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Julgamento do caso Ana Paula (Foto: Genilson Pessanha)
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Julgamento do caso Ana Paula (Foto: Genilson Pessanha)
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Julgamento do caso Ana Paula (Foto: Genilson Pessanha)
Depois de quase 20 horas de julgamento, o júri popular condenou, na madrugada desta terça-feira (13), Luana Barreto Sales a 24 anos de prisão, em regime fechado, e Wermison Carlos Sigmaringa e Igor Magalhães de Souza a 13 anos anos de prisão, também em regime fechado, pelo assassinato da universitária Ana Paula Ramos, em agosto de 2017. As defesas vão recorrer da decisão. Marcelo Henrique Damasceno terá o julgamento remarcado. De acordo com o que foi apresentado no julgamento, Luana, então cunhada e amiga de infância da vítima, armou uma emboscada para Ana Paula, que foi morta a tiros na praça de Custodópolis, em Guarus. Marcelo intermediou a contratação de Wermison e Igor, que foram os executores do crime.
A pena da Luana foi majorada por culpabilidade, consequências e circunstâncias do crime. No caso do Wermison e Igor, as penas foram aumentadas pelas circunstâncias e consequências, mas tiveram atenuantes pelo fato de eles terem confessado e serem menores de 21 anos.
As primeiras das 13 testemunhas a serem inquiridas foram o titular da 146ª Delegacia de Polícia (Guarus) à época, Luis Maurício Armond, e a investigadora do caso Carolina Barbosa.
Armond falou sobre a busca de Luana por homens dispostos a “dar um susto em Ana Paula”. De acordo com ele, Luana fez buscas anteriores, mas acabou acertando por R$ 2,5 mil com os executores Igor e Wermison, após o Marcelo ter arrumado o encontro na praça de Custodópolis, ocorrido na véspera do crime.
— A reprodução foi bem detalhada, precisa. Sobre as expressões, abordagem, sobre a movimentação. Os executores colaboraram muito e se lembraram de vários detalhes enquanto a Luana não falava nada. Mas, para os executores, nunca teria sido um susto, o objetivo era a execução — afirmou o ex-delegado da 146ª DP ao promotor, acrescentando que os executores cercaram por trás e apenas a Ana Paula se assustou, enquanto a Luana ficou tranquila durante e após a ação.
Ana Paula foi baleada quatro vezes. De acordo com o delegado, quando o crime aconteceu, tinha mais indícios de execução do que latrocínio. “Ficou claro para mim a intenção de acabar com a vida da Ana Paula naquele momento”.
A investigadora Carolina lembrou que o crime foi inicialmente como latrocínio, e logo um dos autores, Igor, foi preso em flagrante. Ele foi identificado por Luana, até então a principal testemunha do crime, o que gerou o rompimento do elo entre a mandante e os executores.
— Luana inventou histórias quando contratou os dois, sobre agressões e traições, para justificar o crime. Todos os autores só ficaram sabendo da vida pregressa da vítima após o crime. Eles só executaram diante das mentiras contadas pela Luana anteriormente. Isso gerou muitos problemas com os traficantes da área em que moravam, os expondo a risco de vida. Esse foi um grande motivo de colaboração dos executores, que forneceram diversas fotos e depoimentos, que foram acrescentados ao inquérito — disse a inspetora.
Carolina também falou sobre o comportamento da Luana, antes de ser considerada suspeita. “O comportamento da Luana após o crime não apresentava nenhum choro ou sinal de descontrole emocional”, narrou ao promotor a investigadora.
Ainda segundo Carolina, Luana havia, no dia do crime, feito contato apenas com os executores, Igor e Wermison, que haviam sido salvos no contato de seu celular com nomes de mulher. Enquanto isso, ela dissimulou o comportamento de amiga e fez até selfies no dia. “A vítima mexia no celular com a cabeça abaixada, quando os dois executores chegaram atirando com dois revólveres calibre .32, que não foram recuperados”.
Duas possíveis motivações para o crime vieram à tona no depoimento do irmão da vítima e ex-marido de Luana, Paulo Roberto Ramos Filho: uma suspeita de traição que havia sido comentada por Ana Paula e o empréstimo que seria feito para o casamento da vítima.
— Ana Paula já havia comentado que havia visto o carro de Luana depois do horário no banco em que ela trabalhava em Guarus. Como eu trabalhava fora, não tinha muito controle sobre isso. Eu cheguei a comentar com Luana e ela continuou a falar que estava fazendo hora extra — contou.
Em relação à segunda hipótese, ele comentou que Luana não gostava de fazer empréstimos. Outros dois parentes dela haviam pedido empréstimos, que foram recusados de forma agressiva por ela. Mas, segundo ele, a reação de Luana depois que Paulo concedeu o empréstimo para o casamento da Ana Paula foi de ficar “quieta”. Apesar disso, gastos para alimentar sua própria vaidade eram frequentes, de acordo com o ex-marido. “Sempre foi muito consumista e vaidosa. Fazia cabelo, unhas e comprava roupas frequentemente, além de sempre pedir as viagens mais caras”.
