Aprovação automática na rede municipal gera polêmica
Dora Paula Paes - Atualizado em 22/10/2022 09:24
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A criticada aprovação automática está de volta a rede municipal de ensino de Campos. Por meio de Resolução, o Conselho Municipal de Educação (CME) aprovou, em colegiado, o Plano Municipal de Recomposição e Recuperação de Aprendizagens para o biênio 2022-2023. As justificativas são combater a cultura do fracasso escolar, garantir a não evasão e distorção idade-série intensificadas no período pandêmico. Antes de ser eleito, o prefeito Wladimir Garotinho se colocava contra. Para o Sindicato Estadual dos Profissionais da Educação (Sepe) Campos houve fracasso na política educacional que permitiu o plano. Contudo, não falta politização. A questão chegou à Câmara e levou a um novo embate: oposição diz que decisão do CME tirou o peso das constas da pasta da Educação, que não conseguiu reverter “nota vermelha” no último Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb).

Segundo a Prefeitura, a proposta da aprovação automática é desenvolver mecanismos para a recuperação e recomposição das aprendizagens comprometidas em função da pandemia por Covid 19, com base nas metas previstas no Programa de Aprendizagem Eficiente (PAE) – que contém os projetos e metas que norteiam as ações da Secretaria Municipal de Educação, Ciência e Tecnologia (Seduct), implantado no ano passado.

Fazendo referência ao documento, o secretário de Educação, Ciência e Tecnologia (Seduct), Marcelo Feres, afirma: “Não se trata de fomentar um modelo de aprovação automática e sim planejar um tempo de recuperação para o processo pedagógico da rede municipal se consolidar e preparar os alunos para aprenderem mais e melhor sem o peso da reprovação para aqueles alunos que por terem sido privados do ensino regular presencial por dois anos e excluídos dos benefícios de uma educação não presencial oferecida por meio digital dada a sua condição social, de moradia ou de capacidade técnica de acesso a telefonia ou internet. Afinal, a prática da reprovação nesse momento só servirá para excluir ainda mais os alunos que já são os mais prejudicados pelos dois anos do ensino não presencial”.

De acordo com a diretora pedagógica da Seduct, Tânia Alberto, o Plano aconselha que, nestes dois anos, todos os alunos de Ensino Fundamental e da Educação de Jovens e Adultos (EJA) possam ter suas reprovações suspensas temporariamente e estratégias de recuperação sejam adotadas para ampliar as aprendizagens, evitando assim o atraso escolar advindo da distorção idade/série e a evasão escolar.

Pelo plano, o professor vai permanecer com os registros sobre os alunos e suas respectivas avaliações de desempenho. No entanto, todos os alunos retidos por média serão reclassificados pelo Conselho Escolar de Promoção, para Aprovado pelo Conselho de Promoção, ficando apto para a matrícula no ano escolar seguinte (2023 e 2024) no ano de escolaridade subsequente, independentemente de ter sido Aprovado ou Retido pelo professor.

No ano escolar subsequente (2023 e 2024), a matrícula dos alunos aprovados pelo conselho (AC), em 2022 e 2023, terá essa denominação no processo de enturmação dos alunos para que a Seduct e os professores de todas as turmas - exceto 1º ano do Ensino Fundamental e 1ª fase de EJA - possam identificar os alunos que necessitam de apoio educacional complementar com estratégias de reforço escolar.
 
Sepe aponta falha na política educacional
O Sepe-Campos não entende a volta da aprovação automática como a primeira forma de garantir o direito a um ensino/aprendizagem de qualidade. Para o sindicato, há constatação de que houve grande falha na aplicação das políticas educacionais que permitiu a aprovação do plano pelo Conselho Municipal de Educação.
“Tanto o Sindicato, quanto os professores da rede municipal, percebem a medida tomada como uma consequência da não aplicação correta da verba da educação na elaboração de medidas que garantissem a aprendizagem durante as aulas remotas e também no período em que foram retomadas as aulas no formato presencial”, informa em nota
O baixo desempenho do alunado, que levou o município a tomar a medida, fez o Sepe a pontuar onde ocorreram erros: “houve grande atraso na confecção de material didático impresso para dar assistência aos alunos sem acesso à Internet, não houve política pública voltada para garantir aos alunos acesso às aulas remotas, assim como diversos atrasos nas entregas dos kits alimentares para alunos em situação de vulnerabilidade socioeconômica, o que impacta diretamente na aprendizagem. A reforma das unidades escolares só iniciou no final do ano passado e até hoje gera grandes transtornos aos profissionais e alunos da rede que tiveram que ser realocados ou conviver com obras durante o decorrer das aulas e assim tendo seu processo de aprendizagem amplamente prejudicado.”

