É preciso deixar a Lei de Segurança Nacional no passado
- Atualizado em 04/02/2021 22:08
Foto: Anderson Riedel/PR
Foto: Anderson Riedel/PR
Segundo reportagem publicada no jornal O Estado de São Paulo, entre janeiro de 2019 e junho de 2020 foram instaurados 30 inquéritos com base na Lei de Segurança Nacional (LSN). Um número recorde para período tão curto de governo. Nas administrações de Fernando Henrique Cardoso, Lula, Dilma e Temer também foram instaurados procedimentos com base na mesma legislação, mas em números menores, 11, 29, 26 e 14 respectivamente.
Outros países também dispõem de legislação específica para os crimes cometidos contra o Estado de Direito e o regime democrático, como por exemplo os EUA, com seu Patriotic Act de 2001. Porém, dentre as principais democracias do mundo, somente a legislação brasileira inclui dentre os crimes contra a democracia, a soberania nacional e as instituições, os crimes contra a honra do presidente da República.
E isso tem possibilitado que diversas pessoas como jornalistas, políticos e ativistas sejam indiciadas com fundamento na LSN. Por prever penas duras de até 30 anos para aqueles que cometem os crimes elencados na lei, essa tem sido uma ferramenta muito utilizada com o objetivo de intimidar os críticos do governo. O que parece ter sido o caso do cartunista Renato Aroeira. Em junho de 2020, o ministro da Justiça André Mendonça determinou que a Polícia Federal instaurasse inquérito com base na LSN para apurar suposto crime cometido pelo cartunista devido a uma charge que associava o presidente Bolsonaro à suástica nazista.
Em outro episódio parecido, o mesmo André Mendonça também determinou a instauração de inquérito em razão de declarações feitas por Marcelo Feller durante um programa de televisão. Advogado, Feller chamou o presidente de genocida por sua atuação durante a pandemia e pela forma como vinha desestimulando os cuidados indicados por especialistas. Porém, o caso que teve a maior repercussão foi o pedido feito para que o Ministro do STF Gilmar Mendes também fosse investigado com base na LSN. Ao afirmar que o exército brasileiro estava se associando a um genocídio, Gilmar também se tronou alvo de integrantes do poder executivo.
Sancionada em 1983, a LSN está defasada e é incompatível com a ordem democrática estabelecida desde a Constituição de 1988. Está claro que há um abuso no uso da Lei como forma de intimidação. Mesmo que sejam raros os casos em que os inquéritos instaurados subsidiem denúncias criminais, isso pouco importa, pois a finalidade parece não ser a busca de uma condenação e sim a simples intimidação de vozes críticas.
Interessante esse tipo de ação liderado por alguém que falou o que quis e nunca sofreu esse tipo de intimidação. Bolsonaro nunca foi investigado com base na LSN, mesmo quando afirmou que o presidente Fernando Henrique Cardoso deveria ser fuzilado por promover a privatização de empresas públicas. Mas parece que o governo atual tem se notabilizado por defender algo e fazer completamente o oposto.
O que não deve ser aceito é o uso da LSN como forma de intimidação. Isso fere de morte um dos mais importantes princípios democráticos, a liberdade de expressão e se o presidente de alguma forma se sentir ofendido, que utilize o artigo 139 do Código Penal, que trata justamente dos crimes contra a honra. Está na hora de deixar a LSN no passado.

ÚLTIMAS NOTÍCIAS

    Sobre o autor

    Roberto Uchôa

    [email protected]