Arthur Soffiati - 3/4 de século: as fases de uma vida (III)
* Arthur Soffiati 23/02/2022 14:02 - Atualizado em 23/02/2022 14:49
Na minha vida, a década de 1970 foi uma fase de definições. Concluí a graduação de história na Faculdade de Filosofia de Campos (Fafic); comecei a trabalhar como professor antes de concluir o curso superior; casei-me aos 28 anos; tive dois filhos na década; ajudei a fundar o Centro Norte Fluminense para a Conservação da Natureza; comecei a escrever no jornal “A Notícia” em 1975 e no jornal “Folha da Manhã” em 1978; um artigo meu sobre a pipa carioca foi publicado na “Revista Brasileira de Folclore” em 1975, e um opúsculo sobre bolinha de gude, aqui conhecida como baleba, foi lançado em 1977. Ambos os escritos resultaram dos estudos e coletas que empreendi na década de 1960. Mais tarde, os escritos foram todos eles reunidos no livro “No tempo do folclore”.
Do ponto de vista intelectual e político, destaco três pontos: minha carreira de professor, minha atividade de colaborador na imprensa campista e meu ativismo como ecologista. Enfrentei algumas dificuldades políticas. O deputado Alair Ferreira me convidou a ingressar na Arena, e o deputado Walter Silva me convidou a ingressar no MDB. Agradeci a ambos e permaneci independente. Fui também cercado por movimentos não reconhecidos pelo governo. Foi ficando claro para mim que eu não tinha vocação partidária. Enquanto os partidos censuravam minha independência, convidavam-me a falar em eventos exatamente para valerem-se da minha independência. Foi assim quando Miro Teixeira, candidato a governador do estado do Rio de Janeiro, veio a Campos em campanha, em 1982.
Aos poucos, foi ficando claro para mim que eu era um social-democrata que incluía a questão ambiental em sua agenda. Repudiei os regimes autoritários de direita e de esquerda. Publiquei na “Folha da Manhã”, ainda em plena ditadura militar, alguns artigos criticando os generais no governo e a censura. Mas escrevi muito sobre a postura autoritária do Departamento Nacional de Obras e Saneamento (DNOS) no trabalho de drenagem da região. Em 1980, eu já havia trabalhado no cursinho pré-vestibular da Faculdade de Filosofia de Campos e no colégio Nossa Senhora Auxiliadora (Censa). Eu estava em plena atividade como professor no curso de história da Faculdade de Filosofia de Campos, no Liceu de Humanidades de Campos e no curso pré-vestibular Savart. Eram bons tempos para trabalhar. Recusei alguns convites por desejar também estudar e escrever.
No final dos anos de 1970, cursei pós-graduação lato sensu na Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) com vários colegas de Campos. Passei mais uma vez pelo colégio Nossa Senhora Auxiliadora e fiz uma experiência de um ano na Universidade Cândido Mendes. No início de 1988, graças ao convite da querida amiga Conceição Muniz, ingressei no curso de Serviço Social da Universidade Federal Fluminense (UFF).
Os marcos políticos na minha vida foram a greve de professores do estado em 1979 e a participação nos movimentos em favor da anistia e das Diretas Já. Foi grande também minha atuação em defesa do meio ambiente. Fui processado por quatro prefeitos, uma juíza, um procurador do Estado e pela Cedae, sempre inocentado. Ao mesmo tempo em que eu começava no curso de Serviço Social da UFF, recebi convite do curso de pós-graduação em Planejamento Ambiental da mesma universidade, em Niterói. Aceitei o convite e fiquei no curso até 1992, quando, com 45 anos, ingressei no mestrado de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Decidi desenvolver meu projeto em história ambiental, embora o curso fosse de história social. Encontrei dificuldades. Como eu já era velho para cursos de pós-graduação stricto sensu, emendei doutorado no mestrado, também na mesma linha. A banca examinadora rejeitou meu projeto de início, mas acabou por aceitá-lo. Durante 10 anos, dediquei-me à pós-graduação. Comecei com 45 anos e terminei com 54.
Desde os 17 anos, eu era uma pessoa dividida. Primeiramente, eu queria ser cientista, literato e músico. No final da década de 1960, eu oscilava entre biologia e história. Não cursei biologia por conta do meu pânico com sangue. Fiz história e me encontrei neste campo do conhecimento. Mas reconheço que não fui um bom professor. Quando a gente exerce o magistério, não conta com muito tempo para reflexão. As instituições em que trabalhei estabeleciam as ementas a serem cumpridas. Os livros deveriam ser seguidos e até os alunos forçavam o professor a ministrar certos conteúdos para a prova de vestibular. Eu era ainda dividido por desejar ler, estudar e escrever tendo de trabalhar. A vida de magistério pode ser boa, mas exige muito tempo do professor. Finalmente, aposentei-me no início de 2011, depois de 40 anos em sala-de-aula. Começa, então, a quarta fase da minha vida. A fase atual.
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