"A Favorita" estreia no Kinoplex
- Atualizado em 27/02/2019 18:37
Entre as estreias da semana nos cinemas de Campos o destaque, sem dúvida, é para “A Favorita”, que foi indicado para dez Oscars e possibilitou a atriz Olivia Colman o prêmio de melhor atriz.
De acordo com a crítica, alguns filmes surgem e fazem uma campanha tão positiva junto aos críticos e especialistas de cinema em festivais, que começam a gerar burburinho de prêmios. E quando a época de premiações de fato chega, tais filmes começam a ser lembrados em todas elas, escalando seu caminho até o auge da sétima arte: o Oscar. É exatamente este o caso de “A Favorita”, drama de época passado na corte britânica do século XVIII.
Para entender melhor as entrelinhas de “A Favorita” é necessário traçar um perfil de seu comandante, o grego Yorgos Lanthimos. Oriundo de um tipo de cinema deturpado, criativo, mas para lá de desconfortável, o currículo do diretor não gritava exatamente “prêmio popular” no passado. É só dar uma olhada em obras como “Dente Canino” (2009), “O Lagosta” (2015) e “O Sacrifício do Cervo Sagrado” (2017) para perceber um padrão inquietante, dentro e, consequentemente, fora das telas — imprimindo em nós, o público, uma tensão avassaladora.
Na trama, assim como grandes e inesquecíveis filmes sobre manipulações e intrigas — vide “A Malvada” (1950) e “Ligações Perigosas” (1988) — Rachel Weisz e Emma Stone se digladiam num verdadeiro jogo de xadrez pelo afeto da Rainha Anne (Olivia Colman). Insegura, se sentindo completamente pressionada pela iminente guerra com a França e num processo degenerativo em relação a doenças atribuladas à sua péssima alimentação, a monarca “louca” (dona de fortes tendências homossexuais) é vestida pela britânica Colman como uma roupa justa, mas extremamente confortável.
Colman é uma atriz estupenda, que nunca teve chance para brilhar antes como em “A Favorita”. Justamente por isso, seu reconhecimento (mesmo que tardio) é muito bem-vindo. Este é um papel divisor de águas em sua carreira e a artista se entrega de cabeça — realizando inclusive cenas indigestas em questão de repugnância (uma certa cena de vômito e bolo azul). Justamente por tal inconsistência em sua forma de reinar, cresce o poder de sua dama de companhia, a cortesã Lady Sarah, vivida de forma vampiresca por uma severa Rachel Weisz. É ela quem sopra no ouvido da governante, e rege o país com mão de ferro, sempre tendo suas vontades atendidas.
Um dos panos de fundo de “A Favorita” é a guerra com a França, que se aproxima a passos galopantes. Ainda hesitando, a Rainha Anne não tem certeza se esta é a decisão mais sensata — e nesta linha de raciocínio, o inescrupuloso Harley (Nicholas Hoult) é um dos principais defensores de uma estratégia pacifista, que una os países e não os separe com sangue. Lady Sarah tem uma ideia diferente — e assim como extremistas radicais, prefere tomar decisões duras e declarar guerra, antes que o país seja saqueado pelos inimigos — cenário inquestionável em sua cabeça. Existem muitas entrelinhas políticas contidas em “A Favorita”, a maioria facilmente traduzidas para a atualidade — muitas em relação à personagem fria e estrategista de Weisz.
Como precisamos de mais conflitos, entra em cena a ingênua e, a princípio, destrambelhada Abigail (Emma Stone), prima da personagem de Weisz. Uma vez uma dama da sociedade, a família da jovem cai em desgraça financeira, forçando-a a assumir um cargo de serviçal no castelo da Rainha. Na trilha das mais espertas alpinistas sociais, aos poucos Abigail vai conquistando seu espaço e aumentando seu terreno no gosto da Rainha. Seu carisma, juventude e energia começam a cativar a regente, e em pouco tempo estará declarada a guerra — não entre Inglaterra e França, mas sim entre as favoritas da Rainha, por um lugar único em seu coração e ao lado do trono.
“A Favorita” é escrito por Tony McNamara e Deborah Davis, que mesclam com muita propriedade tremendo humor ácido (e doses alucinógenas) a uma trama sóbria de história e política. Um dos grandes charmes do longa é sua insanidade fluente, que escorre por diversos frames e cenas. Por falar em frame, o filme é extremamente ousado em seu visual — onde a fotografia arrisca com trechos nos quais são utilizadas lentes grande angular, dando aquele aspecto arredondado no qual conseguimos ver além do olho humano, numa conjectura de 180 graus. É pura extravagância. Mas uma necessária.
Além do domínio de Colman — no papel mais difícil do trio (reparem no longo close que a atriz recebe momentos antes de revelar à personagem de Stone e à plateia seu tórrido caso de amor com Weisz) —, o resto do trio está tão à vontade que é difícil dizer quem é a protagonista e pilar desta estrutura. Mais um ponto para o roteiro e a direção de Lanthimos.
“A Favorita” é pura decadência. É a olhada de bastidores na podridão dos poderosos. Uma viagem enlouquecedora através de psiques abaladas, corredores e escuras passagens secretas. “A burguesia fede” de Cazuza encontra sua materialização. Propriamente atualizada para “o ser humano fede” e não presta. A não ser Yorgos Lanthimos, Emma Stone, Rachel Weisz, Olivia Colman e um dos grandes filmes do ano.
Também entram em cartaz “Crimes Obscuros”, “A Caminho de Casa”, “Cinderela Pop”, “O Parque dos Sonhos” e “Capitão Marvel”. Permanecem em cartaz “A Morte Te Dá Parabéns 2”,”A Mula”, Minha Fama de Mau”, “Minha Vida em Marte”, “Sai De Baixo — O Filme”, “Green Book — O Guia”, “Alita: Anjo de Combate” e “Como Treinar Seu Dragão 3”. (A.N.) (C.C.F.)

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