"Bola para frente". Uma entrevista com o novo reitor da Uenf.
18/09/2019 21:36 - Atualizado em 18/09/2019 22:13
Raúl
Raúl
Raúl Palacio foi eleito o 9º Reitor da Uenf. Palacio assumirá o lugar de Luís Passoni, para o próximo quadriênio na instituição. A vitória foi confirmada pela Assessoria de Comunicação da Uenf - Ascom, em primeira mão à Folha, às 00h45 desta quarta-feira (18). Raúl recebeu 51,25% dos votos válidos contra 48,04% recebidos por seu opositor no segundo turno, Carlão Rezende.
Nesta entrevista, o próximo reitor da Uenf fala sobre as polêmicas na campanha, sua origem em Cuba, os planos para sua gestão e sobre a autonomia da Uenf, com o recebimento dos duodécimos — o pagamento dos duodécimos às universidades Estaduais ficou estabelecido no final de 2017, com a aprovação na Alerj da Emenda Constitucional nº 47.
Raul perdeu entre os professores, que representam 70% de peso no colégio eleitoral da Uenf, mas saiu vitorioso com a adesão de técnicos e alunos. Sem reposição salarial há mais de cinco anos, os técnicos receberão atenção do próximo reitor "a partir do momento que a gente receba os duodécimos, a gente vai poder fazer a reposição de perdas salarias de todos esses anos, que seria algo em torno de 3, 4, 5%", prevê Raúl. 
Em relação a aproximação com a sociedade, Raúl cita projetos na entrevista. Propõe que a universidade seja utilizada para esporte e cultura na cidade, levando os ciclistas de domingo da Arthur Bernardes para o Campus da Uenf. Propõe ainda a criação de um "selo Uenf de qualidade" para produtos locais como cachaça e queijos. 
Confira a entrevista completa: 
Edmundo Siqueira — Parabéns pela vitória professor Raúl. Começo perguntando: Qual o futuro da Uenf?
Raúl Palacio — Para o futuro a Uenf temos uma universidade com uma elevadíssima capacidade de trabalho de todas as categorias, tanto estudantes, quanto professores, quanto funcionários, um pessoal extremamente qualificado que tem a possibilidade de se inserir de forma correta na cidade e poder contribuir cada vez mais com o desenvolvimento de Campos e região. Nosso plano é trabalhar no fortalecimento da graduação, da pós e da extensão, no fortalecimento de uma política de cultura que hoje não temos. Temos alguns exemplos como a professora Simone que com muito esforço desenvolve lá na Villa Maria, mas precisamos ampliar isso trazendo alguma pessoa da sociedade que trabalhe diretamente cultura para nos ajudar. Hoje temos uma estrutura muito boa dentro da universidade que vai nos permitir cada vez mais nos inserir dentro da comunidade de Campos dos Goytacazes e da região para atender os problemas e melhorar o IDH por exemplo. O futuro é glorioso. Temos problemas sim, financeiros. Mas a partir dos duodécimos tocaremos o barco de maneira mais tranquila. É só observar as universidades paulistas, que a partir do momento que tiveram independência financeira realmente deslancharam. Com a nossa, conseguiremos atender bem melhor as necessidades da universidade e da sociedade. É um futuro glorioso com certeza.
Edmundo Siqueira — O senhor é de origem cubana, naturalizado brasileiro. Como iniciou seu interesse pela causa da educação? Quais as diferenças que encontrou na forma de gestão da educação aqui no Brasil?
Raúl Palacio — A educação na minha família começou muito cedo. Eu sou filho de professor, neto e bisneto de professores. Sempre estive em contato com conteúdo e sala de aula. Para mim é um processo muito natural defender a educação pública, gratuita e de qualidade. Em Cuba a educação é muito mais prática. Aqui no Brasil é mais teórica. Por aqui temos que valorizar mais os professores. A importância da profissão. Ela deve ser bem remunerada e valorizada. Eu participei de ambos os sistemas e consegui tirar a parte boa dos dois. Fiz a graduação toda em Cuba e a pós-graduação aqui no Brasil na Unicamp, em centro de excelência em relação a educação.
Edmundo Siqueira — As eleições tiveram resultado apertado. Entre os professores o senhor perdeu por 27 votos. A que o senhor relaciona essa diferença? O diálogo com os docentes na campanha teve algum ruído?
Raúl Palacio — Eu não sinto que perdemos entre os professores. Tivemos um incremento de vários professores, mais de 30 do primeiro turno ao segundo turno. E alguns que votaram na nossa chapa não puderam comparecer, pois estavam em férias ou em congressos. Não tive nenhum problema com isso, os professores escolheram entre as duas chapas. Eu acredito que agora que uma ganhou o pleito, todos os professores irão se juntar para continuar como ponto principal, tanto o professor Carlão, quanto eu, que é a defesa da universidade pública, gratuita, de qualidade e socialmente referenciada. Cada um fez a sua escolha, uma vez concluído o pleito, bola para frente e vamos todos defender a Uenf.
Edmundo Siqueira — Durante a campanha, seu opositor no segundo turno Carlão disse que a produção acadêmica é essencial a um reitor. Você acredita que a habilidade política e de diálogo foi preponderante na escolha?
