Cinema: A vida, a estrada e o conceito de lar
Felipe Fernandes 05/05/2021 18:24 - Atualizado em 05/05/2021 18:24
Nomadland - Em certo momento do filme, a irmã da protagonista comenta que Fern (Frances McDormand) faz parte de uma tradição americana, cultura realizada por pioneiros que construíram aquele país. É um momento que diz mais sobre aquele estilo de vida do que propriamente sobre a personagem.
Fern é uma mulher solitária que recusa qualquer oportunidade de estabilidade que a vida lhe ofereça. O filme conta sua história e a de outras pessoas nesse estilo de vida sem julgar ou romantizar a situação.
“Lar é só uma palavra ou algo que você carrega com você?”
Baseado no livro de Jessica Bruder, o filme tem uma abordagem bem sóbria, com um ritmo cadenciado e uma pegada documental. Vamos aos poucos conhecendo mais sobre ela, e aos poucos o filme vai perdendo seu estilo documental (digo isso em abordagem, não em estética). A trilha vai se tornando cada vez mais presente, tudo começa a ganhar dramaticidade, e vamos descobrindo sobre o passado da personagem e o que a levou até ali.
Muitas daquelas pessoas estão na estrada em busca de algo ou fugindo de algo. Uma situação solitária que, muitas, vezes ocorre de forma inconsciente. Conforme Fern vai tomando consciência disso, ela passa a entender seu lugar e ganha um norte.
A grande força do filme é a atuação de Frances McDormand. A atriz cria uma personagem complexa e de natureza reservada, que escuta mais do que expressa, fazendo com que muito da composição da personagem venha da grande atuação da atriz veterana.
A diretora chinesa Cholé Zhao chega ao seu terceiro longa com uma direção segura, digna de diretores veteranos. Aqui, ela cria uma obra interessante: a história da personagem é narrada de forma cuidadosa, o desenvolvimento da protagonista acontece de forma gradativa e muito natural.
Há uma fotografia belíssima e uma montagem cuidadosa, que consegue manter um ritmo importante na construção do clima da obra e é eficiente em trabalhar a passagem de tempo e as mudanças de local.
Trata-se de um filme que tem forte influência da diretora belga Agnès Varda. Essa mistura de documental e ficcional, e a abordagem sobre pessoas periféricas, com um estilo de vida alternativo, são características muito presentes no cinema da lendária diretora que ecoam no cinema de Chloé Zhao, herdeira direta desse cinema real e poderoso.

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