Cemitérios públicos de Campos podem ser concedidos à iniciativa privada
Edmundo Siqueira 22/07/2022 14:30 - Atualizado em 22/07/2022 14:39
Rodolfo Lins - PMCG
Começa a vigorar nesta sexta-feira (22), a Lei Municipal nº 99/2022, que autoriza a municipalidade outorgar a concessão do serviço público funerário em Campos dos Goytacazes. Com a entrada da nova lei em vigor, os cemitérios públicos do município poderão ser administrados pela incitativa privada, mediante licitação. O ordenamento legal foi aprovado pela Câmara no final de junho, recebendo seis emendas modificativas dos vereadores de oposição.

O Cemitério do Caju, maior necrópole publica do interior do Rio de Janeiro, está entre os que poderão ser privatizados. Com mais de 19.000 sepulturas e um cemitério judaico em seu interior, o Caju é o cemitério que realiza o enterramento de indigentes e pessoas em situação de vulnerabilidade, que são pagos pela prefeitura. Campos possui outros 23 cemitérios.
Secom - PMCG


A Companhia de Desenvolvimento do Município de Campos (CODEMCA), criada em 1978, é a responsável pela administração dos cemitérios públicos de Campos. Com a concessão aprovada pela nova lei, alguns pontos precisarão de ser equacionados, como a situação dos cemitérios particulares das Irmandades — o Cemitério do Caju possui nove em seu interior —, do Cemitério Israelita instalado ali e questão dos enterramentos dos indigentes. Desde 2021, é cobrada pela CODEMCA uma taxa de R$ 147,90 pelas sepulturas perpétuas.

Como início para solução dos impasses, a emenda modificativa nº 001, de autoria dos 13 vereadores de oposição, incluiu a “gratuidade para sepultamentos de pessoas reconhecidamente pobres”. Os critérios, segunda a mesma emenda, serão definidos pela prefeitura e “previstas no contrato de concessão”.
O responsa?el pela CODEMCA, Afrânio Júnior, não retornou o contato até a publicação desta matéria, apesar de ter visualizado a mensagem via aplicativo WhatsApp.
Cemitério do Caju possui 167 anos

A nova lei traz em seu artigo primeiro a garantia do “caráter secular dos cemitérios”. O do Caju foi constituído em meados dos anos 1850, com escolhido onde antes era habitado pelos indígenas de Campos, na parte alta entre uma grande lagoa e o rio Paraíba do Sul. Naquele tempo, Campos estava assolada por uma epidemia de cólera, que matava cerca de 100 pessoas por dia. Antes do cemitério publico, os corpos eram enterrados nas igrejas da cidade, ou em seus adros (pátio externo descoberto, localizado em frente ou ao lado).

Também haviam enterramentos na antiga Santa Casa de Misericórdia, onde hoje é um edifício-garagem no centro, e no cemitério de Quimbira, onde hoje é a Faculdade de Medicina de Campos (FMC). A cólera, doença conhecida à época como o “mal do oriente”, deixou mais de 2.000 mortos na cidade, o que levou a construção de um cemitério público. O local escolhido era conhecido como “coroa” ou “fundão”, e depois ficou conhecido como Cemitério do Caju.

Em 1922, a pedido das famílias judaicas que migraram para Campos, é construído no interior do Cemitério do Caju um cemitério judaico. Para o local existe um projeto para construção de um memorial.

A historiadora campista Sylvia Paes, que estuda os cemitérios de Campos há alguns anos, e frequentemente é convocada para ser guia de visitação de estudantes e pesquisadores no Cemitério do Caju, comenta a nova lei:


— Toda vez que vejo o poder público, seja ele de que nível for, abrir mão de seu poder de gestão sobre algum equipamento, dois pensamentos me veem a mente. O primeiro é na incompetência dos gestores públicos e o segundo é na praticidade de se jogar um problema no colo da empresa privada. Contudo, tudo pode dar certo. A taxa da CODEMCA não possui ampla divulgação, devendo os proprietários estar cientes de que a falta de seu pagamento por cinco anos consecutivos significa abandono do túmulo, e a área reverte para o poder público que poderá vendê-la quando necessário, aferindo os lucros. A administração do Cemitério do Caju, assim como dos demais, não possui nada informatizado, seja número de sepulturas, seja o número de óbitos por tipo de doença, tão valiosa na avaliação da saúde pública. O levantamento minucioso de dados é de suma importância para pesquisadores e planejadores, trabalhar sem esses dados é praticamente impossível.

Sylvia Paes defende o uso turístico do Cemitério do Caju. Por mais que possa “parecer estranho para nossos padrões culturais”, alguns países utilizam o espaço para visitações turísticas e atividades culturais. “Tudo pode melhorar, afinal campos cemiteriais de modelo americano pelo mundo, ou seja, cemitérios-parque, com cinema, teatro e festas populares, são atividades que trazem receita para o empreendimento e consequentemente podem levar a melhorias e manutenção do espaço”, disse a historiadora.

Apesar de a concessão possibilitar novos usos, Sylvia se mostra preocupada com a questão dos enterros de indigentes:

— Nenhum cemitério particular assume enterramentos de indigentes. Mesmo que haja dentro da lei de concessão a garantia (concedida via emenda de vereadores), deve ser muito bem amarrada, uma vez que nenhum corpo deve ficar sem sepultura, é um direito garantido legalmente.



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