Felipe Drumond: A (In) Justiça como espetáculo
05/06/2020 16:12 - Atualizado em 17/06/2020 18:04
Em outras oportunidades já tratei, neste espaço, dos graves problemas relacionados à espetacularização de julgamentos. Infelizmente, o tema segue bastante atual. Investigações e ações judiciais, em especial as de natureza criminal e as relacionadas à vida política, têm ocupado lugar de destaque na mídia. Assim, o anseio da sociedade por “justiça” não raramente se converge em sentenças de opinião que demandam punições exemplares, à revelia do que possa ser efetivamente comprovado ao longo do devido processo legal.
Nesse ponto, é importante destacar que a sede por condenações rápidas e constantes, desvinculadas dos direitos e garantias individuais, não atende ao bem da própria sociedade, especialmente quando tais anseios são incrementados por profunda polarização política, como tem ocorrido hodiernamente no Brasil.
Alguns dos episódios mais brutais da história da humanidade foram alicerçados em julgamentos que priorizavam a punição a todo custo como forma de se atender aos interesses de alguns grupos ou de responder aos anseios da população, negando-se, assim, o efetivo direito de ampla defesa e a necessidade da devida e isenta comprovação das imputações.
A despeito de não ter sido provada qualquer ação criminosa de Jesus Cristo, para atender aos brados do povo, Pôncio Pilatos, representante do Estado, o condenou à morte de maneira humilhante, crucificado diante de seus pares. Na Idade Média famílias eram reunidas em praça pública para assistir a espetáculos de açoites, enforcamentos e decapitações de supostos criminosos que ousavam desafiar a coroa. Difícil imaginar que, se àquela época fosse assegurado o devido processo legal repleto de direitos e garantias fundamentais a todos os acusados, tivéssemos notícias de fatos tão bárbaros e desumanos.
A evolução dos sistemas jurídicos conduziu à formação do processo penal com regras intransponíveis que visam minimizar, ao máximo, a possibilidade de um inocente ser condenado. Assim, o Estado, por meio do Poder Judiciário, jamais pode permitir que algum acusado sofra condenação por parecer culpado, por ter fama deplorável, por ser um líder rude, por seus posicionamentos políticos ou por despertar asco de grande parcela da população.
Portanto, é indispensável que cada acusação seja minimamente evidenciada por meio de provas concretas, irrefutáveis e permitidas por lei. O Estado não pode se igualar ao criminoso violando as normas e produzindo provas ilícitas com o propósito de se punir infrações penais, da mesma forma que não pode funcionar como um tribunal inquisidor, em que o mesmo magistrado exerce as funções de investigador e, depois, de sentenciante.
Esses mecanismos, ao contrário de serem meras formalidades burocráticas que propiciariam a impunidade, são instrumentos indispensáveis à proteção de toda a sociedade. Trata-se da garantia de que nenhum de nós seja injustamente acusado e condenado ao arrepio da lei e para aplausos da plateia, afinal somos todos inocentes até que se prove o contrário.

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