A cena de motociclistas que trafegam em calçadas, furam semáforos e andam de forma perigosa tornou-se frequente em Campos, demonstrando a falta de fiscalização e o desrespeito às leis de trânsito. O Código de Trânsito Brasileiro (CTB) prevê punições para essas infrações, como multa gravíssima para circulação sobre calçadas e avanço de sinal vermelho. No entanto, a aplicação dessas penalidades na prática, nem sempre é percebida por quem convive diariamente com essas situações. O Detran RJ informou que foram registradas mais de 700 infrações ainda no primeiro trimestre de 2025, em Campos.

Mesmo com o sistema de monitoramento através de câmeras instaladas em semáforos na cidade, os pedestres que presenciam ou passam por situações de risco não têm a certeza de que os motociclistas serão punidos. Visto que, sem uma comunicação clara sobre as autuações, prevalece a sensação de impunidade.

Felipe Said, de 43 anos, é técnico de formação profissional do Serviço Social do Transporte e Serviço Nacional de Aprendizagem do Transporte (Sest Senat), em Campos, e fala sobre a situação. “A sensação de impunidade gera um comportamento de risco que coloca em perigo não apenas os próprios motociclistas, mas também pedestres e outros condutores. Nas calçadas, por exemplo, pedestres ficam vulneráveis a atropelamentos. Já em cruzamentos, o avanço de sinal pode causar colisões graves, muitas vezes com vítimas fatais”, comenta.

Em alguns pontos da cidade, essas infrações têm sido bastante comuns como, por exemplo, na Avenida 28 de Março, nas proximidades da esquina com a Rua José Peixoto Siqueira. Próxima a esse cruzamento, uma calçada em frente à antiga agência do banco Itaú é frequentemente utilizada por motociclistas que circulam irregularmente. A reportagem da Folha esteve no local e flagrou diversas irregularidades por parte de usuários de moto.

Romário Cravo de Souza, de 63 anos, tem um comércio na 28 de Março há mais de duas décadas. Ele conta que essas irregularidades acontecem com muita frequência nesse trecho. “Quase toda semana tem acidente aqui. Eles sobem na calçada do meu comércio, ali em frente ao antigo Itaú também tem muito disso. Isso é frequente. E não vemos nenhuma fiscalização por aqui. Muitos deles ultrapassam o sinal vermelho e acabam provocando acidente”, conta.

A auxiliar de escritório, Rosana Lemos, de 47 anos, relata situações que se tornaram frequentes no dia a dia de quem está no trânsito da cidade. “O que mais se vê é motociclista passando pelas calçadas e fazendo aquele corredor entre os carros. Eu estou até com o retrovisor do meu carro quebrado por conta disso. Um motociclista passou por mim, sem cuidado algum, e quebrou meu retrovisor. Esses dias eu quase atropelei um motociclista no bairro Imperial, por que ele estava vindo no sentido contrário, na pista que não é permitida, e estava todo apagado. Enfim, não respeitam ninguém”, relata.

Geremias Alves, de 53 anos, é motorista particular em Campos há oito anos. Ele comenta a percepção em relação aos usuários de moto durante esse período. “Sempre vejo irregularidades deles no trânsito. Também vejo os motoboys, motoqueiros de moto por aplicativo também fazem bandalhas no trânsito porque eles têm outras corridas esperando para buscar. Com isso tem que correr muito e até mesmo avançar os sinais de trânsito. Assim como os motoboys da nossa cidade é a mesma situação. Já vi alguns deles tapando a placa para não serem fotografados pelas câmeras. Os de aplicativo colocando a vida do passageiro em risco”, conta.

Apesar da matéria abordar motociclistas em geral que cometem infrações, a Folha ouviu também a Associação dos Motoboys do município, que reforça que esses comportamentos afetam a imagem e a segurança de quem trabalha de forma correta no trânsito. A associação representa motoboys, mototaxistas, bikeboys e entregadores de água e gás.

O presidente da associação, Diego Nogueira, de 40 anos, comenta sobre a percepção da companhia em relação a essas situações. “O comportamento desses motociclistas estão totalmente fora do padrão imposto pelo CTB. Eu acredito que exista fiscalização suficiente, só não há penalidade e fiscalização no horário das infrações. Tem segurança no período do dia e as informações costumam ser no período da madrugada. Nossas companhias são constantes em nosso grupo de WhatsApp e em nossas redes sociais, mas falamos apenas com o nosso público, acho que deveria ter campanhas educativas na televisão e no rádio também. Inclusive fazemos uma campanha anual, que é o ‘Rolezinho da Paz’, no dia 24 de dezembro, para evitar o famoso ‘Rolezinho’ de natal que atormenta a população”, explica o presidente.

Na tentativa de alertar ou chamar atenção dos órgãos competentes, moradores recorrem às redes sociais para divulgar flagrantes do dia a dia. Em um dos vídeos publicados nas redes sociais, um motorista registra o momento em que um motociclista trafega pela calçada e, mais a frente, encontra uma pedestre, que em determinado momento fica parada para que ele consiga passar e continuar pela calçada.

Felipe sugere que a fiscalização no trânsito da cidade seja ampliada. “Especialmente com o uso de tecnologia, como câmeras inteligentes e aplicativos que permitam denúncias por parte da população. Além disso, campanhas educativas e ações integradas são essenciais para promover uma mudança cultural e conscientizar os condutores”, explica. Ele ainda acrescenta que, “enquanto isso não acontece, os motociclistas que seguem as regras e respeitam o trânsito acabam sendo prejudicados, pois sofrem com o estigma causado por aqueles que insistem em desrespeitar a lei”, comenta o técnico.

Em nota, o Novo Detran RJ informou que nesse primeiro trimestre de 2025 foram registradas 774 infrações, em Campos. O departamento disse ainda que as ações estão sendo intensificadas com objetivo na conscientização e na redução dos acidentes envolvendo motociclistas. "Na campanha Maio Amarelo desse ano, em parceria com órgãos públicos e entidades privadas, o departamento promoverá iniciativas voltadas especialmente para a segurança dos motociclistas [...] Acreditamos que a educação é o caminho para mudar a cultura da imprudência, tornando o trânsito mais seguro e humanizado", informa o órgão.

Já a Secretaria de Estado da Polícia Militar (SEPM) comunicou que “a corporação realiza ações para reprimir tais mobilizações sistematicamente em todo o Estado. Os policiais interceptam os motociclistas e realizam as verificações de documentos pertinentes, além de verificar possíveis atos transgressores em flagrante”.

Enquanto a Guarda Civil Municipal (GCM) disse que “realiza patrulhamento preventivo e ostensivo a fim de coibir não só as infrações das motocicletas, mas também de qualquer outro veículo”, além das ações conjuntas com outras secretarias e PM. "A fiscalização por videomonitoramento está sendo realizada em conformidade com a Resolução do Conselho Nacional de Trânsito (Contran) 909/2022. Essa regulamentação permite ao município o uso da tecnologia para garantir maior segurança e eficácia no trânsito”, diz a nota.

As denúncias de irregularidades no trânsito devem ser feitas através do telefone do Disque-Denúncia (21) 2253-1177. Já em casos urgentes, o acionamento deve ser feito através do 190. Os registros também podem ser feitos nas delegacias da Polícia Civil. Já os contatos da sala de operações da GCM são 153 ou (22) 98102-0185.