Ethmar Filho: Nem George nem Orwell
Ethmar Filho 05/06/2020 19:28 - Atualizado em 17/06/2020 18:04
Há cento e dezessete anos, no dia 5 de junho de 1903 (um dia como hoje), nascia, na Índia Britânica, o escritor George Orwell, autor de “Animal Farm”, traduzido para o português do Brasil como “A Revolução dos Bichos”, uma espécie de spoiler a respeito do conteúdo do livro, e “1984”, outro best seller de sua autoria. Orwell, o cara que, com sua obra, levantou a lebre sobre o Big Brother, como um grande irmão que está de olho em todos, dizia que a xícara perfeita de chá britânico era aquela servida sem açúcar, entre outras dez regras descritas por ele a respeito do assunto. Seu verdadeiro nome era Eric Arthur Blair, batizado artisticamente como George Orwell porque era um verdadeiro patriota e usou o George de “Saint George”, uma escola de idiomas em Londres, e o conhecido rio Orwell, que flui através do condado de Suffolk, na Inglaterra, desaguando no Mar do Norte.
Entre 1928 e 1929, Orwell quase morreu de fome enquanto morava em Paris (às vezes trabalhando como garçom). Ele descreveu em detalhes essa triste e importante experiência em "Down and Out in Paris and London" (Na pior em Paris e Londres — nome da edição brasileira do livro). Em 1936, lutou na Guerra Civil Espanhola para "combater o fascismo e defender a democracia" e levou um tiro na garganta — uma lesão que quase o matou — por ser muito alto e se levantar na trincheira, apesar de inúmeros avisos de seus superiores, tornando-se um alvo fácil. A bala passou a milímetros das circulações principais e mais importantes do pescoço, como a artéria carótida e a veia jugular.
Orwell foi professor em uma escola de Londres, garçom em Paris e policial na Birmânia. Do romance “A Revolução dos Bichos”, o grande maestro Daniel Baremboin, em seu canal do YouTube, onde responde às cartas que lhe são enviadas por seus admiradores alunos de música, retirou um comentário pontual a respeito do dodecafonismo de Shoemberg: “O compositor usa as doze notas, de forma atonal e igualitária, valorizando algumas em particular e preferencialmente. Assim como no Politburo, onde todos os homens são iguais, porém alguns são mais iguais que outros, Shoemberg constrói seu dodecafonismo”. Na verdade essa frase vem do romance de George Orwell, onde um dos animais diz que “todos os animais são iguais mas alguns são mais iguais que outros”, descrevendo a igualdade teórica em uma sociedade grosseiramente desigual.
Em seus ensaios políticos, no ano em que lançou seu livro e ficou viúvo, Orwell destacou a importância da linguagem clara e honesta em contraposição à escrita vaga que pode ser usada como ferramenta poderosa de manipulação política. Seu segundo mais importante romance, “1984”, aborda o caótico período pós-guerra 1945-49, destacando como as alianças militares e diplomáticas da Segunda Guerra Mundial, entre USA, UK e URSS, podem ser nada ideológicas e totalmente convenientes estratégica e economicamente. O romance também descreve a chamada “Novalíngua”, que seria um novo vocabulário estratégico, usado pelo governo totalitário hipotético, onde as poucas palavras faladas e seus significados corriqueiros serviriam ao controle do pensamento e da desinformação generalizada através do controle do idioma, de uma forma assustadora.
Orwell descreve um lugar imaginário, governado pelo ditador “Big Brother”, onde são expostos cartazes, em todos os muros, que alertam as pessoas para o fato de que estão sendo observadas e vigiadas diuturnamente. Vale a pena ler os dois best sellers e talvez associa-los a algum grande país exportador de eletrodomésticos, de seres humanos e de gripes letais.
Maestro Ethmar Filho – Mestre em Cognição e Linguagem.

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