Por outro lado, o Sepe-Campos concorda que as crianças não podem ser penalizadas por problemas que a prefeitura enfrentou para trazer as políticas públicas para a prática. “Porém, a medida tomada de aprovação automática gera para os alunos e para os profissionais problemas que se acumulam. Serão criadas turmas multiseriadas, com crianças de diversos níveis de aprendizagem para profissionais que estão sofrendo com defasagem salarial, sobrecarga emocional, sem plano de saúde, falta de estrutura e de atualização do plano de cargos e carreira”, ressaltou na nota.
 
Questão politizada na campanha e Câmara
Ser favorável ou contra a aprovação automática não é um assunto recente. Em 2020, durante a campanha, o prefeito Wladimir Garotinho, se colocava contra, mesmo em período de pandemia da Covid-19. Recentemente, no Legislativo a questão também teve espaço no debate entre os vereadores.
Na campanha, em um encontro com diretores escolares, a mídia local chegou a postar a posição do prefeito sobre o assunto: “Precisa acabar com a aprovação automática, descentralizar os recursos, dando autonomia às escolas, além de estabelecer eleições diretas para diretores. A partir daí começar a ter outro ciclo de gestão na área da educação”, disse à época. Na ocasião, a posição marcou sua posição crítica contra ao resultado do Índice de Desenvolvimento da Educação (Ideb), quando Campos ficou sem pontuação.
A volta da aprovação automática também causou nova polêmica. Na sessão do último dia 18, na Câmara, os vereadores de oposição criticaram a postura da secretaria de Educação, enquanto os governistas justificaram que a resolução foi aprovada pelo Conselho Municipal de Educação.
“Essa resolução foi debatida pelo Conselho e o secretário Marcelo Feres apenas referendou o que foi aprovado. A Câmara tem um representante, mas esse assunto não veio para cá. Qual foi o voto dele? Não estou culpando o Conselho, foi deliberado e depois assinado pelo secretário. São oito representantes da sociedade civil e cinco do Executivo. Parabéns ao secretário por levar ao Conselho antes”, disse o vereador Juninho Virgílio (União), na defesa do governo.
No entanto, a justificativa de Juninho não foi bem vista pelos oposicionistas. Helinho Nahim (Agir) afirmou que a responsabilidade é do prefeito. “A responsabilidade é do prefeito, sim. Quando é bom, fala que é dele, quando é ruim, culpa o secretário. A aprovação automática é um retrocesso enorme, deixa o aluno sem motivação, o professor fica sem motivação. É muito bonito ficar postando em rede social, autorizar esse absurdo por uma canetada é vergonhoso”.
 
Nota do Ideb de 2021 gerou expectativa
Depois de ficar sem nota, no então governo Rafael Diniz, a expectativa era do primeiro ano do governo Wladimir Garotinho. Mas, ninguém tinha dúvida de que a pandemia da Covid-19 impactaria na educação. A divulgação do Ideb em setembro, mostrou que Campos não alcançou a meta projetada em 2021, apesar de avanços em alguns segmentos.
O município de Campos voltou a ter nota no Ideb. Em 2021, no primeiro segmento do Ensino Fundamental (1º ao 5º ano) a nota da rede municipal foi de 4,7. Apesar da alta em relação a 2017, quando alcançou 4,6, foi o pior índice entre os municípios do Norte Fluminense (NF) — e 85º no estadual. Já no segundo segmento (6º ao 9º ano), a média do maior município do interior é de 4, a 7ª do NF.
Em matéria sobre o Ideb, no site da Prefeitura, a informação é que o “resultado mostra que Campos está na direção certa na busca pela melhoria da qualidade do ensino, mesmo com uma rede considerável, composta por cerca de 55 mil alunos e 234 unidades escolares”.
País — O Ideb é o principal indicador de qualidade das escolas do Brasil. O indicador considera os resultados do Sistema de Avaliação da Educação Básica (Saeb) e o fluxo escolar, a aprovação ou reprovação e o abandono escolar. O Ideb segue uma escala de 0 a 10. O país fixou metas para serem cumpridas a cada etapa de ensino até este ano, o ano do bicentenário da Independência do Brasil. O Ideb 2021 é, portanto, o último com metas fixadas.

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