Dossiê revela criança como alvo
Virna Alencar 01/12/2018 18:35 - Atualizado em 03/12/2018 14:52
Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam)
Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam) / Antônio Leudo
A 4ª edição do Dossiê Criança e Adolescente, lançada neste mês de novembro, apontou que 47% das agressões físicas e ameaças foram cometidas por familiares e conhecidos das vítimas. O estudo reúne os principais crimes relacionados à violência contra o público infantojuvenil no Estado do Rio de Janeiro em 2017 e analisa a vitimização de crianças e adolescentes em suas diversas formas: física, sexual, moral, psicológica, patrimonial e periclitação da vida e da saúde. De acordo com o delegado adjunto da 134ª Delegacia de Polícia do Centro, Pedro Emílio Braga, a maioria dos casos ocorridos em Campos não são denunciados e ocorrem no seio familiar. No último dia 24, a realidade foi diferente. O relato de uma vítima ao Conselho Tutelar levou a prisão de um homem, em Donana, na Baixada Campista. Ele é acusado de abusar de duas filhas e três sobrinhas, além de outra criança, os crimes que ocorreriam desde 2015.
Informações do Dossiê revelaram que as formas de violência com maior participação de vítimas crianças e adolescentes são violência sexual (59%) e periclitação da vida e da saúde (49%). Boa parte dos crimes cometidos contra as crianças e adolescentes no ano passado foram praticados por familiares e conhecidos das vítimas. Eles foram os autores de 47% das agressões físicas e dos crimes de ameaça e constrangimento ilegal, de 40% dos crimes de violência sexual e 38% dos crimes de violência moral.
O delegado Pedro Emílio destacou que crimes dessa natureza são considerados pelo Código Penal Brasileiro como de Ação Penal Pública Incondicionada, ou seja, qualquer pessoa pode denunciar e, a partir de então, a polícia procederá à apuração dos fatos. Em caso de suspeita, orientou que a sociedade dirija-se imediatamente à delegacia, uma vez que a Polícia Civil é o órgão apto a apurar a ocorrência de infrações penais até que se chegue à responsabilização dos autores.
— É importante que a sociedade tenha a consciência de que a violência no seio familiar existe, não sendo algo tão raro como muitos pensam. Nós recebemos inúmeras denúncias mensalmente ligadas à violência sexual. Uma vez que tenham alguma notícia ou suspeita de que isso ocorre, mediante a relato dessas crianças e desses adolescentes – de que algo estranho tenha sido praticado, ou que elas tenham sido forçadas a praticar algo – que as pessoas procurem as autoridades para que possa ser dado um encaminhamento legal correto — orientou.
No dia a dia, ele disse observar que, pelo menos 70% das denúncias que chegam à delegacia acerca de fatos envolvendo violência sexual contra menores, ocorrem a partir de uma relação de parentesco, relação de convivência ou a partir de algum tipo de intimidade, por convívio, que essas pessoas têm com as vítimas. “O fato de muito dessa violência ser verificada no seio familiar, ou seja, sob o julgo do poder familiar, acaba que, por vezes, algumas mães prefiram se omitir por medo ou vergonha. Isso pode trazer graves prejuízos à formação emocional dessa criança e adolescentes. Portanto, é importante que essa notícia chegue ao conhecimento do Estado”, acrescentou.
A exemplo do que ocorre na capital, desde junho de 2014, Campos conta com uma Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (Deam), pronta para fazer o atendimento à mulheres vítimas de agressão, violência sexual, entre outros crimes, que por vezes acabam tendo como alvo jovens mulheres. Quando meninos se tornam vítimas, cabe a Policia Civil investigar, através da 134ª DP ou a 146ª DP, caso o fato tenha ocorrido na área de Guarus.
