Cabral diz que não pensa em voltar à política e quer trabalhar como jornalista
Rodrigo Gonçalves
Ex-governador Sergio Cabral
Ex-governador Sergio Cabral / Reprodução de vídeo
O ex-governador Sergio Cabral, que ficou preso por seis anos, concedeu uma entrevista ao colunista do Metrópoles Guilherme Amado, na qual fez várias revelações e que não pretende voltar ao cenário eleitoral, mesmo se pudesse. Acompanhe trechos da entrevista.


Sobre corrupção - Cadê a corrupção, se eu não superfaturei nada? Eu usei caixa 2. É um tipo de corrupção, mas não é corrupção de superfaturar contrato. Se eu faço uma licitação, eu não chego para você e digo: “Quero 3%”, como foi dito. Se ele está dizendo que eu tive 3% foi da empreiteira. Certamente foi o que eu usei em campanhas eleitorais. Sobra de campanha, caixa 2, é (...) Eu reconheço que eu fiz uso desse dinheiro. Era benefício pessoal, era base de campanha, sobrava um dinheiro, eu usava para um benefício pessoal, mas não era no superfaturamento, era caixa 2” (...) Eu nunca comprei joia para investimento, eu comprava nas datas festivas para a minha mulher. Um erro, já assumi isso, com dinheiro do caixa 2, da sobra de campanha. Agora, eu nunca pratiquei corrupção, isso é o que quero dizer claramente, eu nunca cheguei e disse assim: “Bota esse preço aí, você vai ganhar essa licitação”.

Punição - Os procuradores fizeram comigo algo que não fizeram com ninguém na Lava Jato. Foram mais de 700 presos na Lava Jato, em Curitiba e no Rio de Janeiro. O que a 7ª Vara e os procuradores fizeram comigo não foi feito com ninguém. Levanta os processos e você vai ver assim: ‘Fulano de tal tem um processo em que ele responde a situações de três, quatro companhias diferentes’. No meu caso não, eles fatiaram em 35 processos. E a 7ª Vara ficou a preventa do mundo. ‘Vi um problema aqui ligado ao fulaninho ligado ao Sergio’. É na 7ª Vara. E foram dividindo os processos de tal maneira que você inviabiliza a defesa. Não quero citar nome, mas pegavam um político importante do Rio, ele respondia no mesmo processo a seis circunstâncias diferentes. E 12 anos de prisão. Eu ganhei 400 anos desse cidadão.

Delação – Cara, eu vou te falar, eu fui muito torturado psicologicamente nessa coisa. Essa delação foi usada… Em 2019, eu estava absolutamente em desalento, absolutamente perdido. Já eram quase três anos de prisão. Marco Antônio, meu filho, tinha acabado de não se reeleger. Eu estava na cela quando vi o anúncio de que o Marco estava inelegível, numa sexta-feira. As eleições eram no domingo. Isso foi sacanagem. (...) Aí eu fiquei assim: “Acabou”. Prende a minha mulher, processa minha ex-mulher, pega meu irmão, pega meu filho, pega… Eu falei: “Porra, esses caras querem o quê?”. E aí eu não enxerguei que a partir daquele momento, em 2019, o Brasil entrava nas trevas, num processo de combate à institucionalidade. Então, ao final de 2019 e início de 2020, eu comecei a enxergar o que eu estava sendo ali. Eu costumava sempre falar para as minhas equipes que eles tinham que olhar a floresta, e não a árvore. Eu estava olhando a minha árvore e não estava olhando a floresta. Tem um processo institucional de desmoralização da política e das instituições. Eu fui levado a distorcer, a falar coisas que eu não queria falar. Graças a Deus o Supremo invalidou. É um assunto que eu… é um saco de areia das costas que foi jogado ao mar. Não quero falar sobre isso. Não quero falar sobre esses assuntos. Aquilo foi invalidado, tenho que respeitar a decisão da Suprema Corte e louvá-la.

Rio devastado - Olha, eu primeiro quero discordar frontalmente da tua tese de caracterizar o estado do Rio dessa maneira. O estado do Rio, no meu período, foi o maior gerador de empregos do Brasil. Chega dessa autofagia fluminense e carioca. Chega dessa definição de Rio assim. O que fiz nos meus oito anos de governo foi levantar o astral do Rio. É muito gosto para esculhambar, é muito gosto para dizer que todo mundo aqui é vagabundo, que todo mundo aqui é corrupto. O que é isso, cara?

Lula - A última vez em que eu falei com o Lula foi em 2015, quando ele me convidou para tomar uma cachaça na casa que ele estava em Portogalo (condomínio nobre em Angra dos Reis, no RJ). Quando o Pezão ganhou, ele me ligou para dar parabéns, porque ele tinha me dito que o Pezão não ia ganhar, que eu devia optar pelo Lindbergh. Eu falei que o Pezão ia ganhar, e ele ganhou. Não, não falei ainda não (com Lula depois da eleição). Mas eu gosto muito dele. É o maior presidente da história do Brasil.
Bolsonaro - Quando eu era deputado federal, eu briguei por algumas teses com o Bolsonaro. É uma coisa que ninguém sabe o que é, porque não foi divulgado. Quando eu fui preso, o Marco Antônio, meu filho, tinha gabinete no mesmo corredor que o Bolsonaro. Isso antes de o Bolsonaro disputar a Presidência. Ele [Bolsonaro] fazia questão de perguntar ao Marco Antônio como eu estava. [Bolsonaro] Dizia para mandar um abraço para mim. Poucos fizeram isso, e o Bolsonaro fez. Mas, em termos de governo, eu torci muito pelo Lula. E graças a Deus o Lula ganhou. O Lula é uma pessoa que tem espírito público. O Lula quer acertar, ele gosta do povo, tem a alma do povo. E o Lula gosta de projeto.

Pezão - O que aconteceu, no final do ano de 2014, foi um grave problema institucional com a Lava Jato, envolvendo a Petrobras e o governo federal. Além disso, houve uma maré difícil no mundo, com a recessão econômica internacional. E aí o gestor, quem está com a caneta na mão, tem que responder a partir de janeiro de 2015. Errei. Foi o maior erro político da minha vida (indicação de Pezão). Quando eu cheguei em 2014, falei: “Eu vou mostrar ao Lindbergh [Farias], que era candidato, ao [Marcelo] Freixo, que tinha lançado o Tarcísio [Motta], ao Garotinho e ao [Marcelo] Crivella que eu posso fazer o meu sucessor.

Voltar à política - Não, porque eu já ocupei os cargos mais importantes do Rio de Janeiro. Não quero ser presidente da República, não quero ser governador. Quero desenvolver a minha atividade. Eu sou jornalista, gosto de comunicação, fui gestor, fui chefe de dois Poderes durante 16 anos, fui senador da República e fui preso. Eu tenho uma vida e acredito que posso colaborar com as pessoas, com as empresas. Quero ser consultor em comunicação, em gestão. Se amanhã um partido político me contratar, como o João Santana foi contratado pelo PDT, eu irei trabalhar. Mas só se eu tiver afinidade com aquele candidato, com aquela proposta. A princípio, não quero (filiar a um partido).

Arrependimento - Claro. Claro que eu me arrependo. Claro que eu me arrependo. Eu não faria outra vez e digo para os meus filhos, que são as pessoas mais importantes da minha vida, como direi para os meus netos. Claro que eu me arrependo. Como eu disse, o financiamento público veio corrigir essa prática. Você não pode ficar nessa relação, porque ela acaba sendo promíscua. Ela acaba sendo ruim porque você altera a relação. Então é claro que eu me arrependo.

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