Apreensão do Celular do Presidente da República na Avaliação do Jurista José Eduardo Pessanha Abrindo a Boca para Marco Barcelos.
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 

01- José Eduardo, como jurista, qual sua análise sobre o Ministro do STF, Celso de Mello em cogitar requisitar o celular do Presidente da República, para averiguar possível cometimento de crime?

R.: Prezado amigo Marco Antônio, curial esclarecer, ao contrário do que afirma este “exército oficial de desinformação”, que o ministro decano Celso de Mello não determinou a apreensão do celular do presidente Jair Bolsonaro. Como bem delineado na sua pergunta, está sendo cogitado e, para que se materialize, é necessário que o Órgão de acusação, no caso a Procuradoria Geral da República (PGR) analise se tal diligência é importante (ou mesmo essencial) para o deslinde das investigações, como requerido por Partidos Políticos à Corte Suprema.
É óbvio que em um processo desta monta, que investiga se o presidente Jair Bolsonaro tentou interferir na Polícia Federal a fim de evitar a investigação de familiares, todas as provas devem ser colacionadas com máxima precaução, a fim de que o Inquérito 4.831/DF possa ter regular prosseguimento.
Do aspecto técnico-jurídico, tal medida – apreensão de aparelho celular – é usual nos inquéritos em curso, eis que se trata de efetivo elemento de colheita de prova. Óbvio que ao se tratar do aparelho de telefone do chefe do Executivo, certamente razões de maior alicerce devem ser apresentadas, não bastando mera conjectura ou mesmo provas circunstanciais. Neste contexto, acredito que o Sr. Procurador Geral da República irá requerer novas diligências e providências, antes de entender pela necessidade de tal diligência complexa, a fim de evitar recrudescimento desnecessário nas relações interpoderes.


02- Quais os embasamentos jurídicos para acusar um Presidente da República?

R.: O Presidente da República pode ser punido nos crime de responsabilidade e crimes comuns praticado no exercício do cargo de Chefe do Poder Executivo, onde tal responsabilização advêm do interesse da Coisa Pública sobre qualquer outro interesse derivante.
Nos crimes de responsabilidade (infrações político-administrativas) cometidas no desempenho da função, circunscreve-se a condutas que atentam contra a Constituição e, especialmente, contra a existência da União, o livre exercício dos Poderes do Estado, a segurança interna do País, a probidade da Administração, a lei orçamentária, o exercício dos direitos políticos, individuais e sociais e o cumprimento das leis e das decisões judiciais, como previsto na CRFB/88, em seu art. 85º.
Já nos delitos relativos à prática de crime comum, o processamento dar-se-á nos termos da Lei nº 8.038/90 e dos arts. 230 a 246 do RISTF. Em ambos casos, haverá um controle político de autorização, a ser realizado pela Câmara dos Deputados, que autorizará ou não o recebimento da denúncia ou queixa-crime pelo Supremo Tribunal Federal. Quanto ao julgamento, nos crimes de responsabilidade, o mesmo se dará perante o Senado Federal, sendo que nos crimes comuns, admitida a denúncia, o julgamento será pelo STF. Estes são os fundamentos jurídicos de uma acusação em face do Presidente da República.


03- Quais os prejuízos jurídicos que poderiam advir aos três Poderes tal conduta do Ministro do STF, Celso de Mello?

R.: Entendo que sua pergunta está adstrita a eventual apreensão do celular do Presidente da Republica, até porque, lamentavelmente, processo contra Presidentes da República deixaram de ser raros em nossa sofrida Nação. Neste contexto, verifica-se, até pela “ameaça” clara realizada pelo Chefe do GSI (Gabinete de Segurança Institucional), um General da Reserva, talvez maculando sua ficha funcional, que a citada possível apreensão elevaria a volumes exorbitantes o dissenso já existente entre os poderes, notadamente porque o Executivo revela-se centralizador, aético e impositor, enquanto que o Judiciário tem tentado apresentar uma postura pseudodemocrática, mas corporativista, oligárquico e soberbo, sendo que o Congresso, como de costume, prefere ater-se ao “jogo do poder”, buscando a permanência em seu “status quo” e interesses nebulosos. Refém deste imbróglio está o Povo, vítima, mas também culpado de todo o presente que nos assola.

