A coragem precisava vencer, mas faltou bastante
Amanhã (31), o prefeito Rafael Diniz (Cidadania) encerra seu ciclo na Prefeitura de Campos dos Goytacazes. Eleito em 2016, em primeiro turno, com 55% dos votos que totalizaram mais de 151 mil eleitores, Diniz representava uma esperança. À época, o resultado eleitoral demonstrava insatisfação do eleitorado campista com a administração do grupo garotista — desgaste potencializado nos 100 milhões desperdiçados no CEPOP.
Durante as eleições deste ano, Roberto Henriques (PCdoB) adjetivou, em entrevista ao Folha no Ar da Folha FM 98,3, como "perdulários" os modelos de gestão na Prefeitura de Campos desde 1998. E estava coberto de razão. Mas, a esperança que o jovem prefeito representava precisava vir do verbo esperançar; que é o contrário de esperar, como a palavra parece supor. Era preciso agir.
Na última entrevista antes do primeiro turno, concedida ao portal G1, Rafael demonstrava saber o que precisava ser feito. Respondendo a indagação “o que você pretende fazer para que Campos seja uma cidade de destaque no estado?”, ele respondeu: “investindo em nossas vocações históricas. No caso da Agricultura, por exemplo, podemos ser destaque não só no estado, mas em todo o país. Infelizmente este governo transformou a Secretaria de Agricultura em uma superintendência. Vamos reimplantar a Secretaria de Agricultura e Pesca, garantindo maior participação no orçamento”.
 Rafael no lançamento, durante a pandemia, do programa
Rafael no lançamento, durante a pandemia, do programa "Campos daqui para frente", prevendo a retomada de atividades econômicas e sociais, debatido com representantes das instituições do comércio e indústria. / Reprodução
 
Assim como alguém que votou em Bolsonaro não pode alegar desconhecimento sobre sua falta de decoro, Rafael não pode dizer que não conhecia os problemas e as soluções de Campos. Seu mote de campanha era afirmar que “nada foi feito nos últimos anos para diminuir a dependência dos royalties”. Mas, esse foi o modelo que ele fez perdurar. A agricultura continuou uma superintendência, com orçamento pífio, e o agronegócio que poderia ter “salvado a lavoura” não foi incentivado, trabalhado, tampouco utilizado como fonte de receita para o município.
Por estimativa do empresário Renato Abreu, presidente do Grupo MPE, o setor sucroalcooleiro irá movimentar na economia local algo em torno de R$ 500 milhões durante a safra 2019/2020.
Por estimativa do empresário Renato Abreu, presidente do Grupo MPE, o setor sucroalcooleiro irá movimentar na economia local algo em torno de R$ 500 milhões durante a safra 2019/2020. / Rodrigo Silveira
 
Para dar apenas alguns exemplos, em Sapezal, no Mato Grosso, município líder na produção de algodão, o PIB agro em relação PIB do município é de 54,5%. Ainda no mesmo estado, Diamantino tem a proporção de 54,3%. Em São Desiderio, na Bahia, a participação do PIB é de 66,5%. O valor médio da produção dos 50 municípios com maior valor da produção de agronegócio é de R$ 1,521 bilhão. Ainda utilizando o exemplo de Sapezal, a sua produção de agro foi na cifra de 3,338 bilhões. Vale lembrar que o orçamento total previsto para Campos em 2021 é de 1,57 bilhão.
Em 2020, Rafael tenta a reeleição com o lema “a coragem precisa vencer”. Os 5,45 % dos votos conseguidos por ele mostram que o slogan não refletia a prática. Faltou coragem, faltou ação. Em uma analogia rasa, mas que exemplifica bem o que precisa ser dito, se alguém herdasse dívidas de seus pais, e nada fizesse senão reclamar da herança maldita, estaria ele ou ela fadado ao fracasso contínuo e passaria por sérias dificuldades. Rafael não buscou “dinheiro novo”, não atraiu investimento e não aproveitou as mesmas “vocações históricas” que ele já conhecia e prometera investir.
Campos ainda precisa de coragem. A a Folha promoveu 11 painéis, com especialistas em diversas áreas (podem ser conferidos neste link, que tem um excelente resumo do jornalista Aluysio Abreu Barbosa), que comprovam essa necessidade. Em um ano tão complexo e triste, resta a nós, campistas, esperançarmos em dias melhores. E que eles reflitam em possiblidade real de investimento em cultura, educação, esporte e lazer, direitos fundamentais, previstos na Constituição Brasileira de 1988 e tão necessários em solo campista.  
Mesmo representando um grupo tradicional e “perdulário”, o prefeito eleito Wladimir Garotinho parece ter acertado na escolha do vice, Frederico Paes (um dos grandes responsáveis pela sua vitória em opinião pessoal deste que escreve), e no secretário de Agricultura, Almy Junior (com grande capacidade acadêmica e de gestão, já demonstradas), que apresentam as condições técnicas e pessoais para ter a coragem de fazer o município se render ao que nasceu para ser: produtivo, com um agronegócio (aqui em lato sensu, envolvendo a agricultura familiar) forte.
Com o ‘ouro negro’, que brota na bacia sedimentar campista, mostrando que não é uma fonte inesgotável de recursos, restam poucas alternativas econômicas com potencial para salvar o município, e quase todas concentradas no campo. Mais especificamente — e possivelmente — no ‘ouro branco’ que pode brotar dos  mais de 4 mil quilômetros quadrados.
A esperança que Rafael Diniz representava foi ficando presa nos buracos das vias urbanas e das estradas que deveriam promover o escoamento da produção agropecuária. O malabarismo que todo campista teve que fazer para desviar desses e outros buracos exigiu coragem, aprendida na dificuldade, não no exemplo.

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    Edmundo Siqueira

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