Ingrid Silva
08/03/2025 08:14 - Atualizado em 08/03/2025 08:36
De promotora de Justiça do MPRJ, delegadas titulares e primeira diretora de universidade em Campos, a história continua
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Montagem: Ingrid Silva
Em mais um Dia Internacional da Mulher lembrado neste sábado, 8 de março, é necessário, para além de todas as lutas, obstáculos e preconceitos vividos especificamente por conta do gênero, celebrar também as conquistas e lugares de destaque em que atualmente é possível chegar. Neste dia, Campos tem exemplos de mulheres em destaque em segmentos importantes de luta e trabalhos prestados.
“Inspirada por tantas conquistas, penso que a superação dos atuais obstáculos é tão somente uma questão de paciência e persistência, características especialmente abundantes no universo feminino”, disse a promotora de Justiça há 20 anos na área de Infância e Juventude, Anik Rebello Assed, que relembrou de protagonistas mulheres e históricas que deram a vitória de adquirir direitos como o de votar aos 18 anos, concluir uma faculdade e participar de um concurso público em igualdade de condições com os homens. Um caso também de conquista foi em Campos onde, depois de tanto tempo, foi possível ver uma mulher como diretora da Universidade Federal Fluminense (UFF) do município pela primeira vez na história. Ana Costa assumiu o cargo em 2021, abrindo o leque de possibilidades e aumentando mais ainda a lista de mulheres que servirão de inspiração para tantas outras.
“Nesses anos todos de muito trabalho, de muita dedicação, a gente vem trabalhando, discutindo sobre a importância das mulheres estarem ocupando espaços não só de debate, espaços na pesquisa, na extensão, no ensino, mas também na gestão, espaços de decisões (…) O quanto que a gente vem ocupando espaços que, até muito pouco tempo, a gente nem pensava em poder assumir. Então, não é porque quem está no poder é bonzinho, é pela nossa força, pela nossa luta, pela nossa busca incansável. O nosso esforço é muito maior para que o outro veja. Então, não é fácil, mas eu diria que é possível e que é desafiante e que abriu os caminhos para que outras possam estar ocupando os mesmos espaços e não deixando que essas trajetórias se interrompam”, explica Ana, que ressaltou já ter participado de outras gestões, mas que agora, depois de décadas, conseguiu o cargo de diretora com muito trabalho e também coletivo.
Na tarde dessa sexta-feira (7), a Prefeitura de Campos, através da Subsecretaria de Políticas Públicas para Mulheres, realizou um ato em prol do dia. A ação, em parceria do Lions Clube Campos Tamandaré com a Governadora Neide Otoni Distrito LC11, lembrou sobre o assédio, com o slogan “Não é não”, utilizado também no Carnaval.
Ato do Dia Internacional da Mulher na frente da Ceam, em Campos
Ato do Dia Internacional da Mulher na frente da Ceam, em Campos
E, para quem vive a experiência de luta contra a violência contra a mulher todos os dias com o cargo de delegada titular na sede da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (Deam), Juliana Oliveira falou sobre a demanda emocional que o trabalho exige, além de ressaltar sobre se sentir lisonjeada de ocupar um cargo de tanta representatividade para essas mulheres.
“Eu me sinto muito lisonjeada de ocupar esse cargo hoje, um cargo que tem uma representatividade muito grande para as mulheres de uma forma geral, especialmente à frente de uma delegacia especializada de atendimento à mulher. É muito importante a gente encontrar essa representatividade em pessoas que efetivamente acreditem que podem contribuir de alguma forma para a diminuição da desigualdade, pra diminuição do machismo, que é estrutural da nossa sociedade. Essa sociedade que ainda é muito patriarcal”, lembra Juliana, que ressaltou ainda sobre a sociedade tentar buscar, de alguma maneira, justificar a conduta criminosa dos homens. Ela, que é delegada há mais de 16 anos e está na frente da Deam Campos há um ano, falou também sobre a necessidade de fazer os homens respeitarem e entenderem os direitos que as mulheres possuem, além da importância de tentar mudar a mentalidade deles quanto a isso.
