"Não há possibilidade de a obra prosseguir" Retomada do Camelódromo e Mercado Municipal revive polêmicas
14/06/2021 21:47 - Atualizado em 14/06/2021 22:20
Renato Siqueira
O Mercado Municipal de Campos é uma edificação dos anos 1920, com sua arquitetura inspirada no conceito do Mercado Central de Paris, projetado por Victor Baltard. A escolha do local se deu pela facilidade do embarque e desembarque de mercadorias pelo Canal Campos-Macaé, onde navegavam embarcações. O Canal drenou as águas da Lagoa do Furtado, parte dela sendo aterrada, possibilitando que o Mercado se instalasse onde está hoje, saindo do Largo do Rocio, quarteirão da Rua Formosa, em frente a Faculdade de Direito, hoje Uniflu.
A retomada das obras no Mercado e Camelódromo (confira aqui), anunciada pelo prefeito Wladimir Garotinho (PSD) nesta segunda (14), retoma também as polêmicas e os problemas que se arrastam sobre esse importante patrimônio campista, que é tombado pelo Conselho de Preservação do Patrimônio Histórico e Cultural de Campos (Coppam) há oito anos, pela resolução 005/2013. Além do tombamento, uma Ação Civil Pública movida pelo Ministério Público, que tramita na 1º Vara Cível de Campos, propõe o embargo da obra no Mercado. A ação encontrava-se parada desde último dia 10 de fevereiro, quando foi realizada audiência de conciliação, onde a prefeitura não se fez presente.
Nesta semana, em decisão monocrática, o desembargador Agostinho Teixeira, da 13º Câmara Cível, autoriza a retomada das obras no Mercado Municipal, condicionando apenas à existência de laudo do Corpo de Bombeiros, “sem o qual a obra não pode ser iniciada, por questões de segurança”. Em relação a proteção do patrimônio histórico, o desembargador limita-se a citar que deve a ação “comprovar se a reforma, de fato, está em desacordo com os padrões do tombamento”.
Embora seja um prédio tombado, o Coppam autorizou a obra, com sete votos favoráveis e quatro contrários, como demonstra ata de reunião do órgão de 16 de dezembro de 2014. A obra no Mercado Municipal deve seguir não apenas as determinações legais, mas também respeitar seu valor histórico e social. O planejamento urbano, quando bem executado, envolve várias questões, inclusive de saúde pública, e o Mercado é parte importante dele. A edificação, com um imponente relógio compondo a torre de sua fachada, deve ser preservada e servir de educação patrimonial. Mas, também se deve atentar para o entorno do Mercado, pelo conjunto de equipamentos e instalações, um marco de Campos, conquistado no início do século passado.
— A posição do Instituto Histórico e Geográfico de Campos (IHGCG) é a mesma de junho de 2014, quando juntamente com o Observatório Social, Academia Campista de Letras e Associação de Imprensa Campista, provocou o Ministério Publico, para barrar a construção do Camelódromo, por entender que a obra agride o prédio histórico do Mercado Municipal e não resolve os problemas estruturais do entorno do equipamento — comentou Genilson Soares, presidente do IGGCG.
Renato Siqueira, arquiteto e urbanista, membro do Observatório Social de Campos e pesquisador da Uenf, também comentou sobre a retomada das obras:
— Devido a recente decisão do desembargador Agostinho Teixeira, apenas o laudo de exigências do Corpo de Bombeiros impede a retomada das obras. Mas, de acordo com a legislação ambiental e de proteção do patrimônio, que incluído a municipal, não há possibilidade de a obra prosseguir, sobretudo por ser o Mercado Municipal ser um patrimônio histórico tombado pelo COPPAM — afirma Renato.
Sobre as questões que envolvem o tombamento do prédio, o arquiteto é contundente:
— De extrema controvérsia e incoerência (a autorização do Coppam para a obra), por ao menos três razões: a primeira por ser o COPPAM o órgão municipal com a responsabilidade de proteger o patrimônio artístico e cultural; segundo, por ter o próprio COPPAM ter efetuado o ato de tombamento na Resolução 005/2013. Em terceiro, mas não menos importante, a violação da Lei 8487/2013, que reformulou a estrutura funcional do COPPAM. O projeto, considerado pelo INEPAC (Instituto Estadual do Patrimônio Cultural) como de emparedamento e de empachamento do entorno do Mercado, foi desenvolvido por um escritório de arquitetura local contratado pela prefeitura durante o governo Rosinha Garotinho. Aprovado pelo COPPAM em uma reunião repleta de vícios e incorreções. No aspecto da proteção do patrimônio arquitetônico, da sustentabilidade ambiental e boas práticas do exercício profissional da arquitetura e urbanismo, o projeto é uma aberração, contrário ao recomendado, sobretudo pela legislação de proteção ao bem histórico.
Perguntado sobre possíveis alternativas, cita:
— A própria prefeitura já realizou diversos projetos alternativos, para contemplar não só o Camelódromo, quanto a Feira Livre, revitalizando totalmente o espaço no entorno do Mercado, sem deixar de oferecer espaços de qualidade, tanto aos feirantes, quanto aos permissionários do Camelódromo, de forma justa para esses trabalhadores que merecem a melhor atenção da prefeitura, mas, que, infelizmente, tem sido desprezado há longos anos. É hora de oferecer melhores condições a essas dignas classes de trabalhadores.
Por fim, questiona se houve concorrência pública para escolha do escritório de arquitetura responsável:
— Na época (de apresentação do projeto) só foi noticiado qual escritório de arquitetura seria o responsável pelo desenvolvimento do projeto, sem se ter notícia do edital para a licitação pública de contratação do projeto para o Mercado. Ou seja, até hoje não se sabe se houve ou não concorrência pública para a contratação do projeto.
Nota: Foi enviado demanda à Prefeitura de Campos, Inepac, Corpo de Bombeiros, Tribunal de Justiça e Ministério Público, sem resposta até esta publicação. O espaço fica franqueado. 

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    Edmundo Siqueira

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