Eleição para presidente da Câmara de Campos com um pé na Justiça
Aldir Sales 19/02/2022 03:34 - Atualizado em 19/02/2022 03:35
Genilson Pessanha
A novela sobre a decisão de quem será o presidente da Câmara de Campos no biênio 2023/2024 começou nesta semana e parece longe de uma solução dentro da própria Casa de Leis. Juristas ouvidos pela Folha da Manhã confirmam a tendência de judicialização da política goitacá, com desdobramentos que prometem se arrastar por bastante tempo.
Atual presidente do Legislativo Fábio Ribeiro (PSD) pautou de última hora a eleição da próxima mesa diretora para a primeira sessão ordinária do ano, na última terça-feira (15). Mas só fez isso porque a base governista achava que teria garantidos os 13 votos necessários para a reeleição de Fábio. Só que acabaram surpreendidos pelo vereador Maicon Cruz (PSC), que chegou a garantir por escrito o voto em Ribeiro, mas na hora do pleito fechou com Marquinho Bacellar (SD) e assegurou a maioria para o líder da oposição.
Fábio chegou a proclamar o resultado, mas suspendeu a sessão depois de uma confusão generalizada envolvendo Maicon e o primeiro vice-presidente, Juninho Virgílio (Pros), que ocupava a secretaria municipal de Governo e pediu exoneração no meio da tarde de terça.
No dia seguinte, quando seriam escolhidos os demais integrantes da mesa diretora, o presidente anunciou a suspensão da eleição até a análise de dois processos administrativos protocolados por vereadores governistas que pedem anulação do resultado. Os parlamentares da oposição chegaram a registrar uma queixa-crime na 134ª Delegacia do Centro por abuso de autoridade contra Fábio Ribeiro.
Em um dos processos, Juninho Virgílio diz que pretendia se candidatar, mas a Câmara não publicou em Diário Oficial o aviso da eleição e, assim, ele teria sido prejudicado. No outro, vereadores governistas apontam que Nildo Cardoso (PSL) – integrante da oposição – não foi chamado para votar, o que também fere o regimento interno.
O advogado e ex-assessor do Supremo Tribunal Federal (STF) Carlos Alexandre de Azevedo concorda com a decisão de Fábio de suspender a sessão até a análise dos recursos, mas é crítico aos argumentos dos governistas que tentam anular o pleito.
— Sobre a impugnação quanto à publicidade, o argumento chega a ser risível, sem qualquer credibilidade. Até as pedras sabiam dessa eleição, o que dizer de um vereador. Salvo se o vereador estivesse passando férias na Lua, sem sinal de celular, é cômico ele aduzir falta de publicidade. Com relação ao argumento de um vereador ter deixado de votar, aí é uma questão de prova. O fato de o presidente ter encerrado a sessão, proclamando o resultado computando o voto supostamente faltante, possui duas consequências muito importantes: é ônus do vereador impugnante provar, de forma inequívoca, que faltou um voto; e, se restar alguma dúvida, deve prevalecer o resultado proclamado.
Na hipótese do recurso sobre o voto de Nildo ser acolhido, Carlos Alexandre relata que não seria o caso de anulação da eleição inteira. “Não penso ser a hipótese de anular toda a sessão, mas sim considerá-la não encerrada, abrindo a possibilidade de tomada apenas do voto supostamente faltante, por analogia ao artigo 174 do Regimento Interno da Casa”.
Para o jurista, a judicialização do caso será inevitável. “Por fim, caberá judicializar a matéria, sem dúvida, principalmente por parte da oposição caso haja uma espécie de ‘virada de mesa’. O caso é tormentoso e deve ter a sua rodada final no Judiciário. Não vejo a questão como apenas interna corporis, com possibilidade sim de intervenção judicial”.
