Pontes
Mariana Luiza 22/01/2017 01:19 - Atualizado em 18/05/2020 20:11
Sempre tive uma inexplicável admiração por Marilyn Monroe. O ícone sexual do vestido costurado no corpo, saindo do bolo como presente para o homem mais importante do planeta nunca foi o que me atraiu. Havia algo escondido, algo de obscuro, algo muito mais de Norma Jean do que de M.M. que me encantava e seduzia. Assisti a todos os filmes estrelados por ela, mas nunca havia lido nenhuma biografia sobre sua vida. Sempre achei que o que eu gostaria de saber sobre a Marilyn nunca foi dito em livro algum. Só não sabia onde encontrá-la. Como conhecê-la. Há quase um ano comprei um livro dos fragmentos de vários cadernos e diários que Marylin escreveu ao longo da vida. Poemas, testemunhos e desabafos de uma mulher muito diferente da que conhecemos, mas igualmente irresistível. Esta Marylin leu poetas e romancistas considerados difíceis como James Joyce. Casou-se com um escritor e encheu seus cadernos de angustias e sonhos. Esta Marylin gostava de pontes. Como eu. E de todas as identificações que tive com ela à medida que avançava na leitura do livro de fragmentos, esta foi a que mais me aproximou da diva loira. Pode parecer ridículo admirar uma pessoa porque ela, como você, gosta de pontes. Mas até então, eu não tinha encontrado ninguém na vida, que gostasse, pelo mesmo motivo, deste tipo de obra da engenharia. Talvez isso não aconteça entre pessoas que torçam por um mesmo time de futebol, ou que gostem de um mesmo filme. Mais do que dividir o gosto por um assunto ou coisa, é compartilhar as mesmas razão pela qual se gosta daquilo. Não existem pontes feias para Marylin. Não existem pontes desnecessárias para mim. Todas as pontes nos levam a um caminho talvez novo, talvez desconhecido. Cruzam rios, vales, rodovias. Tornam-se um caminho alternativo para a vida. Atravessar uma ponte é não dar voltas para chegar a algum lugar. É talvez a única forma de se chegar. Pular de uma ponte é acabar com a chegada. Ou proporcionar um novo começo. Não há nenhuma ponte no mundo feia o suficiente, que não mereça ser atravessada. “Oh droga queria estar morta - absolutamente inexistente - desaparecida daqui - de todos os lugares, mas como eu conseguiria. Sempre existem pontes.
A Ponte do Brooklyn Mas eu amo aquela ponte (tudo é lindo daqui e o ar é tão puro caminhando) me parece cheio de paz lá mesmo com todos aqueles carros enlouquecendo embaixo. Então teria que ser outra ponte uma feia e sem vista - exceto que gosto em particular de todas as pontes - existe algo nelas e além do mais nunca vi uma ponte feia.” 
Eu e Marilyn amamos a mesma ponte. Quando cheguei a Nova York, no meu primeiro dia na cidade, resolvi sozinha pegar um metrô até Manhattan em direção à Times Square. Eu estava assustada. Uma menina que passou a vida numa cidade como Macaé, que só tinha uma sala de cinema, ficou intimidada diante de tanta luz, tanta gente e movimento. Andei por cinco minutos na Broadway e peguei o metrô de volta. No trajeto, eu me perguntava se deveria estar mesmo ali, se minha decisão de morar um tempo naquela cidade não tinha sido precipitada demais. E planejava com ansiedade remarcar minha passagem de volta ao Brasil assim que chegasse ao apartamento. Desci na Fulton St. e caminhei até a ponte do Brooklyn. Atravessei a ponte caminhando e quando estava no meio da travessia, liguei para a minha mãe. Falei dos medos, da quantidade de pessoas e luzes, e à medida que eu falava era como se aquilo tudo ficasse pra trás. Quando cheguei ao Brooklyn peguei o trem de volta a Manhattan e passeei por horas na Times Square. Vi o anoitecer naquele lugar que nunca anoitece. Vi o escurecer do céu diante dos radiantes letreiros de musicais e comerciais de óculos de sol e calças jeans. Cheguei à noite em casa curada do excesso que é a Times Square e vivi por mais um ano naquela cidade insone sem sofrer de medo algum. 

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