O comandante do 8º Batalhão de Polícia Militar (BPM), Fabiano dos Santos Souza disse que denúncias podem ser feitas através do disque-denúncia: (22) 2733-1177. Ele destacou como importante que essas denúncias possuam fundamentação, alguma testemunha, alguma pessoa maior de idade que possa colaborar e informar que realmente aquela prática ilícita esteja acontecendo. “Nós sabemos que são crimes altamente investigativos que cabe muito à Polícia Civil, mas a PM sempre está pronta a atender qualquer tipo de solicitação da sociedade”, disse.
Vítima denuncia e pedófilo é preso na Baixada
Um homem, de 47 anos, que não teve o nome divulgado pela polícia, foi preso na manhã do dia 24 de novembro, dentro de casa, na rua Clério Pinheiro, em Donana, na Baixada Campista, após a justiça expedir mandado de prisão contra ele por ter estuprado as duas filhas, três sobrinhas e outra menor de idade, que não tem nenhum parentesco.
De acordo com a polícia, o caso veio à tona após uma das vítimas denunciar o pedófilo ao Conselho Tutelar. Mensagens e áudio de celular serviram de provas contra ele. Os estupros eram praticados na própria casa do agressor. Segundo as investigações, a primeira vítima foi a filha, de 14 anos, em 2015. Ele acariciava as partes íntimas das meninas. Com a sobrinha, de 9 anos, ele chegou a exigir sexo oral. Com outra que não era da família, ele fez ameaças, dizendo que, caso ela contasse alguma coisa para alguém, a mataria junto com a mãe.
Ele foi levado para a Delegacia do Centro de Campos, de onde foi conduzido à Casa de Custódia.
Segundo Pedro Emílio, quando o fato crime chega ao conhecimento do Conselho Tutelar, num primeiro momento, o órgão municipal, responsável pela tutela coletiva da infância e juventude, também apresentará o fato à polícia, conduzindo os envolvidos até à delegacia, para que o caso seja elucidado da melhor forma. Já a Fundação Municipal da Infância e Juventude é mais um órgão municipal que visa a observância e garantia do direito dessa criança e adolescente.
Menores negros vulneráveis à letalidade
A 4ª edição do Dossiê Criança e Adolescente apresenta uma análise especial com um perfil das vítimas de letalidade violenta, o comportamento temporal dos homicídios e os seus delitos associados. Acompanhando a tendência nacional, o Estado do Rio de Janeiro também registrou um aumento de letalidade violenta contra crianças e adolescentes nos últimos anos. Nas mortes violentas, 90,5% dos adolescentes e 51,9% das crianças foram mortos por disparo de arma de fogo. A letalidade contra o grupo tende a se intensificar à medida que nos aproximamos de uma área sujeita ao controle ilegal do território.
Segundo o vice-presidente do Conselho Municipal de Promoção dos Direitos da Criança e do Adolescente (CMDCA), em Campos, Renato Gonçalves dos Santos, o Conselho, por meio do Fundo da Infância e do Adolescente (FIA), financia todos os anos, através de chamamento público, dezenas de projetos que trabalha na prevenção a situações de violência. Em 2018 foram financiados nove projetos com a aplicação de R$ 2,9 milhões para crianças e adolescentes da cidade, em áreas centrais e periferia, com incentivo a profissionalização, por exemplo, além de cobrar das autoridades políticas públicas que atenda a esses segmentos.
— O dossiê ratifica múltiplas violências sendo que a maior delas é letal e Campos não é diferente dessa realidade nacional. Esses adolescentes são moradores de periferia, de baixa escolaridade e na grande maioria negros. Portanto, a principal característica desses projetos financiados é a valorização pelo ambiente escolar. Sem dúvida, ela é garantidora de vida — disse.
Os dados organizados no Dossiê reforçam a necessidade de campanhas para informar a população de situações em que crianças e adolescentes tiveram seus direitos ameaçados ou violados, além de divulgar os canais disponíveis para o encaminhamento de denúncias que possam prevenir ou combater tais ameaças ou violações.
Em 2017, 225 crianças e adolescentes denunciaram o crime de importunação ofensiva ao pudor nas delegacias do estado e, outras 45, denunciaram ato obsceno.

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