Bolsonaro e sua Política Nacional de Segurança Pública
- Atualizado em 07/10/2021 00:44
No dia 29 de setembro de 2021 foi editado e publicado o decreto nº10.822 que instituiu a revisão da Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social 2021-2030. Esse decreto trata de questões abordadas por duas normas publicadas no ano de 2018, a lei nº 13.675, que criou a Política Nacional de Segurança Pública e Defesa Social (PNSPDS) e instituiu o Sistema Único de Segurança Pública (SUSP), e o decreto nº9.489, que regulamentou os procedimentos para a implementação da PNSPDS.
Como tem ocorrido desde o início do governo do presidente Jair Bolsonaro, as mudanças legislativas propostas pelo executivo com relação à área da segurança pública têm causado apreensão e muitas críticas de pesquisadores, especialistas e de profissionais da área, e, no caso do decreto, não foi diferente. Ao invés de fortalecer políticas públicas que tenham como objetivo a prevenção, o respeito aos direitos humanos, a melhoria da governança nas instituições policiais e um incentivo a uma maior participação dos municípios nessa área, o governo foi justamente na direção contrária.
Uma das primeiras mudanças trazidas pelo recente decreto tem relação com mecanismos de governança previstos na lei do SUSP. O SINAPED (Sistema Nacional de Acompanhamento e Avaliação das Políticas de Segurança Pública e Defesa Social), é um desses que ficou de fora do novo decreto e isso é péssimo, pois enfraquece a atuação dos estados e municípios, com o governo federal se colocando como o protagonista com relação à política de segurança pública do país.
Dessa forma, o ministério da justiça passa a ter um papel central na deliberação sobre as políticas de segurança, mas não como um coordenador, exercendo um papel de liderança nas ações promovidas por estados e municípios e sim como controlador. O governo federal passa assim a ter um o controle operacional sobre a segurança pública no país, o que é inviável em um país com a dimensão do Brasil e tamanhas diferenças regionais. Uma proposta que tem a ver mais com centralização de poder do que com efetividade de ações.
Outra preocupação surgida com o novo decreto diz respeito aos dados relacionados às mortes decorrentes de intervenções policiais (MDIP). Conforme previsto na norma, as MDIP serão somadas à categoria geral de homicídios, o que irá impossibilitar o acompanhamento da letalidade policial. Em um país como o Brasil, que tem uma das maiores, senão a maior, taxas de MDIP no mundo, a ausência desses dados traz um apagão de informações que pode servir de incentivo ao aumento da letalidade policial, que já vem crescendo conforme mostra o anuário de 2021 do Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Segundo dados recolhidos pela ong, entre 2019 e 2020 o aumento foi expressivo em alguns estados, como Mato Grosso (76%), Pernambuco (56,6%), Rio Grande do Sul (48,9%) e Tocantins (48,4%).
Temas como reformas nas carreiras, ciclo completo e valorização profissional também não constam na norma e conceitos como polícia de proximidade e policiamento comunitário deixaram de ser um dos focos em termos de políticas públicas, muito em razão dessa centralidade do governo federal na construção das políticas.
Ao examinar as mudanças introduzidas pelo decreto fica claro que o governo Bolsonaro não tem real interesse em implementar uma Política Nacional de Segurança Pública que tenha como objetivo encarar os desafios que a sociedade enfrenta. Persiste a política de armamento da população, não prevê reformas nas instituições policiais, não busca a valorização dos profissionais da segurança, deixa de lado políticas que comprovadamente funcionam como policiamento comunitário e insiste no apoio à letalidade como se segurança pública se resolvesse somente através de confrontos armados. Ao apostar no que comprovadamente não funciona e na centralização de decisões, indo inclusive contra o que prevê a lei que criou o SUSP, o governo Bolsonaro deixa claro que para ele, segurança pública se resume a “tiro, porrada e bomba”.

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    Roberto Uchôa

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