Crítica de cinema - Carta de amor ao personagem
11/01/2019 17:28 - Atualizado em 14/01/2019 14:41
(Homem aranha: No Aranhaverso) - Criado em 1962 pelo recém-falecido e lendário quadrinista Stan Lee, o Homem Aranha sempre foi um dos personagens mais queridos dos quadrinhos. A identificação com o leitor sempre foi sua melhor característica. Sai o órfão milionário, o alienígena criado no campo, o Deus nórdico do trovão, o soldado que passou por um experimento e entra um adolescente muito inteligente e desengonçado de classe média baixa, criado pela avó, que sofre bullying (mesmo que esse termo ainda estivesse longe de existir, mas a prática já acontecia) e não leva jeito com as garotas. A identificação foi instantânea e essa foi a grande sacada de Lee.
Passados 58 anos, chega aos cinemas “Homem Aranha: No Aranhaverso”, uma animação caprichada que é a mais bem sucedida adaptação desse espírito dos quadrinhos aracnídeos para a sétima arte. Uma carta de amor ao personagem, em um longa ambicioso com muitos objetivos e que consegue divertir, emocionar, resgatar o verdadeiro espírito do personagem (que anda em falta até mesmo nos quadrinhos) e ainda introduzir diversos personagens, mas principalmente o protagonista Miles Morales, o Homem Aranha adolescente para as próximas gerações.
Mateusinho
Mateusinho
Miles Morales é um adolescente, descendente de hispânicos que vive com os pais, estuda em uma nova escola e encontra-se totalmente deslocado. Um dia, ele é picado por uma estranha aranha que dá a ele poderes muito parecido com o do herói da cidade, o Homem Aranha. Inspirado no legado do falecido herói, ele visita o túmulo de Peter Parker em uma noite chuvosa e se depara com o próprio Peter vivo, ele descobre se tratar do Peter de outra dimensão e que existem vários outros Homens aranha perdidos na cidade.
A escolha de Miles Morales como protagonista do longa e a escolha da trama com diversos homens aranha, é uma escolha corporativa muito acertada da Sony. Após o acordo que levou o Homem aranha a fazer parte do universo da Marvel Studios no cinema, a Sony precisava decidir o que fazer com o restante do universo de personagens do aracnídeo e esse longa dá a Sony seu próprio Homem aranha e uma grande gama de possibilidades com outros personagens.
O longa brinca com a repetição da narrativa de origem do personagem, já contada à exaustão nos cinemas, porém, muito da compreensão do longa vem justamente dessa fato. O roteiro escrito pela dupla Phil Lord e Rodney Rothman compreende que o espectador já é familiarizado com o personagem e aposta numa trama que traz a origem de Miles como herói, mas é menos didático que os longas anteriores e constrói uma ligação direta com os quadrinhos.
Essa ligação permeia toda a obra. A montagem, efeitos, as onomatopeias, até balões como pensamentos são utilizados. O filme abraça esse estilo narrativo e o fato de se tratar de uma animação permite que tudo flua de forma natural. A montagem (um dos pontos fortes do filme) usa artifícios dos quadrinhos para criar cenas dinâmicas e empolgantes. Narrativa e estilo misturados com muita qualidade.
Ao trazer homens aranhas de diferentes dimensões, eles fundem diversos estilos de animação e traços, sem que os personagens percam suas características e criando diferentes camadas de animações, que interagem com muita criatividade, culminando em seu terceiro ato em batalhas realmente psicodélicas, em uma explosão de cores e estilos que impressionam.
Todo o visual impressiona, mas o que realmente difere esse longa de outros longas de heróis, é o seu roteiro e a profunda compreensão do personagem. Os realizadores conseguiram resgatar os elementos que fizeram o Homem Aranha tão adorado, ao mesmo tempo em que o renovam para as próximas gerações. O fato de que os ideais do personagem estabelecidos por Stan Lee há tanto tempo ainda funcionem a sua maneira nos dias de hoje, reforça o poder do personagem junto ao grande público.
O conceito de que o herói não é a máscara, nem a roupa, mas sim quem as veste e este, pode ser qualquer um, não é um conceito realmente inovador, mas quando bem executado, aflora o melhor das pessoas e esse talvez seja o maior legado que os quadrinhos podem deixar.
Eu não sei se Stan Lee conseguiu assistir ao filme antes de falecer (o longa estreou depois de sua partida), mas tenho certeza, ele ficaria orgulhoso, que tantos anos depois, sua criação mais famosa ainda toque as pessoas pelo mundo.

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