Farra dos atestados na Saúde pública de Campos é denunciada
Daniela Abreu 02/03/2020 19:48 - Atualizado em 10/03/2020 14:29
A "farra dos atestados" na Saúde Pública de Campos. Essa foi a denúncia que a Inter TV, do Grupo Folha, fez na noite desta segunda-feira (02), no RJ Inter TV 2ª edição. De acordo com o levantamento feito nos últimos dois meses pela emissora, os médicos que mais apresentaram atestados no município continuaram com atendimento na rede particular. Além disso, a reportagem identificou nas redes sociais que os médicos afastados do serviço público participaram de congressos e viajaram justamente no período em que estariam fora do serviço público por problemas de saúde. Os dados obtidos através da Lei de acesso à informação revelaram a ausência de 16% dos médicos concursados no ano passado e que o percentual aumentou, em comparação ao ano de 2018. Atualmente, os médicos de Campos estão em greve e alegam, entre outros pontos, falta de condições de trabalho para paralisação.
Dados apontam que foram 524 atestados no ano passado, apresentado por 207 médicos, totalizando 11.688 dias de ausência, o que representa um aumento de 40% em relação aos atestados apresentados em 2018, que somaram 524, apresentados por 144 profissionais em um total de 10.100 dias de faltas. Este ano já foram 22 pedidos de afastamento, de 19 médicos.
Campos tem número de médicos três vezes acima do recomendado pela Organização Mundial de Saúde (OMS), que é de 1 para cada mil habitantes. A matéria da InterTv aponta que as condições de trabalho e carga horária podem fomentar a necessidade de afastamento por indicativos de saúde. A reportagem, no entanto, constatou alguns excessos de atestados e conflitos de informações nas redes sociais de alguns profissionais, durante o período indicado de afastamento. Um médico, lotado na Unidade de Pré-Hospitalar (UPH) São José, por exemplo, apresentou atestado em 02 de julho de 2018 e, após duas semanas, estava em um curso em Araçatuba (SP). A reportagem revela, ainda, que durante os cinco meses de ausência ele esteve em congressos, no Rio Grande do Sul, trabalhou em uma unidade de Itaperuna e praticou artes marciais.
Uma pediatra pediu dispensa por 60 dias, em 25 de maio de 2019 e, no dia seguinte, estava em uma aula de mestrado em Cabo Frio. Segundo a matéria, mesmo apresentando quatro atestados consecutivos, a médica continuou atendendo em seu consultório particular e lecionando em uma universidade de Itaperuna.
Outra pediatra, que atende no Hospital Ferreira Machado (HFM), referência regional em emergência, apresentou atestado em 18 de março do ano passado e outros seis de 60 dias.
A produção revelou ainda que, este ano, 19 médicos apresentaram atestado entre as festas de final de ano e meado de janeiro. Um cirurgião vascular, lotado no Hospital Geral de Guarus (HGG), apresentou atestado em abril do ano passado e retornou em 22 de fevereiro deste ano, no entanto, 10 dias antes do retorno, a equipe foi informada que ele estava atendendo normalmente em seu consultório particular.
A apresentação de atestado médico falso configura crime de falsidade ideológica, com pena prevista de um a cinco anos de prisão. Quem emite atestado falso também comete crime e pode ser condenado entre um mês a um ano de reclusão em regime fechado.
Procurado, via telefone, pela Folha da Manhã, o presidente do Sindicato dos Médicos de Campos (Simec) José Roberto Crespo, não atendeu ou retornou as ligações.
Já o delegado regional do Conselho Regional de Medicina do Estado do Rio de Janeiro (Cremerj), Rogério Bicalho, explicou que o órgão precisa ser provocado, através de denúncia formal, para analisar caso a caso. “Qualquer denúncia vai ser devidamente apurada, por um grupo isento, do Rio de Janeiro e a sindicância vai ser aberta, porém, eu preciso que a denúncia seja feita. Isso é o que a imprensa está falando, com dados, provavelmente, fornecidos pela Prefeitura. A Prefeitura, por outro lado, está nessa briga com os médicos, que estão em greve. Então, a gente tem que ter muita calma na hora de dar uma informação porque, na verdade, há um litígio. Se a Prefeitura tiver vontade de fazer uma denúncia contra os médicos é só fazer”, explicou Rogério que acrescentou ainda que, o atestado falso é cabível de penalidade, tanto ao profissional que apresenta, quanto o que concede.
— Se houve um atestado falso ou ele [o médico] estava inapto para realizar uma função e estava realizando fora, ele [médico] pode ter, desde advertência verbal até cassação do registro profissional, mas é preciso avaliar. Às vezes, o médico não está apto para realizar um plantão de 24 horas porque ele tem que reanimar paciente, subir em maca para massagem cardíaca. Às vezes, ele está com uma lesão no ombro que o impossibilita disso, mas não impossibilita dele atender num consultório ou dar aula. Aí, caberia à Prefeitura avaliar e desviar ele de função — acrescentou.
Em nota, a prefeitura de Campos informou que “a apresentação de atestado médico pelos servidores públicos da Administração Direta é regulamentada pela portaria nº 440/2017 e a Prefeitura de Campos segue as diretrizes que constam nesta portaria. Se comprovada qualquer irregularidade, seja através de análise dos Departamentos Pessoais, de Recursos Humanos ou através de denúncia, será instaurado um inquérito administrativo contra o servidor que poderá resultar até em sua exoneração. Através do Instituto de Previdência dos Servidores Públicos Municipais (PreviCampos) ou Serviços Especializados em Engenharia de Segurança e em Medicina do Trabalho - vinculado a secretaria de Saúde - são realizadas as perícias para a avaliação da emissão do atestado direcionado a servidores ativos vinculados ao Instituto. Quando há casos específicos de aposentadoria por invalidez, por exemplo, estes são analisados por uma junta específica. Desde 2017, a Prefeitura vem criando mecanismos para controle da efetividade do funcionalismo público, como um todo. Prova disso é a própria implementação do ponto biométrico. Casos de denúncias podem ser feitos no Portal da Transparência, Ouvidoria ou através do setor da Comissão de Inquérito, vinculado a secretaria de Gestão Pública”.

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