Bolsonaro, o fascio imbrochável
Edmundo Siqueira 07/09/2022 20:41 - Atualizado em 07/09/2022 20:43
Bolsonaro, a primeira-dama Michelle, e Luciano Hang, empresário bolsonarista em ato político no 7 de setembro.
Bolsonaro, a primeira-dama Michelle, e Luciano Hang, empresário bolsonarista em ato político no 7 de setembro. / Reprodução


Há uma contradição aparente nos discursos de Bolsonaro, principalmente em manifestações públicas de massa, como o 7 de setembro. Se por um lado ele defende a “família, a moral e os bons costumes”, em ato contínuo aparece entoando um neologismo de referência sexual: “imbrochável, imbrochável, imbrochável!”.

Não foi a primeira vez que o presidente usa desse expediente. “Fique tranquilo. Já falei que sou imorrível, imbrochável e também sou incomível”, disse em 2021. “Não vou brochar para atender vocês”, respondeu à jornalistas quando perguntado sobre a reeleição, em outra ocasião.


Essa suposta dualidade de discursos reflete a hipocrisia de uma considerável parcela da sociedade brasileira. Não é incomum que líderes religiosos, políticos e outros “homens e mulheres de bem”, reproduzam discursos de rigidez moral e por vezes sejam flagrados em atos criminosos ou libidinosos.

A repressão sexual na sociedade brasileira — histórica, presente e cultural — contrasta com episódios de liberação total, como o carnaval. E também se encontra refletida na música popular (consumida por todas as classes sociais), no cinema (pornochanchadas, por exemplo) e na programação da TV (programas de auditório que usam o corpo feminino como atração).

A ideia embutida no “imbrochável” do 7 de setembro bolsonarista, é a possibilidade de um governo ou uma parcela da sociedade controlar sexualidades alheias. Fala diretamente para homens com masculinidade frágil, mas também passa uma mensagem que reeleger Bolsonaro irá reassegurar para as pessoas o controle daquilo que elas não conseguem controlar. Não apenas ditar regras de convivência, mas também para calar vozes divergentes, de outras orientações e gêneros.

Apesar de chula e grosseira, a mensagem consegue atrair ultraconservadores e homens de meia-idade que já se depararam com o “fantasma” da disfunção erétil. E o ar cômico trata de suavizar.

Mas, essencialmente, o exagero no uso de analogias e termos de cunho sexual e de autoafirmação, denota que Bolsonaro e os eleitores homens que se identificam com esse exagero, se sentem ameaçados, e assim respondem com o excesso. De mesmo modo acontece com o fascínio que as armas exercem em alguns homens, sendo símbolos fálicos, tratados em vasta bibliografia psicanalítica, inclusive em Freud.
Bolsonaro frequentemente faz gestos com as mãos simulando uma arma. Gesto é identificado no bolsonarismo.
Bolsonaro frequentemente faz gestos com as mãos simulando uma arma. Gesto é identificado no bolsonarismo. / Reprodução


Armas, analogias sexuais, a valorização da força física, o uso da “liberdade” como justificativa para agir repressivamente, demonstram a essência do modo de fazer política de Bolsonaro. Exercendo domínio completo falando para um público específico, que pouco se importará com problemas éticos ou mesmo econômicos que o líder por criar; onde defender o papel do “macho” será mais importante.
Ainda na psicanálise, um conceito fundamental denominado “Complexo de Édipo”, recorre à lenda grega em que Édipo fere e mata seu pai, Laio, com um bastão, símbolo fálico, para depois se casar com a própria mãe.

Líderes políticos que cultuam uma visão idealizada de masculinidade, com ingredientes como uma pseudo coragem, agressividade, homofobia, e a subordinação da mulher, não são uma novidade na história.

Benito Mussolini, duce do fascismo italiano, na então República Social da Itália, abusou de mensagens de força e de simbolismos para criar uma doutrina, e arrastar milhões de seguidores.


Os fascistas buscavam retomar o poderio do Império Romano. Tempos de glórias e força bruta, em que dominavam outros povos. Mussolini recorreu a símbolos que remetessem disciplina e obediência, e lemas como “crer, obedecer e combater”.
O líder fascista mudou a bandeira italiana, introduzindo uma águia segurando um fascio — feixe de varas envolvendo uma machadinha. Também um símbolo fálico.

Em história, as “coincidências” são estudadas como movimentos cíclicos. Assim como Bolsonaro, Mussolini também fazia “motociatas” para demonstrar poder, e também se apropriou de símbolos nacionais para impor sua ideologia reacionária.


Mas a história também ensina que regimes autoritários surgem quando há insatisfação popular massiva, crises agudas, ou descrença generalizada com as instituições públicas. E que eles têm um fim, com retomada gradual dos símbolos nacionais, diminuição do ódio social e da aceitação das diferenças e evoluções sociais.

Comemorando 200 anos de independência, neste 7 de setembro, a democracia brasileira é novamente testada e ódios são estimulados. É necessário construirmos uma nação onde não seja essencial discutir a sexualidade do presidente. Muito menos sua ereção.

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