04- José Eduardo, em um momento de Pandemia, certamente o mais difícil que nossa geração está atravessando e que vai afetar futuras gerações, qual sua opinião jurídica e como cidadão, para um futuro digno e merecedor de um povo guerreiro e sofrido como o povo brasileiro?

R.: Prezado Marco Antônio, peço vénia para citar o filósofo francês Joseph-Marie Maistre: “cada povo tem o governo que merece”. Ora, a pandemia é uma prova global, imposta a todos num cenário de hecatombe, porem porque já somos o segundo País do Mundo em efeitos da peste? Outros tanto Países possuem população maior ou similar a nossa; porque sofremos tanto? Certamente é fruto do nosso desaparelhamento técnico, de nossas prioridades equivocadas e de nossas escolhas torpes. Os efeitos jurídicos da pandemia se darão, de uma forma maior, após o pico da pandemia, quando o Poder Judiciário enfrentará uma enxurrada de ações visando proteção de direitos e disputas indenizatórias. Porem como cidadão, aos que passarem por esta etapa de sofrimento, quiçá reste o ensinamento de que os últimos 520 anos em nada nos prepararam, seja materialmente, seja como contexto ético, para um enfrentamento desta espécie. De fato, temos um povo sofrido (guerreiro nem tanto!), mas que detêm uma nuance masoquista e que prefere se regalar em detalhes e usar antolhos para a ausência de caráter de muitos dos nossos governantes. Assim, como parte do Povo que sou, minha opinião é que Joseph-Marie Maistre estava absolutamente correto.

05 – Quais suas considerações finais sobre o atual cenário político-social?

R.: Estimado amigo, peço vênia para iniciar uma breve e humilde análise pelo cenário local, me estendendo ao Estado e, por fim, a União. Em nossa pacata Campos dos Goytacazes, tivemos a conjunção de muitos fatores: um Município falido por desmandos anteriores; a carência de arrecadação própria por ausência de incentivo ao crescimento industrial; a queda de arrecadação brutal dos royalties do petróleo; uma equipe jovem com pouca experiência à frente do Governo; uma das piores pestes do Planeta de todos os tempos e disputas políticas acima dos interesses municipais. Tudo isso leva a um resultado previsível (e não poderia ser outro): caos! É inegável as intenções probas do chefe do Executivo local, mas é certo que sem logística; sem um numeroso apoio político-administrativo; sem recursos financeiros, experiência, insumos, é crível que se chegue a um resultado longe do esperado. No contexto estadual, passada a fase das bravatas eleitorais, onde o Governador eleito, como todos, prometeu o que sequer sabia como alcançar, vem agora a “prova de fogo”, onde o Estado sequer consegue montar hospitais de campanha (coisa já realizada em quase todos os Estados da Federação) devido a ganância de muitos que detêm o poder e a ordenação de despesas. Enfim, quanto ao Estado, ainda não disseram a que vieram, pois o pouco que fizeram foi com a verba que deixaram de pagar os devidos empréstimos ao Governo federal.
Por fim, como a “cereja do bolo”, temos a União, acéfala quanto aos problemas de relevo nacional porque conduzida de forma infanto-juvenil por alguém que somente está preocupado em ser reeleito, manter sua oligarquia, favorecer seus adjuntos e tecer bravatas em rede nacional. Creio que esta breve e acanhada análise, totalmente pessoal, espelha, em meu entender, a “areia movediça” em que nos encontramos. Um cordial abraço.

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    Marco Barcelos

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