Arthur Soffiati - As mudanças climática e o cotidiano regional
Arthur Soffiati - Atualizado em 19/08/2021 18:50
A cada relatório do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), o mundo é informado de que as condições climáticas do Holoceno, época geológica em que vivemos, pioram. O novo momento, anômalo sob vários aspectos, está sendo considerado o novo normal, o Antropoceno ou Capitaloceno, conceitos muito apressados. Promove-se, então, uma conferência internacional em que cada país se compromete a reduzir suas emissões de gases e mudar a matriz energética. Vem, então, mais um relatório mostrando que a situação piorou. Foi o que o atual, divulgado em agosto de 2021, demonstrou.
Como parte do mundo, as regiões Norte e Noroeste Fluminenses tanto contribuíram para essas mudanças climáticas como sofrem as suas consequências. Essa contribuição não cessou. Para os habitantes de ambas regiões, tanto na cidade como no campo, parece que elas — as regiões — encontram-se fora do planeta. As manifestações das mudanças climáticas não nos atingem. Elas estão presentes no nosso dia a dia, mas as vemos como problemas exclusivamente regionais, sem relações com o mundo. Passemos em revista algumas delas, das mais simples às mais complexas.
1 - Altas temperaturas: embora o verão passado tenha sido relativamente ameno, as temperaturas têm aumentado progressivamente durante os verões no Norte-Noroeste Fluminense. As queimadas continuam sendo praticadas e costumam sair do controle dos incendiários, ressecando mais ainda o ambiente.
2 - Baixas temperaturas: o inverno de 2021 surpreendeu muita gente. As ondas de frio provenientes do sul levaram as pessoas a notar que o frio, em 2021, foi mais severo que nos anos anteriores. Nas redes sociais, muitas mensagens de reclamação são postadas como se fosse um fenômeno natural. Tudo indica que os invernos vão se tornar mais frios.
3 - Secas: o ressecamento do ambiente é percebido, principalmente, pelos produtores rurais. Eles precisam de água, mas não relacionam suas práticas agropecuárias com a secura que os afeta. Em momento nenhum eles relacionam suas práticas a mudanças climáticas. Ao contrário, continuam adotando posturas ideológicas antigas que repudiam a ciência, os cientistas e aqueles que acreditam na ciência e nos cientistas. Incluem-se aqui também os pesquisadores que trabalham direta ou indiretamente para os ruralistas.
4 - Enchentes: Os fenômenos decorrentes de grandes volumes de chuva não são tão longos e progressivos quanto as secas. Estas, sim, são progressivas e estão transformando o clima regional em semiárido. As chuvas torrenciais devem ser creditadas às mudanças climáticas. Elas não se manifestam apenas na Europa, China, no Japão etc. Podemos e devemos incluir o Norte-Noroeste Fluminense nesse etc.
5 - Ressacas: o nível relativo do mar está se elevando com a expansão da água pelo aquecimento e com o derretimento de calotas de gelo. Esse fenômeno já aconteceu em passado geológico recente. Os continentes eram mais amplos em torno de 20 mil anos passados. Um aquecimento natural do planeta provocou o derretimento de geleiras, elevando o nível dos mares. As águas invadiram as zonas costeiras continentais. Na região Norte Fluminense, o mar chegou perto da lagoa de Cima. As ressacas são uma das manifestações das mudanças climáticas. Elas estão castigando a costa regional entre Macaé a Marataízes. Em alguns pontos, elas são mais críticas, como em Farol de São Thomé, Atafona e Guaxindiba.
6 - Erosão da costa: mas não apenas as ressacas levam o mar a avançar sobre áreas construídas. Há outras manifestações que são interpretadas como pontuais e até como perfídia da natureza. O mar avança lentamente e destrói casas. O mar forma dunas. O mar reduz áreas antes ocupadas. Atafona é um excelente exemplo. Há 50 anos, pelo menos, ela está nos alertando quanto às mudanças climáticas, mas não estamos sabendo interpretar seus avisos. Não adiantam remoção de dunas e construção de praia artificial.
7 - Rios: o regime hídrico das regiões Norte e Noroeste Fluminenses mudou, como em todo o mundo. A responsabilidade por tal mudança é da economia de mercado, tanto por baixo quanto por cima. Durante a maior parte do ano, o volume dos rios fica aquém do desejado. Esta redução decorre do desmatamento, do assoreamento e das barragens, mas é também o resultado de irregularidades na distribuição de chuvas.
8 - Salinização dos solos e da água doce: parece exagero creditar a salinização de terras e rios, sobretudo nos desaguadouros e nas planícies, às mudanças climáticas. Lembremos que a planície fluviomarinha em que Campos, São João da Barra e Macaé (este em parte) se ergueram formou-se nos últimos 2.500 anos. Com a redução do volume dos rios e com a elevação relativa do nível do mar, a água salgada avança pelos rios em seus trechos finais e penetra no lençol freático. O fenômeno vem sendo notado no delta do Paraíba do Sul e na baixada dos Goytacazes. Trata-se da quebra do equilíbrio de forças decorrente das mudanças climáticas: rio que desce e mar que sobe.
9 - Prejuízos: deixo este item por conta daqueles que o sofrem.

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