Por outro lado, para o procurador-geral do município, Roberto Landes, Juninho Virgílio foi prejudicado pela falta de publicidade. “Me parece que tem fundamento o que ele fala. Com base no princípio da publicidade, foi argumentando que o fato da eleição ter sido pautada sem um aviso prévio impediu que ele participasse como candidato, uma vez que ele estava licenciado. Ele precisava de um tempo hábil para poder ser exonerado, fazer a campanha”.
Para o procurador, no entanto, o recurso que contesta a ausência do voto de Nildo Cardoso possui argumentos ainda mais robustos para a anulação do pleito. “Esse me parece ser o argumento mais forte, uma vez que o regimento interno traça as formalidades necessárias para o ato de votação. E aí, quando ele deixa de ser chamado, aquela formalidade exigida deixa de ser observada. Se é uma questão regimental, que traça um caminho, e esse procedimento não é respeitado, me parece que fere o regimento. Trata-se de um vício de forma e impacta na nulidade daquele ato”.
Mas Landes concorda com Carlos Alexandre sobre a possibilidade de judicialização da questão, independente do resultado da análise dos recursos. “Certamente isso vai ser apreciado pela Câmara e é grande a possibilidade daquela parte que se sentir prejudicada buscar o Judiciário para poder fazer valer as suas ações”.
Advogado dos 13 vereadores da oposição, Flávio Gomes disse que não teve acesso ao teor dos recuros e por isso não poderia comentar sobre eles, mas contestou duramente a condução de Fábio Ribeiro.
— Ele impediu a entrada do público na sessão, ele vedou totalmente qualquer tipo de requerimento feito pelos vereadores. É também esdrúxulo isso, juridicamente falando, e fere de morte o regimento interno. Por qualquer ângulo, você não encontra nenhum respaldo tanto no regimento quanto na lei. O que ele deveria fazer era dar continuidade à eleição no dia seguinte. Os vereadores não tiveram sequer acesso à ata da sessão do dia 15. Tudo isso demostra uma série de coisas, de irregularidade de quem perdeu na votação.
Flávio declarou que ainda não há uma posição sobre a judicialização, mas alertou que os vereadores de oposição estão dispostos a travar a pauta até uma resolução. “Não temos ainda uma posição sobre judicialização, mas enquanto não for introduzida uma data posterior das eleições, em tese, não vai ter outro tipo de debate”.
Eleição teve virada da oposição há 29 anos
O resultado inicial que elegeu Marquinho Bacellar é considerada a maior virada da política goitacá desde 1993, quando o então vereador de oposição Paulo Feijó foi escolhido para presidência da Câmara, como lembrou a coluna Ponto Final na edição da última quarta-feira.
Na ocasião, o prefeito era Sérgio Mendes, que teve o apoio de Anthony Garotinho – pai do atual prefeito Wladimir Garotinho – para chegar ao cargo.
Na ocasião, Feijó disputava com Paulo Albernaz o comando da Casa de Leis e, diferente de hoje, o voto era secreto. O resultado foi de 11 votos a 10, surpreendendo os governistas.
Por quase 30 anos o nome do vereador que mudou de lado e decidiu aquela eleição permaneceu em segredo, até ser revelado que era Toninho Viana.
Desta vez, o personagem central foi Maicon Cruz. Ele havia assinado seu compromisso pela reeleição de Fábio Ribeiro, mas mudou de posição na hora da votação em um movimento em conjunto com a oposição.
No último mês, ainda durante o recesso parlamentar, Maicon, Juninho e seu primo Thiago Virgílio se envolveram em uma polêmica. Na ocasião, Thiago criticou nas redes sociais a postura de Maicon de se intitular independente, mesmo com cargos indicados no governo e teve aval de Juninho, então titular da secretaria municipal de Governo.
“Independente de c* é r***! Que independente você é? Recebeu ‘apoio’ do nosso grupo na sua campanha. Agora cospe no prato que comeu. Seus ‘amiguinhos’ tudo (sic) empregados no governo municipal e você quer dizer que é independente?”.
Na sequência, Maicon pediu para ter DAS ligados a ele exonerados do governo e Wladimir atendeu.

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