Raúl Palacio — O primeiro ponto a esclarecer é que a produção acadêmica não se reduz a produção de artigos, entendeu? Então, o currículo que está colocado no CNPQ é um currículo da área da ciência. Mas a academia também tem outras áreas. A academia tem a docência, a extensão, a participação em cargos administrativos e a participação com a sociedade. Tentar reduzir com determinado currículo, que tenha maior quantidade de artigos, eu acho errado. E a comunidade como um todo também acha, tanto que fomos eleitos. Mas é bom deixar claro que minha colega de chapa, a professora Rosana, tem todo esse viés científico. A universidade é composta por várias pessoas, por isso que montamos uma chapa para a gestão da universidade, onde as pessoas se complementam. Em relação à habilidade política, na realidade é capacidade de defesa de uma ideia. E essa habilidade política será a partir de métodos científicos de trabalho. A gente utiliza, dentro da defesa de qualquer ideia, especificamente na educação, as leis da termodinâmica para termos o sucesso que a gente teve durante todo esse tempo. Eu acho que as pessoas valorizaram a capacidade nossa de defender a universidade pública, gratuita e socialmente referenciada. Não é fácil, não foi fácil. Nosso grupo de trabalho ter conseguido que nossa universidade funcionasse por dois anos praticamente sem recursos. Isso é um trabalho coletivo, que as empresas que trabalharam com a gente, inclusive, depositaram um voto de confiança. E as pessoas também pesaram nossa capacidade de negociar e defender a Uenf.
Edmundo Siqueira — Ficou alguma mágoa em relação ao processo eleitoral? O senhor já conversou com Carlão?
Raúl Palacio — Ontem mesmo o cumprimentei depois do resultado, e não fica de fato mágoa nenhuma em relação a problemas pessoais. Foram estabelecidos critérios em relação a universidade, mas não ficou uma mágoa em relação a isso. Levar mágoas para casa faz mal. Agora todos são Uenf. E precisamos trabalhar a pesquisa, o ensino e a extensão como tripé essencial à universidade.
Edmundo Siqueira — O senhor já montou sua equipe?
Raúl Palacio — A minha equipe de forma geral ainda não foi montada. Mas ela parte da equipe que vínhamos trabalhando por quatro anos, são pequenas modificações que faremos, mas de forma geral, será a mesma equipe.
Edmundo Siqueira — Ainda na campanha, matérias veiculadas por um meio de comunicação da cidade, acusavam o senhor de baixa produção acadêmica e ligação com políticos. Como o senhor responde essas acusações?
Raúl Palacio — É bom deixar claro que do ponto de vista pessoal, Raul Palacio, CPF, irá procurar na justiça seus direitos. E todas aquelas acusações que foram colocadas, seja em blogs ou no portal, ou de qualquer outra forma, as pessoas vão ter que provar. Se conseguirem ótimo, se não, simplesmente terá um ressarcimento sobre o que foi colocado e uma retratação. Simples assim. Não é um problema de mágoa com ninguém, mas sim de justiça.
Edmundo Siqueira — Os técnicos foram determinantes em sua eleição. Assim como muitas categorias no estado, não recebem reajuste salarial há mais de 5 anos. Qual sua proposta para resolver essa questão? Existe um plano de cargo e salários sendo discutido?
Raúl Palacio — Em relação à salários, a lei de responsabilidade fiscal não impede que a reposição das perdas do ano anterior seja dada pela gestão da instituição. Nesse momento não conseguimos fazer porque não temos autonomia financeira. Mas a partir do momento que a gente receba os duodécimos, a gente vai poder fazer a reposição de perdas salarias de todos esses anos, que seria algo em torno de 3, 4, 5%. Em relação aos técnicos, temos uma situação de injustiça em relação ao plano de cargos e vencimentos da Uenf e da FAETEC. O mesmo técnico, com a mesma função e mesma categoria, recebe um salário inferior na Uenf. Isso não me parece justo. Para isso temos um projeto na Alerj para corrigir isso. Como é um problema de justiça, estamos entendendo que não representa um aumento de salário, mas sim a correção de uma injustiça que vem sendo feita por muitos anos. Fazendo a reposição salarial e equiparando com os técnicos da Faetec, estaremos resolvendo esse problema.
Edmundo Siqueira — Como a Uenf deve contribuir para a sociedade de Campos e região?
Raúl Palacio — A Nossa contribuição para a sociedade campista vem em todas as direções. A primeira delas é relaciona a graduação. Nós somos a realização do sonho de muitas famílias. Temos um ensino superior de muita qualidade. Temos inúmeros projetos de extensão. Todos eles direcionados a ser para a sociedade. Desde de economia solidária, o projeto de coleta de lixo, projeto de trazer o jovem para dentro de universidade, projetos na agricultura, enfim, inúmeros projetos que colocam a Uenf em contato direto com a sociedade. Esses projetos de extensão são complementados com parcerias público-públicas, com as prefeituras. Agora precisamos ir além disso. Precisamos que a Uenf seja um ponto cultural na cidade. A gente precisa que a Uenf seja um ponto de referência no esporte, por exemplo, ao invés das pessoas andarem de bicicleta na Arthur Bernardes, fechando a entrada da cidade aos domingos, as pessoas poderiam andar de bicicleta dentro da Uenf. A Uenf poderia ser utilizada para show, teatro, corais, música, orquestras, enfim, precisamos nos inserir dentro da agenda cultural da cidade, para que a Uenf passe a ser também referência em termos de cultura. A pesquisa é fundamental, mas podemos ir além disso. Precisamos que a universidade interaja cada vez mais com a sociedade. Outra possibilidade, que podemos trabalhar também é a criação do selo Uenf. Podemos criar junto a agricultura de Campos, um selo Uenf de qualidade. Podemos criar um selo Uenf de qualidade em relação a cachaça, queijos, telhas, etc. A universidade poderia contribuir para avaliar e dar a certeza da qualidade daquele produto oferecido à população. Esse é mais um exemplo do que a universidade pode contribuir para a sociedade. 

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

    Sobre o autor

    Edmundo Siqueira

    [email protected]