Nelson Lellis: "Tassiana se tornaria porta-voz"
Aluysio Abreu Barbosa, Cláudio Nogueira, Aluysio Abreu Barbosa, Cláudio Nogueira, Gabriel Torres e Hevertton Luna - Atualizado em 08/10/2025 07:48
Nelson Lellis
Nelson Lellis / Reprodução
“Evitar a eleição de 2026 é não arriscar um desgaste ou uma derrota que poderia comprometer o cenário da eleição municipal de 2028. Então, fazer uma manutenção da máquina, no sentido de permanecer na prefeitura, garantiria o controle dessa máquina administrativa”. Foi o que disse o professor da Uenf, Nelson Lellis, entrevistado desta terça-feira (7) no programa Folha no Ar, da rádio Folha FM 98,3. Doutor em Sociologia Política, ele falou sobre o tabuleiro eleitoral de Campos para o próximo ano, além de analisar os cenários para a disputa estadual e nacional. Por fim, refletiu sobre a influência do voto religioso nas eleições.
Wladimir Garotinho – “Evitar a eleição de 2026 é não arriscar um desgaste ou uma derrota que poderia comprometer o cenário da eleição municipal de 2028. Então, fazer uma manutenção da máquina, no sentido de permanecer na prefeitura, garantiria o controle dessa máquina administrativa, o controle dos recursos, que seriam essenciais para poder manter o grupo político dele coeso para poder fortalecer os aliados que vão disputar os cargos no ano que vem.”

Tassiana a federal – “Tem a questão do lançamento da pré-candidatura familiar, a Tassiana Oliveira, do PL, a deputada federal. É uma tática regional comum para poder manter, nesse caso, uma certa influência da família na política e sobretudo no Congresso. Também para poder canalizar o voto da base. Na minha visão, a Tassiana se tornaria uma certa porta-voz da Prefeitura de Campos em Brasília. Isso vai garantir o quê? Os recursos, visibilidade desse grupo político na cidade de Campos. Enfim, eu penso que essa questão é fundamental para a família Garotinho.”

Rodrigo Bacellar – “Se o Bacellar busca o governo, ele vai ter que dispersar o apoio a nível estadual. Em Campos, isso poderia liberar o grupo dele para poder apoiar outros candidatos para a Alerj. Você tem a Carla Machado, Thiago Tangel, focando em construir uma base mais ampla para o governo. A decisão do Bacellar pode demonstrar a questão de uma busca pelo poder do governo do Estado ou, por outro lado, TCE.”

Flávio Bolsonaro – “Flávio Bolsonaro parece ser aquilo que é chamado de uma espécie de antagonista necessário para o Eduardo Paes. Vamos começar falando, por exemplo, sobre o sujeito que tem a máquina na mão. Eduardo Paes tem uma máquina na mão, tem um histórico já no estado do Rio de Janeiro enquanto prefeito. Por outro lado, você tem uma marca, do nome Bolsonaro. Isso é uma questão importante. É muito interessante a gente falar sobre a marca porque, por exemplo, Bolsonaro não é apenas Bolsonaro. Ele é a reverberação de um movimento. Ele deu voz a um movimento. De tal maneira que, quando Bolsonaro se for, o bolsonarismo permanecerá, ainda que com outro nome.”

Voto ideológico – “O Flávio Bolsonaro, a pujança dele na pesquisa, os números que estão favoráveis a ele, estão identificando o que para a gente? Que ainda há um voto ideológico bolsonarista muito coeso no estado do Rio de Janeiro para o Senado. Então, você tem um engajamento muito alto, ideológico. Mas, por outro lado, no estado do Rio de Janeiro, esse é um ponto de alerta, pouco sensível para fatores conjunturais. E essa pouca sensibilidade para fatores conjunturais vai garantir para o Flávio a posição de favorito absoluto para a primeira vaga ao Senado no Rio de Janeiro.”

Eduardo Paes – “Você tem um destaque do Eduardo Paes em um domínio eleitoral na região metropolitana. Eduardo Paes carrega esse peso histórico. Eu entendo que ele é um candidato mais aceitável, digamos assim, no estado do Rio de Janeiro, por conta de ser marcado por uma polarização. E também por uma crise de segurança, uma crise de gestão. Então, isso demonstra uma possibilidade dele agora assumir o controle do Estado a fim de realizar questões que agora ele pode no governo.”

