Tração animal segue sem lei em Campos
Dora Paula Paes 04/12/2021 09:39 - Atualizado em 04/12/2021 10:50
Apesar da proibição, aparentemente número de carroças aumenta em Campos
Apesar da proibição, aparentemente número de carroças aumenta em Campos / Genilson Pessanha
São cinco anos da lei estadual nº 7.194/2016, que proíbe a utilização de animais para fretamento e transportes de cargas ou pessoas, nas áreas urbanas e rurais no território. No recorte do tempo, qual é a real? Campos teve de "levante" de carroceiros parando a BR 101, a crescente número de animais resgatados por maus tratos e aumento de animais na tração com a crise social agravada pela Covid. Protetores dizem em coro: falta gestão para um basta. No final, quem paga a conta em duas vezes é a população: corre risco de vida no trânsito e arca as custas judiciais com impostos quando o crime de maus tratos chega ao tribunal. Aos animais restam resgate e, na última instância, a eutanásia.
Paula Di Filippo, professora responsável pelo setor de Grande Porte do Hospital Veterinário da Universidade Estadual do Norte Fluminense (Uenf), coordena o “Projeto Carroceiro”, há 11 anos. Sem ajuda governamental, o trabalho é realizado com recursos do curso de Extensão. A demanda, segundo ela, cresceu. “O que se espera é respeito e dignidade para o animal. Em Campos, não existe isso”, afirma e acrescenta:
Animais vítimas de maus tratos são atendidos na Uenf
Animais vítimas de maus tratos são atendidos na Uenf / Divulgação
— Nenhuma lei de proteção aos animais vigora em Campos. Recebemos animais de carroças visivelmente vítimas de maus tratos. Mas, recebemos alguns que possuem um trato melhor. No entanto, a maioria não está numa situação adequada. Tem semanas que atendemos até quatro animais, mas esse número é cíclico. Os chamados de socorro aumentaram na pandemia e, infelizmente, pela gravidade das fraturas é grande o número de eutanásia.
A profissional explica sobre o uso consciente. “Os animais são aptos a fazerem alguns esportes ou atividades. Tracionar carroça não seria ruim se não fosse de maneira inadequada ou exploratória. Alguns carroceiros quando abordados hostilizam quem toma partido dos animais. Entendemos que essa atividade vai continuar: é a única fonte de renda de algumas famílias. Entretanto, é preciso seguir leis. A lei é com a polícia e a justiça. Nosso papel é tratar e orientar. Já os animais vítimas de maus tratos, eu espero que o proprietário nunca mais tenha o direito de reavê-los”, disse. 
Encontrar um carroceiro pelas ruas de Campos, até na área central é fácil, difícil é abordar a questão. “Preciso trabalhar”, “você vai levar comida para minha casa?”, “meu animal é mais bem tratado do que eu” são algumas respostas.
Já o governo municipal questionado, principalmente sobre fiscalização, informa que na atual gestão, foram resgatados dois equinos após a Polícia Militar flagrar o condutor da carroça agredindo os animais. O crime aconteceu em novembro, em Martins Lage e o Centro de Controle de Zoonoses (CCZ) foi acionado. Bastante debilitados, foram encaminhados para o Hospital Veterinário da Uenf. “Com quem o poder público mantém um Termo de Cooperação”, reforçou.
O Instituto Municipal de Trânsito e Transporte (IMTT), por vez, acrescenta que foi criado um grupo de trabalho dentro da Comissão de Transportes para avaliar as ações para tratar da questão dos carroceiros. “Entre os temas levantados estão a necessidade de uma avaliação pela Secretaria de Desenvolvimento Humano e Social, em relação ao quantitativo de carroceiros, para que se busquem alternativas sociais para destinação dos mesmos, e a definição, mediante portaria, das vias públicas que seriam objeto de coibição”, ressalta.
Pela Constituição Federal, maus tratos aos animais é crime. O Estado do Rio tem uma lei própria e ainda existe a lei federal nº 9.605/1998.
ONG Brasil sem tração: “População precisa cobrar soluções”
Lei que proíbe veículos de tração animal é de 2016
Lei que proíbe veículos de tração animal é de 2016 / Genilson Pessanha
Os protetores dos animais em Campos falam em luta difícil, mas que estão atentos. Chamam a população para exercer seu papel de denunciante. A presidente da ONG Brasil sem Tração Animal, Fernanda Braga, não alivia. Mesmo de Belo Horizonte, onde a ONG tem sede, diz que conhece a realidade de Campos através da rede de protetores. Segundo ela, o caos com carroças não é só em Campos, mas se tem lei é preciso acabar com o problema.
“É preciso ações sociais e que o trabalhador possa ter uma nova ocupação, ser inserido no mercado de trabalho. Como não vai acontecer agora, a Prefeitura precisa fiscalizar. A fiscalização de maus tratos não depende só da polícia, depende de agentes das prefeituras, numa pasta de proteção aos animais”, disse ela.
Como a maioria das ações recaem para o CCZ, Fernanda é firme ao dizer: “Na verdade, na maioria das prefeituras falta política para que a situação seja tratada no âmbito administrativo e não chegue à justiça. A população não precisaria gastar seu dinheiro para salvar animais que tiveram seus direitos violados. A população precisa se revoltar com a falta dessa estrutura que acaba levando a acidentes graves e comoções públicas quando o animal é vítima de maus tratos”.
Denúncias - O município segue afirmando que para garantir o cumprimento da legislação no que tange ao acolhimento e abrigamento de animais vítimas de maus tratos, o Centro de Controle de Zoonoses vem participando de reuniões, juntamente com a Polícia Militar e protetores de animais. “Qualquer cidadão pode, quando constatado maus tratos aos animais, comunicar à Polícia Militar para que seja recolhido o animal para órgãos de proteção e controle. No caso de animais soltos em via pública, a pessoa pode ligar para o telefone (22) 98126-5234”.
Em 2016 - Quando a lei entrou em vigor, em janeiro de 2016, houve mobilização em Campos. Dezenas de carroceiros fizeram manifestações. O grupo chegou a bloquear o tráfego na BR-101. Na época que a lei foi sancionada, o autor, o então deputado Dionísio Lins, afirmou que os municípios seriam responsáveis por oferecer alternativas aos profissionais.
 
 

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