Joseli Matias
17/08/2019 18:28 - Atualizado em 26/08/2019 14:18
A herança financeira de Campos voltou à evidência nessa semana, quando a cobiçada participação especial (PE) sobre a produção do petróleo apresentou-se como garantia para uma proposta de acordo da Prefeitura de Campos aos médicos, em greve desde o dia 7 de agosto. Os recursos provenientes da exploração da commodity têm sofrido quedas significativas desde 2016, quando o repasse do primeiro trimestre alcançou o menor valor (R$ 4.476.216,40) em décadas, o que tem comprometido a saúde financeira do município, já que, nos tempos de fartura, Campos se tornou dependente desse tipo de recurso. Hoje, o município recebe de PE menos de 1/3 da média dos repasses entre os anos de 2009 e 2016.
Nesses poucos mais de 31 meses do governo Rafael Diniz, Campos teve uma média de repasses de participação especial de R$ 40.877.065,06, enquanto a média nos oito anos de mandato de Rosinha Garotinho foi de R$ 124.712.642,32.
O maior repasse de PE entre os anos de 2009 e 2016 — de R$ 188.722.093,82 — ocorreu em fevereiro de 2013, referente à produção do 4º trimestre de 2012. Com atualização financeira pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), o valor representaria nos dias atuais R$ 270.832.906,54.
Entre janeiro de 2017 e agosto de 2019, quando foi feito o último repasse desse tipo de recurso, o maior valor foi pago em agosto de 2018, referente ao petróleo produzido no 2º trimestre do mesmo ano: R$ 64.182.022,04, ou R$ 66.124.446,01, com correção monetária.
A dependência dos royalties para o pagamento de despesas de custeio tem histórico de mais de duas décadas e a queda vertiginosa nesse tipo de arrecadação tem comprometido as contas de municípios e estados produtores, colocando em risco diversos investimentos e projetos.
— Todo mundo sempre soube que essa hora chegaria. E ela chegou. Campos vive uma nova realidade financeira e é preciso coragem de todos nós para enfrentar. Já acabou aquela época da fartura e do dinheiro de sobra. E como prefeito vou continuar a tomar todas as decisões necessárias, por mais difíceis que sejam, decisões de gestão responsável. Por mais duro que seja para todos entenderem esse novo momento, não há outro caminho. É disso que Campos precisa — ressaltou o prefeito Rafael Diniz.
De acordo com o diretor de Petróleo e Gás da superintendência municipal de Ciência, Tecnologia e Inovação, Diogo Manhães Henriques, a redução significativa ocorreu devido à redução no Brent e principalmente devido à queda de produção e aumento dos gastos dedutíveis das concessionárias com a produção dos campos.
— Se olharmos o acumulado do ano de 2019, entre janeiro e agosto, o município já acumula perda de quase R$ 100 milhões de royalties e participação especial. Os campos que hoje pagam PE para o município já são considerados campos maduros. Esses campos precisam ser revitalizados para que sua produção possa ser mantida ou até aumentada. Segundo previsões da ANP (Agência Nacional de Petróleo), existe uma expectativa de aumento anual da PE para Campos somente a partir dos anos de 2022/2023, que é quando a Petrobras deve estar com os projetos de revitalização dos campos de Marlim e Roncador, de forma a aumentar o fator de recuperação de petróleo destes campos e consequentemente a produção. Também é importante levarmos em consideração a variável principal neste caso, que é o Brent, a qual possui um reflexo significativo no valor final da PE. Pelas cotações atuais ele está com tendência de declínio, o que poderá reduzir ainda mais as futuras PEs, devido ao fato da segunda variável, que é produção, estar quase sempre em declínio — analisa o superintendente.
Repasse - Nessa quinta-feira (15), o município de Campos recebeu R$ 34.987.852,66 de participação especial referente à produção do 2º trimestre deste ano. O valor é 9,3% superior ao repassado no trimestre anterior (R$ 32.025.199), mas 45,5% inferior ao depósito de agosto de 2018 (R$ 64.182.022).
Finanças de produtores ainda podem se agravar
A situação de municípios e estados produtores está ruim e ainda pode piorar. Em 20 de novembro, o Supremo Tribunal Federal (STF) julgará as Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) que tratam da divisão dos royalties do petróleo. As ADIs questionam a Lei 12.734/2012, que fixa novas regras de distribuição dos recursos. A data foi anunciada em abril pelo presidente do STF, ministro Dias Toffoli, que cedeu à pressão da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), após manifestação em frente ao Supremo.
A mudança nas regras de partilha pode significar a falência dos municípios e estados produtores. Caso a nova regra entre em vigor, Campos perderia 70% das receitas com origem na exploração do petróleo, o que elevaria o gasto com pagamento de pessoal dos atuais 47% da receita líquida para 63%, ultrapassando a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF), levando o gestor a demitir servidores para não ser responsabilizado nos tribunais.