Crítica de Cinema - O primeiro Brexit
Edgar Vianna de Andrade - Atualizado em 31/07/2017 18:42
Dunkirk
Dunkirk / Divulgação
Existe uma vantagem para roteiristas de filmes históricos: o roteiro extradiscursivo ajuda. Ou seja, a própria disciplina da história ajuda o roteirista do filme. Christopher Nolan é roteirista, diretor e produtor de “Dunkirk”, local do norte da França onde ocorreu uma evacuação dramática das forças aliadas em luta contra a Alemanha em 1940, logo no início da Segunda Guerra Mundial.
Nolan contou com este pré-roteiro, como qualquer outro roteirista, diretor e escritor de temas históricos. Mas a narrativa histórica nem sempre parece atraente para artistas, leitores e espectadores. É preciso contar de forma agradável ou introduzir algumas mudanças que não comprometam profundamente o conhecimento produzido pela disciplina da história. Os historiadores são bem chatos, com raras exceções. Emmanuel Le Roy Ladurie, por exemplo, escreveu “Montaillou”, que se transformou num best seller, sem comprometer o rigor do historiador. Mas, para vender em história, é preciso romancear. Não sem razão, jornalistas investigativos têm obtido mais sucesso que historiadores.
Ernst Lubitsch não teve o mínimo rigor científico em seu “Madame DuBarry”, de 1919. Nolan também suavizou a batalha de Dunquerque, mais uma retirada que uma batalha ofensiva. A Operação Dínamo consistia em evacuar as tropas aliadas, sobretudo as tropas inglesas, de uma ponta de lança do norte da França, defronte o canal da Mancha. A batalha foi bem mais dramática que a mostrada por Nolan. A guerra aérea envolveu muito mais aviões de ambas as partes do que os mostrados no filme. Creio que Mel Gibson, com sua mão pesada, chegaria mais perto da sanguinolência da batalha.
Mas Nolan tem suas qualidades. Voltou a filmar com película. Colocou a batalha dentro das salas de cinema com seus ruídos ensurdecedores. Colocou câmaras nos capacetes de aviadores. Mostrou que a guerra acaba transformando em inimigos não apenas os inimigos oficiais, mas também aqueles que lutam ao nosso lado. Embora procure transformar a própria batalha em personagem, ele não dispensa o recurso a personagens humanos principais, como o soldado Tommy (Fionn Whitehead) e o almirante Bolton (na pele do sempre excelente Kenneth Branagh). Nem mesmo os cineastas soviéticos dispensaram este artifício para ajudar o espectador a se situar e a se identificar. E por mais que os heróis sejam colocados em segundo plano, Nolan não consegue descartá-lo. Lá estão o almirante Bolton e o piloto de um avião inglês a disponibilizar a vida pelo próximo e pela pátria.
Na minha avaliação, contudo, “Dunkirk” não é tão excepcional, como a crítica especializada vem considerando. Mas, a rigor, todo filme tem vínculos com seu tempo. A evacuação de Dunquerque tem alguma relação com o “Brexit”? Ele insinua que a Grã-Bretanha saiu apenas de uma batalha ou da guerra? Que agiu bem ou mal? Que voltará ao campo de batalha mais tarde, com voltou na batalha da Normandia? Enfim, em vez de Nolan, entrará em cena, mais tarde, Steven Spielberg, com seu “O resgate do soldado Ryan”?

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