Prefeita de SJB é contra vacinação infantil e gera reações pelo país
Arnaldo Neto 22/01/2022 02:44 - Atualizado em 22/01/2022 11:29
A prefeita de São João da Barra, Carla Machado (PP), tomou mais uma atitude controversa em meio à pandemia da Covid-19. Além de não ter se imunizado, após ter usados as redes sociais, no ano passado, para defender a imunização geral como único caminho para vencer a pandemia, Carla desaconselhou a vacinação de crianças de 5 a 11 anos, em uma live pelas redes sociais, na última quarta-feira (19). Ela ainda informou que o município vai disponibilizar um remédio fitoterápico para ajudar na imunidade das crianças. A repercussão foi negativa, ganhando, inclusive, a mídia nacional. Carla utilizou argumentos sem comprovação, contrariando a ampla maioria da comunidade científica internacional. A vacina foi liberada pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) e é recomendada por entidades médicas como a Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP). A posição da prefeita foi criticada por especialistas. Apesar de já ter recebido 400 doses do imunizante, a Prefeitura de SJB é a única que não fez nenhuma campanha de divulgação sobre a imunização, apesar de ter informado que iniciou o cadastro desde a última segunda-feira (17) e que pretende começar a vacinação infantil na próxima segunda (24).
Na quarta, em transmissão ao vivo pelas redes sociais, Carla foi se justificar por não ter se vacinado e levantou suspeita, com base nas “mídias alternativas”, sobre o imunizante.
— Vou pedir às mães: olha a bula. Olha direitinho a bula! Se eu tivesse filho, eu não vacinaria. Tem um RNA mensageiro... (...) A Pfizer, por exemplo, não se responsabiliza por quaisquer efeitos colaterais. Mexe com RNA, essa proteína aí, que é uma proteína que pode dá algum um tipo de problema. (...) Nós estamos aí preparando aí um medicamento natural, sem efeito colateral para ajudar na imunidade das crianças. A secretaria de Saúde já está providenciando — afirmou a prefeita.
Carla está no quarto mandato como prefeita. Professora das redes públicas municipal e estadual, lecionou por alguns anos a disciplina de Ensino Religioso para alunos do Ensino Fundamental, em Atafona. Por muitos anos, foi cedida para atividades administrativas, já que foi secretária de Educação, vereadora e prefeita, além de desempenhar funções no Estado, à época que era aliada do clã Garotinho. Durante a pandemia, tomou várias medidas seguindo as orientações técnicas, como lockdowns e barreiras sanitárias, suspensão de aulas, entre outras. Nunca com papel técnico na área da Saúde. A atuação do município no enfrentamento à pandemia seguia os critérios técnicos até o fim do último ano.
Eleitora declarada do petista Fernando Haddad no último pleito — para quem, inclusive, fez campanha em 2018, a despeito da expressiva votação de Jair Bolsonaro (hoje PL) no município desde o primeiro turno —, ela foi extremamente criticada por eleitores bolsonaristas na cidade, que eram contra as restrições. Causou estranheza o fato de ela não ter se vacinado, só revelado após ela ser barrada de uma entrevista na InterTV Planície, do Grupo Folha, no último dia 7.
A secretária municipal de Saúde, Arleny Valdés, foi questionada sobre a sua posição pessoal, enquanto médica, em relação às declarações da prefeita, além de esclarecimentos sobre o medicamento prometido, mas não respondeu até o fechamento da edição.
Especialistas saem em defesa da vacinação
Logo que as palavras da prefeita ganharam as redes sociais, especialistas da região se posicionaram, defendo a eficácia da vacinação nas crianças.
Pediatra e infectologista, Charbell Kury destacou o aumento de internações de crianças pelo país e apontou a vacinação como principal caminho. “Considero temerária essa afirmação principalmente porque a prefeita não é profissional de saúde, nem especialista em vacinação. Isso pode, de alguma forma, desencorajar os pais”, disse.
O infectologista Nélio Artiles observou que não há medicação que possa aumentar as defesas ou impedir a infecção pela Covid e defendeu a vacinação. “Os estudos de fase 3 demonstram segurança e eficácia da vacina da Pfizer para crianças menores”.
O pediatra Francisco Oliveira, o Dr. Chicão, afirmou que é totalmente favorável à ciência. “É muita fake, fora muita política. Eu sou a favor (à vacinação) como pediatra e como pessoa que acompanha as decisões científicas”.
Prefeitura sem divulgação sobre imunização
A Prefeitura de São João da Barra foi a única entre as nove do Norte Fluminense que não deu nenhuma informação à população sobre o início da imunização das crianças no site e redes sociais oficiais. Coincidentemente, o atraso ocorreu justamente na semana em que a prefeita desaconselhou a vacinação. A Prefeitura informou, porém, que já realiza o cadastro desde a última segunda, nas Unidades Básicas de Saúde (UBS) ou Estratégia Saúde da Família (ESF), das 9h às 16h.
As primeiras 200 doses do município chegaram no sábado (15) e outras 200 na terça (18). Porém, até as 20h dessa sexta-feira (20), nenhuma informação foi publicada nos canais oficiais da Prefeitura. A intenção é iniciar a imunização nesta segunda.
Diferentemente da prefeita e da Prefeitura, o presidente da Câmara de SJB, Elísio Rodrigues (PL), fez campanha pela imunização as redes sociais. Ele informou que já tomou as três doses contra a Covid. Pai de um menino na faixa elegível para vacinação, Elísio afirmou que vai imunizar seu filho e que o menino havia sido vacinado contra a gripe há duas semanas.
A vacinação no Norte Fluminense teve início em Macaé, na última segunda. No dia seguinte, foi a vez de Campos e Conceição de Macabu. Carapebus e Quissama iniciaram na quarta, enquanto Cardoso Moreira, nessa quinta. São Francisco do Itabapoana anunciou o agendamento e começa a imunização nesta segunda. Sem muitos detalhes, São Fidélis já fez o anúncio, mas a aplicação das doses só começará na terça-feira (25).
De negacionista a tia do zap em sites do país
As declarações da prefeita sanjoanense foi parar nos maiores jornais em circulação do país, que criticaram a posição dela.
Na coluna de Ancelmo Gois, em O Globo, Carla foi chamada de negacionista. “Como se sabe, a vacina para crianças é segura segundo aval dado pela Anvisa após estudos apresentados pela Pfizer. Não há qualquer indicação de efeito colateral (...) a Agência Europeia de Medicamentos informou que vacinas de RNA mensageiro, citada pela prefeita, não trazem risco a grávidas e bebês”, escreveu na coluna o repórter Nelson Lima Neto.
Na Folha de São Paulo, Catia Seabra destacou que Carla lançou dúvidas sobre a eficácia da vacina e, além de desencorajar a vacinação das crianças, aproveitou para “dar sua receita de saúde, que inclui água morna, própolis, meditação e 20 minutos de sol pela manhã. A matéria teve chamada na capa do site, junto com a manchete que fala sobre a recomendação da Anvisa para Coronavac para faixa etária de 6 a 17 anos.
O site Diário do Centro do Mundo também repercutiu o assunto. Na matéria de Naian Lopes Carla é comparada com o presidente Jair Bolsonaro (PL). Nas redes sociais do veículo, a prefeita foi chamada de “tia do zap”.

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