Você acorda com uma disposição incomum, resolve sair de casa mais cedo para tomar um café na padaria da esquina enquanto vê as pessoas passando de bicicleta rumo ao dia inteiro. Café acabado, caminho do trabalho. Quando nota, já é hora do almoço. Mais um telefonema antes de mais uma garfada, bebe uma água e volta para adiantar as demandas e ver se sai mais cedo. Hoje, pelo jeito, vai ter é que ficar até mais tarde. Chega em casa, já anoiteceu faz algum tempo. A pedida é se jogar no sofá porque - até parece - o dia rendeu.
Você acorda. Zero disposição. Vontade de nem olhar pra xícara do café que a máquina fez depois que você tateou o botão. Talvez a camisa de ontem caia bem, tanto faz. Digitar mais uns relatórios. Uma reunião e outras ligações de sempre. Hora do almoço. Chega uma mensagem que dá vontade de lançar fora o celular. Passa a tarde vagarosa pela penumbra que invade a persiana empoeirada. Chega em casa, é noite recém-caída. Melhor ir direto pra cama antes que outra ligação antecipe o amanhã.
Você nem acorda e já sente que o despertador está por tocar. Só então força pra abrir os olhos. A energia está média, até surpreende. Resolve ir pro trabalho ouvindo música. Quando chega, já vai direto pra cozinha tomar mais um café. O dia passa rápido, sem grandes intercorrências. Chega em casa, resolve ver uma série, mas acaba dormindo antes dos dez minutos.
Você acorda, não precisa sair de casa. Seu trabalho todo está no notebook aberto desde ontem na mesa da sala. Já recebe uma ligação da chefe impaciente porque você não viu as mensagens enviadas às cinco da manhã. O café pode esperar. Quando vê a hora, já é a pausa para o almoço, mas ainda não pode parar, só mais vinte minutos. Entra em outra reunião. Começa a anoitecer quando você finalmente vai comer alguma coisa enquanto rola o feed do Instagram para ler variedades vazias de vidas mais interessantes que a sua.
Você não dormiu. Tem uma apresentação importante para hoje e tudo precisa dar certo, pois o resultado do projeto depende de você. Quando chega, a sala de reuniões está vazia, pois a chefia decidiu que havia algo mais importante do que o cronograma que você apresentou desde o ano passado. Controla a raiva e vai cumprir a nova urgência recém-inventada por alguém que sequer sabe sua função na empresa.
Você acorda, vai ao banheiro lentamente e toma um café na mais plena calma. Seus subalternos - colaboradores - devem estar trabalhando enquanto você finge se importar com as demandas do dia. Chega na empresa quase na hora do almoço, óculos escuros, reclamando do cansaço e do calor que faz lá fora. Toma outro cafezinho para ver se acorda e pergunta qual é a agenda de hoje. Nada? Então resolve, antes de sair para almoçar, fumar um cigarrinho na área externa enquanto os outros adiantam um serviço que você ainda não sabe do que se trata. No fim da tarde, surge um imprevisto. Mandaram mensagem chamando para tomar um chope vendo o pôr do sol. O dia foi duro. Você chega em casa direto pro chuveiro e vai dormir explodindo de dor de cabeça.
Alguém te acorda. Você pergunta o que tem para o café e julga se vale a pena levantar da cama. Resolve aguardar o almoço enquanto liga a TV para ouvir amenidades vindas de um papagaio verde. Pelo celular, seu dia está traçado antes mesmo de sair da cama: a galera está chamando pro cinema. Você volta tarde da noite depois de andar por aí, mas ainda tem disposição para ler um livro enquanto toma um vinho na sua sala, onde pega no sono depois de um ou dois capítulos.
Você nem sabe que acordou, mas já acionou o piloto automático antes mesmo de abrir os olhos e cumprir a rotina que lhe foi ofertada. Ou você pôde escolher qual é a sua?
*Ronaldo Junior nasceu em março de 1996 no Rio de Janeiro. É bacharel em Direito, licenciado em Letras e escritor membro da Academia Campista de Letras, instituição da qual é o atual presidente. www.ronaldojuniorescritor.com.