ofício). Só tomava água e café. Não queria comer nada, não ligava pra nada. Pouco conversava com ele. Como prefeito, não tinha a mesma força dos outros.
Embora considere entre os melhores prefeitos que Campos teve, era pelo jeito brincalhão, e o apetite, que Arnaldo Vianna se destacava dos demais:
— Era o mais guloso. O que levasse, ele comia. Quibe, pão, salgadinho, tudo. Também era firme com os secretários. Aí, não brincava. Mas teve uma vez que ele estava reunido com os vereadores. Eu cheguei com a bandeja e ele disse: “Bota essa bandeja aí na mesa e fale aqui no celular, que tem alguém procurando você”. Eu não entendi nada, mas atendi. Do outro lado da linha, um homem começou a me xingar, perguntando o que eu estava querendo com a mulher dele. Fiquei todo sem jeito, enquanto Arnaldo e os vereadores morriam de rir.
Apesar dos pouco mais de quatro meses no poder, Seu Zé é de opinião que, se conseguisse completar o mandato, Carlos Alberto Campista iria acertar:
— Era firme também, sério, não brincava. Chegava cedinho. Eu levava água e café. E às vezes ele dizia: “Senta aqui, Seu Zé, vamos conversar”. E falava sobre a Prefeitura, como estava botando as coisas no lugar. Dizia: “Estou começando agora, mas depois de alguns meses, vai tudo estar como a gente quer”. Acho que ele iria fazer um bom governo. Tinha atitude.
Segundo Seu Zé, atitude foi justamente o que faltou ao prefeito seguinte:
— Mocaiber só bebia café e água. Não queria comer nada. Era educado, mas de pouco conversar. Não era tão firme como os outros no trato com os secretários. Ele era mais devagar. Acho que isso atrapalhou muito o governo dele. A gente achava que os secretários tinham mais força que ele.
Prefeito por pouco mais de um mês entre março e abril de 2008, Roberto Henriques se marcou por uma personalidade oposta:
— Tomava muito café. Chegava e logo pedia: “Seu Zé, meu cafezinho e minha água”. Não ligava para comer. Foi o mais rigoroso de todos com os secretários, os vereadores, com todo mundo. Decidia fazer uma coisa e fazia mesmo. Com ele não tinha tempo ruim. Todo mundo respeitava ele.
Sobre a sucessora de Mocaiber, o veterano garçom desmente as versões de que Rosinha fosse uma prefeita ausente:
— Todo dia ela estava lá. Tinha dia que ela chegava mais alegre. Em outros, chegava aborrecida, triste. Mas assim mesmo tratava a todos bem. Era muito educada com os secretários. Garotinho era mais duro. Gostava do cafezinho bem quente e tomava um copo d’água com meio limão espremido, duas ou três vezes ao dia. Também gostava de salada de fruta, que eu mesmo fazia. Adorava cantar. Às vezes se reunia na Prefeitura com as mulheres da igreja. Aí cantava “Noites Traiçoeiras” e outras músicas. Cantava direitinho.
Segundo Seu Zé, quando estava de bom humor, Rosinha também era brincalhona:
— Num final de ano, teve um amigo oculto do auditório. Aí, a menina que me tirou começou falando que o amigo oculto dela gostava de chamar as mulheres de “coisa linda”. Todo mundo sabia que era eu. Aí, Rosinha disse: “Seu Zé, estou muito aborrecida com o senhor. Chama todas as meninas de ‘coisa linda’, mas a mim, não”. Aí eu cheguei para ela, segurei sua mão e disse: “Coisa linda!”. Todo mundo riu.
Embora considere que Rosinha foi uma boa prefeita, Seu Zé diz não entender o montante das dívidas deixadas por seu governo na Prefeitura:
— Tem esse problema de dívida, aí. Essa coisa “braba”, esse negócio de dívida é que não dá para entender. Tiveram tanto dinheiro!
Prefeito durante seis meses em 2010, Nelson Nahim foi outro prefeito servido por Seu Zé:
— Gostava de cafezinho com açúcar e água. À tarde servia torrada, ou uma banana caturra assada no forno, com canela por cima. Era mais calmo que o irmão. Foi um prefeito muito bom. Era muito educado, muito paciente, tinha muita calma para falar com as pessoas. Quando tinha muita gente agitada, eu fazia um suco de maracujá e saía todo mundo calminho.
Muitos anos antes de Rafael assumir a Prefeitura no início do ano, já era um velho conhecido de Seu Zé:
— Quando era criança, ele ficava no gabinete do avô, com a mãe (Beatriz), fazendo bagunça. Corria pra lá e pra cá. E sempre rindo. E isso é uma coisa que ele mantém até hoje: o mesmo riso. É um prefeito amigo de todo mundo. Trata todos da mesma maneira, abraçando e cumprimentando todos por onde vai. É muito carinhoso e simples. Vai na cozinha ver se tem um café, pegar um copo d’água e brinca com a gente, sempre com uma palavra de carinho. Ele puxou o avô: gosta de tudo certinho. E também é firme quando tem que ser. É muito católico, vai à missa todo domingo, no Convento, que eu também frequento. Sem Deus a gente não vive.
Sobre os desafios da criança que cresceu para governar a cidade, Seu Zé serve convicção, na fervura do seu famoso café:
— Ele vai dar conta. Deus vai dar sabedoria para ele governar Campos e resolver o problema das dívidas. Pior, não pode ficar, tem que melhorar. E ele está fazendo tudo para isso.

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