Corpo de Martinho Santafé é sepultado no Caju
Verônica Nascimento, Maria Laura Gomes e Matheus Berriel 06/02/2019 12:14 - Atualizado em 13/02/2019 17:09
Sepultamento aconteceu no Caju
Sepultamento aconteceu no Caju / Isaias Fernandes
Foi sepultado nesta quarta-feira (6) à tarde, no cemitério do Caju, em Campos, o corpo do jornalista, poeta e artista plástico Martinho Santafé, editor-geral da Folha da Manhã no início dos anos 1980. Martinho lutava contra o câncer no cérebro e pulmão, desde o ano passado, e faleceu na última terça-feira (5), no Hospital Geral de Guarus (HGG), onde estava internado. O velório aconteceu na capela da Santa Casa, em cerimônia que contou com breves discursos de familiares e amigos.
— Campos, onde ele nasceu e agora está sendo sepultado, é uma cidade que teve grandes indígenas. E Martinho foi um grande guerreiro. Pude testemunhar muitas coisas lindas dele, olhando com olhar de abelha, não de mosca, que só nota os defeitos. (...) Martinho tinha respeito por todas as pessoas, mesmo que pensassem totalmente diferente. Nossa relação sempre foi assim, de muito respeito. Ele não está partindo, é a matéria que está indo. Ele está dentro do coração de cada um de nós. Enquanto alguém lembrar de Martinho, ele estará vivo — disse Maria Bernadete Vasconcellos, atual esposa do jornalista.
A primeira esposa, Fátima Lacerda, recordou os bons momentos vividos com o ex-marido. Lamentou a despedida, mas enalteceu a maior herança deixada por Martinho, os filhos do casal, Vladimir e Maíra. Entre elogios, citou um fato ocorrido na década de 1970, em Duas Barras, onde se casaram, para exemplificar sua luta pela causa ambiental:
— Subiu em uma árvore e disse que dali não saía, porque queriam cortá-la. A árvore não foi derrubada, mas o delegado o prendeu por desacato à autoridade. Moradores da cidade foram visitá-lo, foi um movimento grande. Queriam transferi-lo para Friburgo, mas o povo não permitiu. Posteriormente, o processo foi arquivado. Era uma pessoa polêmica, mergulhou em abismos e saiu inteiro, inclusive da dependência química. Um jornalista fantástico. Vejo tudo isso nos filhos dele, a arte, o artesanato. Esses filhos guerreiros terão coragem de superar e se reconstituir — afirmou.
Antônio Leudo
Residente em Niterói, o casal de filhos estava a caminho de Campos quando foi informado da morte de Martinho. Segundo Maíra Santafé, em um dos encontros recentes, o pai havia pedido para ser sepultado em Macaé, cidade que escolheu para morar desde 1981. Contudo, os filhos acabaram optando pela cerimônia no túmulo da família, na cidade natal de Martinho, para que sua mãe, Lia Gazen, pudesse comparecer, aos 87 anos, mesmo na cadeira de rodas. Devido às limitações impostas pela idade avançada, Lia participou apenas do velório, deixando inclusive uma rosa sobre o caixão. Sempre próxima da avó, consolando-a durante a cerimônia, Maíra comentou o adeus:
— O sentimento de perda é muito ruim. Ele foi diagnosticado com câncer em setembro, e a gente veio acompanhando de perto. Mesmo sabendo que, em algum momento, ia chegar essa hora, quando chega é muito ruim. Mas, ao mesmo tempo, dá muita tranquilidade ver o legado que ele deixou; muitas pessoas o homenageando. Ele foi importante para muita gente, na luta pelo meio ambiente também. Dá uma tranquilidade saber que ele não morreu. Artista não morre. Ficam as poesias dele — disse Maíra. Estendida sobre o corpo, a bandeira de Macaé representou a forte ligação de Martinho com aquele município.
Vladimir Santafé também ressaltou a obra do pai: “Ele foi jornalista, ativista ambiental, poeta comparável a Bandeira, Drummond, e um artista plástico genial, que fez várias exposições, inclusive em Portugal. Uma pessoa querida por todos, admirável, que não passou em vão. Vai deixar saudade, mas também uma obra extensa, um legado precioso”.
Além da Folha da Manhã, Martinho trabalhou nos jornais campistas A Cidade e a Notícia; na sucursal de O Fluminense; e no macaense O Debate. Durante a Ditadura Militar, no início da década de 1970, passou quatro anos em exílio “voluntário e sugerido” pela América Latina. Atuante no jornalismo até a morte, era diretor da Revista Visão Sócio Ambiental.
Amigo pessoal dos tempos em que dividiram redação em Campos, o jornalista Péris Ribeiro não pôde comparecer ao sepultamento devido a problemas de saúde, mas deu seu depoimento:
— Foi uma amizade forte, porque a gente tinha muitos traços em comum, na tentativa de fazer um jornalismo diferenciado, renovador, e também pela ligação com a cultura, que muito nos interessava. Politicamente, a gente já conversava menos, apesar de termos uma visão similar. Só em falar das amizades que ele teve com Aristides Soffiati, Aluysio Barbosa (in memorian) e Chico de Aguiar, você vê que era um cara muito fácil de fazer amigos, apesar de ter algumas amizades turbulentas pelo temperamento forte. A gente também se encontrava muito pelo lado da boemia, éramos grandes boêmios — pontuou.
Outro jornalista, Chico de Aguiar contou ter perdido não apenas um amigo de infância, mas um irmão: “Crianças, corríamos atrás de caminhão de cana, na rua 13 de Maio. Era meu vizinho quando mudei para lá, aos seis anos. Ele iniciou o jornalismo diário em Macaé, há 30 anos. Tenho um quadro dele na minha casa. Vai deixar saudades, mas também uma obra extensa, um legado”. Segundo Chico, o parceiro será homenageado batizando o novo prédio da Universidade Federal Fluminense (UFF) em Macaé.
Martinho também teve ligação com Carnaval, seguindo os caminhos do pai, já falecido. Herval Santafé, popularmente conhecido como Lord Broa, foi o fundador do tradicional Bloco Os Caveiras, de Campos. O filho, por sua vez, fundou o Boi Capeta, em Macaé, e o bloco Oficina 38, em Duas Barras. Uma camisa deste foi colocada sobre o caixão na parte final do velório.

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