Só no último domingo, 07 de setembro, quando a primeira temporada da comédia musical "Ponciano de Amores Furtado" se encerrava, tive a oportunidade de ir ao Teatro de Bolso Procópio Ferreira para, da primeira fila, presenciar e aplaudir de pé esse espetáculo baseado na obra de José Cândido de Carvalho.
A querida e admirável autora Arlete Sendra e o também admirável diretor Fernando Rossi - ambos acadêmicos da ACL - levaram ao palco do Teatro de Bolso a leveza dos causos contados à porta de casa, com fidelidade ao linguajar meticulosamente retratado por José Cândido em seus contos, crônicas e romances.
O Coronel Ponciano de Azeredo Furtado, vivido pelo primoroso Pedro Fagundes, é pura hesitação e casmurrice para demonstrar um coronel que só sabe fazer alarde da honra que herdou do avô Simeão.
Os demais integrantes do elenco - Katiana Rodrigues, Liana Velasco, João Velasco, Nathan Silva, Valdiney Mendes, Luciana Rossi, Almir Júnior, Geovane Crisóstomo, Renato Arpoador e Vânia Navarro - dão o tom de uma comédia que apresenta o Coronel por si mesmo e pelos olhos dos outros, com a imagem contrastante entre o que sente e o que mostra para os que o rodeiam.
A trama, delineada em torno das histórias causídicas de Ponciano, é cantada em diferentes ritmos, que ficaram a cargo do músico e compositor Renato Arpoador – que fez uma luxuosa parceria com a autora, Arlete Sendra, e, para a música de abertura, com Gualter Torres -, contando com execução do próprio Renato, da multifacetada Katiana Rodrigues e da instrumentista Vânia Navarro, que dão cadência ao andamento da história de acordo com o passar dos acordes.
Voltando à trama, considero que o ponto alto da peça se dá com a presença do advogado e político frustrado Pernambuco Nogueira - vivido pelo hilário Almir Júnior - e sua esposa Esmeraldina - vivida pela talentosa Katiana Rodrigues. O casal arranca ótimas risadas da plateia ao fazer críticas ácidas à política campista enquanto a esposa do candidato se insinua para Ponciano, de olho em suas posses.
Outro destaque é o figurino assinado por Luciano Moreira, que já demonstra seu preciosismo desde a entrada dos três músicos - trajados de acordo com Mouros e Cristãos da tradicional Cavalhada de Santo Amaro -, algo que se estende ao elenco e se evidencia nos figurinos de Ponciano, sendo um deles pintado à mão pela artista Andréa Barcelos.
A ficha técnica conta, ainda, com cenografia de Vanderlei Machado, fotografia de Patrícia Bueno, iluminação de Marco Antonio Almeida e produção executiva de Aucilene Freitas.
Ao expor as fragilidades da vida de aparências de Ponciano, Arlete Sendra nos instiga, com veia cômica afiada, a repensar os hábitos do povo de nossa planície, a hipocrisia de quem fala uma coisa e vive outra e os impactos psicológicos dessas contradições.
A autora, sem dúvidas, enriquece o texto de “O Coronel e o Lobisomem” ao trazer à tona sua leitura sobre a solidão amorosa do protagonista, mantendo a riqueza linguística popular e a precisão geográfica contidas na obra, que é um passeio pela Baixada Campista.
A peça, é importante dizer, contou com verba da Lei Paulo Gustavo, que viabilizou a execução de um espetáculo de tamanha qualidade com preços populares.
Ressalto que não sou técnico em teatro, mas, por ser um apreciador dessa arte e por trabalhar com literatura, saí do Teatro movido a escrever este texto com impressões sinceras de um espetáculo que merece ser divulgado Brasil afora.
Para quem não pôde comparecer na primeira temporada da peça, fique sabendo que a próxima apresentação ocorrerá no domingo, dia 21 de setembro, às 18h, na Santa Paciência - Casa Criativa, localizada na Rua Barão de Miracema, 81, no Centro de Campos.
*Ronaldo Junior nasceu em março de 1996 no Rio de Janeiro. É bacharel em Direito, licenciado em Letras e escritor membro da Academia Campista de Letras, instituição da qual é o atual presidente. www.ronaldojuniorescritor.com
**Texto publicado na coluna Folha Letras do dia 10 de setembro de 2025.