Noivo de Ana Paula, Marcos Rafael Rangel Bessa disse que até hoje não entende qual foi o motivo do crime. “Os motivos mais ventilados após o crime foram relacionados aos horários em que o carro da Luana ficava estacionado no banco, mesmo após o fechamento das agências. Ana Paula observava esse automóvel e contou o fato para o irmão, após passar pelo local várias vezes enquanto ia para a universidade. Um possível caso extraconjugal de Luana foi comentado pela Ana Paula, mas não houve comentários dentro da família sobre confronto entre a vítima e a mandante do crime. Todos esses boatos vieram após os fatos”, contou.
Uma das amigas mais próximas, tanto da vítima quanto da ré, Fabiana dos Santos falou no depoimento que depois do crime esteve com Luana no hospital, onde compartilhou o sentimento pela amiga que havia sido baleada. Depois disso, Luana foi dormir na casa de Fabiana, mas passou em casa antes para tomar um banho, enquanto a amiga Fabiana ia pegar sua filha.
— Eu estranhei no sábado à noite foi que ela perguntou da minha filha. Aí eu a deixei em casa para ela tomar banho. Quando eu cheguei lá de novo, ela não tinha tomado banho ainda, estava no telefone. Depois, ela entrou no banho e foi comigo para dormir na minha casa. Eu achei estranho a questão da vaidade, da roupa e maquiagem que ela colocou naquela noite, logo após o crime. Mesmo como mulher, eu achei que foi demais. Num momento de dor, esses detalhes ficam em segundo plano — disse Fabiana, que se emocionou durante o depoimento e ao lembrar que era muito amiga das duas.
Ainda de acordo com a amiga, durante o resgate, logo após os disparos acertarem Ana Paula, Luana não queria que ninguém mexesse na vítima para fazer o socorro. A ré queria que a população que cercava a cena esperasse a ambulância, mas os populares não aguentaram e fizeram o resgate.
— Ela também não quis entregar o celular para a inspetora na delegacia. Ela não queria entregar e falou que os policiais não tinham direito em mexer no aparelho, que, apesar de tudo, ficou com os agentes — afirmou Fabiana, que também trouxe à tona uma Luana muito nervosa antes de ir para a delegacia identificar os suspeitos.
A testemunha levantou dúvidas sobre o caso do carro parado na agência bancária. “Não é a Luana que eu conheço”, mas como também é bancária, disse que é estranho o carro ficar parado tão frequentemente no banco e também o fato de Luana alegar tantas vezes fazer hora extra.
A também bancária Laryssa Ramos foi mais uma testemunha ouvida e contou que o expediente no banco que Luana e ela trabalhavam variava de acordo com o movimento do dia, mas raramente passava das 18h.
— Até fazemos hora extra com frequência, mas sempre saímos juntos, entre 17h e 18h. Nós todos que éramos caixas fazíamos, mas não até tão tarde. O acréscimo era muito e o salário pulava de R$ 2,5 mil para R$ 4 mil — comentou a caixa, que até hoje trabalha na mesma empresa.
Sobre a suposta traição de Luana como motivo para o crime, a colega de trabalho falou que não havia suspeitas dentro da empresa sobre qualquer relacionamento dentro do banco.
Por volta das 19h30, após todas as testemunhas serem ouvidas, os réus foram chamados. O primeiro réu a depor foi Igor Magalhães de Souza, de 23 anos, que respondeu que estava armado, efetuou acidentalmente dois disparos contra a vítima e fez parte do crime.
Ele revelou que Luana falou que Ana Paula estava maltratando uma criança de 3 anos de idade. Segundo ele, Luana pediu para matar Ana Paula e pagou R$ 2,5 mil. Ela teria dado R$ 2 mil antes do crime. No depoimento, ele disse que Marcelo passou o contato e falou que ela estava querendo dar um susto na vítima.
— Não voltei a falar com o Marcelo. Estive com a Luana e conversei uma vez presencialmente e algumas vezes pelo telefone. Marcelo não estava presente. Eu não conhecia a vítima. Luana falou que levaria a vítima até o local e nós chegamos lá de bicicleta. Depois dos disparos, fomos para dentro do mato e não tivemos mais contato com a Luana. Descobrimos depois que o motivo foi inventado e começamos a colaborar com a Justiça. Eu tinha um filho e a história de estarem mantendo uma criança em cárcere privado me deixou muito revoltado. Depois que eu descobri que era mentira fiquei mais revoltado ainda. Eu fui preso na casa do meu sogro, perto do local onde aconteceu. No primeiro dia eu fiquei quieto e vimos que tudo era uma armação dela, então, começamos a colaborar. Já fui preso como usuário de drogas. Já conhecia o Marcelo do futebol, e eu já era amigo do Wermison — falou.