Tanto Juliana quanto Carla Tavares, atualmente titular da 134ª Delegacia de Polícia (Centro de Campos), não tiveram dificuldades nos anos de delegadas para conseguir impor o respeito pelos colegas de profissão, predominantemente composta por homens (principalmente na liderança). Mas Carla, delegada há 20 anos e que também já atuou em duas Deams (Cabo Frio e São Gonçalo), ao lembrar de seu passado, falou que não pensava nos obstáculos, mas no que precisava fazer para transpô-los.
“Sou de uma família pobre, sempre estudei em colégio público e desde muito cedo entendi que o estudo era a única forma de conquistar as coisas que eu almejava. Sempre estudei muito para estar à altura das missões que me foram confiadas na Polícia Civil. Nunca pensei nos obstáculos, mas no que eu precisava fazer para transpor esses obstáculos. Mas a maternidade, que para muitas mulheres, e para mim também, é um momento maravilhoso, algumas vezes nos é apresentada como um empecilho para ocuparmos algumas posições, pois acreditam que nem sempre é possível conciliar o cargo com a maternidade, o que eu garanto que não é verdade. Sempre fiz isso e consegui desempenhar bem os dois papéis, mãe e profissional”, explica a delegada, que ressaltou ainda sobre seus maiores exemplos serem a mãe e a avó, que a incentivaram a ser independente, a estudar e a ter um emprego antes de qualquer coisa.
A promotora Anik Rebello, também idealizadora de diversos projetos na área da defesa dos direitos das crianças e adolescentes, falou sobre o trabalho empenhado junto ao MPRJ e a importância dele para a sociedade, assim como para ela enquanto mulher, ressaltando também sobre a batalha por respeito.
“Vejo a tarefa com a importância inerente à grande responsabilidade que envolve a defesa dos direitos de tantas crianças e adolescentes inseridas em lares que, muitas vezes, repetem o ciclo de violência doméstica por várias gerações. Infelizmente ainda é grande o número de meninas que replicam comportamentos de dependência emocional e financeira da figura masculina que historicamente ainda marca tantas mulheres! Além da sobrecarga da jornada dupla de atividades laborativas e domésticas, a batalha silenciosa por respeito ainda é um longo caminho a ser percorrido pelas mulheres das próximas gerações! Poder contribuir com o meu trabalho para, de alguma forma, interromper ciclos geracionais de violência é, para mim, mais que um dever: uma honra!”, relata Anik, lembrando ainda sobre o exemplo da mãe e das avós que, mesmo distante dos holofotes e no silêncio de seus lares, ensinaram a ela que a grandeza feminina reside “na sabedoria de usar a força interior para libertar o seu próprio "vôo" e movimentar, infinitamente, o ciclo de libertação das futuras gerações”.
Violência contra a mulher segue aumentando no município
De acordo com dados atualizados da Deam de Campos, houve um aumento de 75 Medidas Protetivas de Urgência (MPUs) em relação ao ano passado até o dia 7 de março. Neste ano, já foram registradas 378 MPUs, enquanto no ano passado até o mesmo dia, foram 303. Em relação às ocorrências registradas na sede especializada, foram 662 registros até o dia 7 deste ano, enquanto no ano passado foram 570 no mesmo período.
E é importante ressaltar que não é apenas em casos conjugais que os registros acontecem. Um dos últimos registros feitos pela Folha da Manhã de tentativa de feminicídio envolveu a prisão de um homem de 59 anos, que foi detido no dia 1º fevereiro deste ano ao agredir a própria irmã com golpes de facão após uma discussão no bairro Ponta da Lama, em Campos. A vítima foi socorrida por um casal e encaminhada ao Hospital Ferreira Machado. Outros casos também chocam o município e até mesmo o Brasil, como o Caso Letycia, que completou 2 anos no último domingo e terá julgamento em maio deste ano. A família de Letycia Peixoto segue aguardando justiça, assim como diversas outras.