A demagogia por trás do programa Habite Seguro
- Atualizado em 27/09/2021 21:52
No último dia 13 o governo federal lançou com grande divulgação o programa Habite Seguro, destinado a oferecer subsídios para que profissionais da segurança pública adquiram casa própria. Uma medida que, em uma análise preliminar, parece ser excelente como forma de atenuar os problemas causados pela baixa remuneração da grande maioria desses profissionais, não se sustenta quando confrontada com números e estatísticas. Trata-se apenas de mais uma medida demagógica feita pelo governo para agradar uma importante base política do presidente.
O programa utilizará recursos do Fundo Nacional de Segurança Pública e terá como instituição financeira responsável pela sua execução a Caixa Econômica Federal. Uma linha de crédito especial foi criada para esse fim e os valores do subsídio podem chegar a R$ 2.100,00 para a tarifa de contratação e de até R$ 12.000,00 no valor de entrada, podendo ser adicionada ao subsídio concedido pelo programa Casa Verde e Amarela.
Estão aptos a receber tais subsídios os profissionais da segurança pública que ainda não possuem imóvel próprio, que tenham renda mensal de até R$ 7.000,00 e que desejem adquirir um imóvel com avaliação de até R$ 300.000,00. Podem participar policiais federais, policiais rodoviários federais, policiais civis, policiais penais e policiais militares, bombeiros, ativos e inativos, da reserva e reformados, bem como guardas municipais.
Não é uma novidade, já que existiram outras tentativas de implantação de programas parecidos, mas a maioria não prosperou por não terem sido apoiadas pelos governos. No programa Habite Seguro estão previstos incialmente R$ 100 milhões para financiar as aquisições, o que segundo cálculos permitiria a assinatura de cerca de 8.000 contratos.
Segundo dados do Anuário Brasileiro de Segurança Pública existiam no país em 2020 cerca de 760.000 profissionais ligados à segurança pública no Brasil, e isso sem incluir os guardas municipais, reformados e inativos. Na melhor das hipóteses, cerca de 1% dos profissionais teriam êxito em participar do programa, o que mostra o reduzido alcance do programa.
Medidas que tenham como objetivo atenuar os problemas salarias desses profissionais são sempre desejáveis, mas nunca podem servir para mascarar as enormes discrepâncias existentes entre as diversas instituições de segurança e entre os profissionais que fazem parte delas.
Segundo dados também do Anuário Brasileiro de Segurança Pública 45,3% dos profissionais recebiam menos de R$ 5.686,00 de salário bruto em 2020, sendo os praças das policiais militares aqueles que tinham as menores médias salariais. E o problema não se restringe aos baixos salários. O abismo entre as rendas dos policiais é muito grande.
Em países como EUA, Inglaterra e Canadá, a diferença entre os maiores e os menores salários pagos aos policiais é de cerca de 6 vezes, enquanto no Brasil, chega a 15 vezes, sendo que no estado do Rio de Janeiro essa diferença chega a ser de 35 vezes.
O programa Habite Seguro não atenuará esta situação. Trata-se de um pequeno paliativo para a falta de uma política nacional de salários dos policiais. Já é hora de discutirmos um piso salarial nacional para os policiais, como já existe na área de educação. Porém, isso, obviamente, não é fácil, pois implica uma pactuação entre União, Estados e Municípios. Exige, portanto, capacidade de formulação, negociação e muita vontade política.
Na falta dessas habilidades, é mais fácil – e lucrativo – anunciar medidas demagógicas que não resolvem os problemas reais dos policiais brasileiros.

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    Roberto Uchôa

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