Igor disse que quem contou tudo sobre o crime foi Luana, que eles só foram apresentados pelo Marcelo. O réu entrou em contradição sobre a presença do Marcelo na reunião ocorrida na praça de Custodópolis, um dia antes do crime. Ele negou a presença do Marcelo, que havia confirmado na época das reproduções.
— Talvez eu tenha muita pressão na minha mente, mas só estava eu e o Wermison. Pode ter sido um engano. Nós chegamos a comentar que na pracinha do Vigário tinha muita movimentação e precisávamos ir para outro local. Luana falou que iria levar ela para lá. Eu cheguei lá de bicicleta, uma estava conversando com a outra, cheguei e aconteceu essa tragédia. Chegamos eu e o Wermison juntos e enquadramos. A moça que nos contratou ficou agindo como se não soubesse o que estava acontecendo. Ana Paula veio correndo na minha direção e a arma acabou disparando acidentalmente. Minha intenção era só dar um susto e um golpe nela — ressaltou Igor. — Talvez a menina que viu a movimentação da pracinha possa ter confundido as pessoas envolvidas, mas o Marcelo não estava lá, complementou.
Ele foi questionado sobre o disparo acidental diante dos três tiros no tórax de Ana Paula e do que atingiu a parte de trás da sua cabeça. “Eu disparei na hora do nervosismo e na hora do desespero. Meu dedo estava no gatilho e acabou acontecendo essa tragédia. Eu não acompanhei os tiros do Wermison, porque já caí na bicicleta pedalando. Não me recordo sobre quem deu a volta e quem abordou as vítimas. Não me lembro se Ana Paula estava caída ou em pé quando Wermison atirou — contou em depoimento.
Na delegacia, Igor teria afirmado que descarregou o revólver na vítima e que Marcelo iria receber o celular que seria roubado da vítima.
O réu disse, ainda, que os advogados de Luana ofereceram dinheiro para ela não ser envolvida. “Luana pediu para o advogado vir na direção da gente e deixar o nome dela de fora. Não me mostraram fotografia dos advogados e não me lembro do valor, mas foi mais de uma vez que me ofereceram isso no presídio”, disse.
Ainda durante o depoimento, Igor falou que vendeu o revólver depois do crime, horas antes de ser preso. Na delegacia, ele falou que dispensou a arma em uma mata durante a fuga. Sobre o dinheiro recebido pelo crime, Igor falou: “Compramos algumas coisas com os R$ 2 mil. Foi tudo ‘gastado’, mas não sei com o que não”.
Em relação ao contato com Luana, Igor disse que manteve antes da execução, mas que não lembra se houve depois. “Não fui pressionado a mudar minha versão”. Segundo ele, a versão do depoimento não foi combinada, já que os réus estão em presídios separados.
Segundo réu a depor, Wermison Carlos Ribeiro, também de 23 anos, falou como foi a primeira conversa sobre o crime. “Estávamos numa quadra de futebol e o Marcelo estava recebendo mensagens e ligações de uma menina. Nós perguntamos o que foi e nós oferecemos para dar o susto. Ele passou nosso contato e o resto foi tratado com a Luana. Eu não tinha praticado nenhum crime antes”, disse Wermison. Em depoimento, Wermison também negou a presença de Marcelo em um encontro com Luana.
— Um dia antes do crime, fomos encontrar com a Luana, mas o Marcelo não estava presente — declarou.
O promotor questionou o réu com depoimentos anteriores e também com a reconstituição, quando falaram que o Marcelo estava presente na reunião na praça de Custodópolis.
O réu também falou sobre como ocorreu o crime. “Quando chegamos, Luana já estava com o envelope em mãos. Eu peguei, a vítima assustou e correu para o Igor, que disparou. Já com o envelope em mãos e com a menina no chão, disparei novamente contra ela. Me desfiz da arma e me arrependi, que me fez colaborar com as autoridades”.
Sobre a motivação, ele também afirmou que Luana falou que a vítima não era da cidade, que estava na casa da tia e maltratando uma criança. Ela teria dito para eles que a Ana Paula estava aqui para estudar.
“Inicialmente, ela falou em susto com o Marcelo. Mas na hora do encontro da praça de Custódopolis, ela pediu para matar”, contou o réu.
Ao ser chamada, Luana respondeu apenas ao juiz e negou ser a mandante do crime.
Expectativa — Ao chegar ao Fórum Maria Tereza Gusmão, em Campos, na manhã desta segunda-feira, a família de Ana Paula Ramos disse esperar que a justiça seja feita. “Não vai trazer nossa filha de volta e esse crime destruiu nossa família, pois a Luana (Barreto Sales) era minha nora, pessoa de confiança dentro da nossa família”, comentou Paulo Roberto Ramos, pai de Ana Paula.
— Estou ao mesmo tempo alegre e triste com o julgamento. Mas acredito que o que vai ser feito aqui é a justiça e prometi à minha filha que iria ficar até o fim. Eu espero justiça e acredito na Justiça — contou a mãe de Ana Paula, Ana Márcia Ramos.