"Filhotes de Boulos" e "amante de invasões": PSOL de Campos responde a Vereador
21/06/2021 15:24 - Atualizado em 21/06/2021 15:34
A recente ocupação do Conjunto Habitacional Novo Horizonte por cerca de 700 famílias é um tema sensível. A Constituição Federal prevê em seu artigo 23, inciso IX, que deve o Estado — União, Estados e Municípios — “promover programas de construção de moradias e a melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico”. A empresa responsável pela construção dos imóveis no Novo Horizonte, a Realiza Construtora, pediu reintegração de posse, pelo que chamou de “invasores não identificados”. Com o risco iminente de despejo das famílias, vários coletivos e movimentos sociais se mobilizaram, e o caso foi parar no Supremo, onde por decisão do ministro Edson Fachin, na noite do último dia 13, ficaram suspensa as decisões anteriores que determinavam que as cerca de 2 mil pessoas desocupassem o espaço.
Entre os movimentos sociais estavam os militantes do Psol Campos — partido que teve candidatura própria nas últimas eleições, com a professora Natália — que atuaram na defesa da permanência das famílias, promovendo diversos atos no local e através dos canais de comunicação do partido. O envolvimento do Psol na ocupação do Novo Horizonte foi visto como “palanque político” pelo vereador Anderson de Matos (Republicanos), que subiu a tribuna da Câmara no dia 04 de maio para criticar duramente o partido.
— Agora, próxima da realização desse árduo sonho da casa própria, dessas 772 famílias contempladas, os militantes do PSOL aparecem em nome de uma política rasa (...) são pessoas necessitadas usadas como massa de manobra — disse o vereador na Tribuna, e reproduzido em suas redes sociais (confira vídeo aqui).
Anderson de Matos disse os partidários de Campos seriam “filhotes de Guilherme Boulos” e “amantes de invasões de propriedades privadas”. Acusou ainda o partido de “jogar famílias necessitadas umas contras as outras” através de uma “narrativa bonitinha”, que não passaria de “palanque político”.
PSOL responde às críticas e 
O diretório do Psol Campos resolveu responder ao vereador, enviando o posicionamento do partido em relação às declarações na tribuna da Câmara, que é reproduzido aqui na íntegra:
"O Psol Campos vem a público se manifestar a respeito dos ataques proferidos pelo vereador Anderson de matos, do Republicanos, em sessão na câmara dos vereadores no dia 4 de maio. Dias após a ocupação do conjunto habitacional Novo Horizonte, que ocorreu de forma espontânea, ocasionada pelas sucessivas violações aos direitos do povo, os militantes de Psol manifestaram seu apoio aos ocupantes e vão continuar manifestando a despeito dos ataques sofridos. Nosso apoio à ocupação, junto a diversos partidos políticos, movimentos sociais, coletivos se dá em forma de assistência jurídica, alimentação (estabelecemos coletivamente uma cozinha comunitária), atividades esportivas, culturais e pressão aos equipamentos públicos no sentido de garantir direitos humanos/sociais para os envolvidos.
Os contemplados e ocupantes não-contemplados pela Caixa Econômica têm algo em comum: ambos são povo e devem ter seus direitos respeitados. Nos posicionamos sempre ao lado desse, principalmente os mais vulneráveis. Existe uma tentativa explícita de criminalização dos movimentos sociais, partidos de esquerda e dos ocupantes do Novo Horizonte. A tentativa de criminalizar a luta por direito à moradia é uma prática contumaz por parte da gama de partidos do qual o referido vereador faz parte, pela sua total incapacidade de se posicionar em favor dos que mais necessitam.
Moradia é uma questão de vida e dignidade, prevista pela constituição federal que não vem sendo garantida ao povo brasileiro e a situação em Campos não é diferente. Os sucessivos escândalos de corrupção junto a construtora Odebrecht, responsável pelas habitações populares do programa municipal “Morar Feliz” e hoje a total imobilidade da EMHAB (Empresa Municipal de Habitação), somadas a ausência de um planejamento urbano que pense o direito à cidade para todos, os cortes prolongados e vexaminosos sobre a política de Assistência Social, tem exposto as pessoas as mais absurdas carências e vulnerabilidades. São seres humanos que precisam escolher entre comer ou pagar aluguel. Isso quando consegue uma das duas coisas.
A exploração do nosso povo, o processo acelerado de pauperização, desempregos, informalidades foi acrescido pela Pandemia do coronavírus. E não precisa ser especialista para correlacionar que as escolhas políticas do Governo Bolsonaro, Witzel, Castro, Diniz e agora o retorno dos Garotinhos tem impactos concretos na vida dos mais vulneráveis. Campos continua sem um programa municipal de transferência de renda, suprimido na gestão Diniz, o orçamento da Assistência nos últimos 3 anos diminuiu em aproximadamente 44% e em 2021 representa apenas 1,55 do orçamento municipal; o auxílio emergencial restrito a 150, 250 e 375 reais faz povo padecer.
Convidamos todas as pessoas a conhecerem a ocupação e a encararem esses problemas de frente, buscando alternativas viáveis e, ainda, indagamos: qual a solução, caro vereador? Expulsar as pessoas das casas e deixá-las na rua, em contexto sanitário grave? Deixá-las morrer de fome? Ou buscar pressionar para que a prefeitura e o Estado cumpram seu papel de garantir dignidade?
Nossa opção é a última e convocamos a câmara a pressionar a prefeitura para que se responsabilizem a garantir e efetivar direitos de seus munícipes. Pessoas que consideram razoável que centenas de famílias sejam despejadas na rua em plena pandemia não podem ser qualificadas como representantes do povo.
Não existe solução razoável para a ocupação que não passe pela questão humanitária.
A respeito da “política rasa” de que o vereador nos acusa, nós perguntamos: É possível fazer “política rasa” reunindo esforços para conseguir doações e garantir a comida dos ocupantes? É possível fazer “política rasa” realizando atividades culturais e esportivas para os ocupantes, sem nenhum apoio do poder público? É possível fazer “política rasa” comparecendo junto aos setores mais vulneráveis da sociedade pra quem o poder municipal só dispensa desprezo e comparece apenas em período eleitoral?
Não temos a pretensão de obter respostas, porque existe um abismo entre a prática de nossos militantes e a política míope praticada pelo partido do referido vereador. Outros partidos e organizações além do Psol também apoiam a ocupação, o que torna os ataques feitos pelo vereador ao Psol Campos de uma covardia ainda mais gratuita. Salientamos que toda e qualquer manifestação desrespeitosa contra o nosso partido será devidamente respondida.
Um lembrete: o Psol não é um partido eleitoreiro, nos preocupamos sim em nos mantermos firmes em nossos propósitos de lutar ao lado da classe trabalhadora. E não em apostar no discurso mais fácil, como chamar de “invasores” e deixar o povo a própria sorte, ao mesmo tempo em que legitima a perseguição e a barbárie. Discurso que que não enxerga necessidades e pessoas, por isso, espolia e viola os pobres.
Ademais, é uma honra sermos chamados “filhotes de Boulos”, na medida em que reconhecemos nesse companheiro a luta justa de quem questiona as raízes das desigualdades no Brasil. Convidamos o vereador à revisitar o conceito de “política rasa” de que faz uso, pois o termo se encontra num ambiente político muito diferente do nosso".
*O mesmo espaço foi ofertado ao vereador, Anderson de Matos, caso o mesmo decida por uma réplica. 
 
 

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    Edmundo Siqueira

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