Favoritismo – “Nós temos a questão do voto cristalizado. A liderança na pesquisa, onde o eleitor está falando um nome sem ser estimulado, na pesquisa espontânea, demonstra que o Paes já está cristalizado na mente de parte do eleitorado por conta desses elementos. É a intenção de voto mais sólida, digamos assim, menos volátil. E aí você tem a inexistência de um antagonista de centro. O fato de Paes liderar, por exemplo, sobre nomes como Washington Reis, do MDB, Rodrigo Bacellar, que estão representando uma espécie de centrão fluminense.”

Voto útil ao Senado – “Você tem um voto mais moderado, de centro-direita mais espesso, no Washington Reis, Crivella, pensando no Molon, enfim, tem uma intenção de voto relevante, mas não é suficiente para poder trabalhar com um empate técnico. Voto útil, a gente poderia dizer que os eleitores do Molon podem migrar para Benedita. Os eleitores do Washington Reis, do Crivella, podem migrar para o Cláudio Castro, para poder reforçar sobretudo esse confronto um tanto quanto bipolar pelo segundo lugar.”

Voto religioso em Lula – “Há pesquisadores que dirão, por exemplo, as pessoas não estão votando no Lula por ele ser quem é. Estão votando nele por essas pautas serem agora retomadas, com maior pujança. Ou seja, esses elementos todos que eu trouxe aqui no início podem ser elementos categóricos para a sua retomada nas eleições. Até porque isso tem sido, de certa forma, experienciado na sociedade brasileira.”

Internacionalização – “Considero que o início do governo Lula, agora, há uma tentativa maior de internacionalização. Até por conta do caso que reverberou do Lula a partir, obviamente, da sua prisão e depois da sua soltura. Que tem outros personagens ligados a isso, como o Dallagnol, o Sérgio Moro e, sobretudo, o Bolsonaro. Há uma internacionalização do Lula ainda mais forte neste último governo. Lula, com o seu discurso atualmente, se transforma num líder mundial. Isso é um fato. Talvez essa ausência no início do governo Lula e ainda uma reverberação por conta da condenação ou não do STF a Bolsonaro, isso e também por conta de alguns preços, inflação, isso tenha levado uma certa crítica ao governo Lula nas primeiras pesquisas.”

Protestos – “A chamada PEC da blindagem. Olha o que aconteceu na sociedade? Olha o movimento de rua aqui no Brasil ele possui uma força para o Congresso absurda. Então, você tem um certo enfraquecimento na oposição do Lula, que é extremamente forte aonde? No Congresso. E há, portanto, desgaste diante de uma pauta que é trazida de forma muito impopular. Óbvio, isso também tende a beneficiar o governo Lula, o Executivo.”

Boa direita – “Há quem diga, inclusive, que a solução para a esquerda no Brasil, tanto em termos estaduais como nacionais, seria uma boa direita governar. Porque uma boa direita governando, a esquerda surgiria como uma boa protagonista no campo do grupo antagônico, que vai surgir para empurrar o sujeito para poder fazer, tal como no governo FHC, digamos assim.”

A direita e o STF – “Antes a direita ou a extrema direita queria porque queria colocar um ministro no STF que fosse terrivelmente evangélico. Deu certo, mas o objetivo lá dentro não funcionou muito bem. Então, agora é: “Como faremos para poder tirar?”. Ou seja, colocar, de certa forma, não é tão difícil, mas como é que a gente faz para tirar? O movimento é esse. Ter o controle de colocar e também ter o controle daqueles que vão, de certa forma, trazer algum prejuízo em determinadas pautas. Se antes, o Congresso também era um ponto importante para a defesa de algumas pautas, o Senado agora ainda mais.”

Conservadorismo no Congresso – “Eu pesquisei no meu doutorado o cenário da 55ª legislatura. Foi feita uma pesquisa paralela, e isso é muito curioso de a gente poder pontuar do conservadorismo religioso na tomada de algumas decisões do Congresso. Diante de pautas, digamos, morais e de comportamento, eleitores evangélicos e parlamentares religiosos tinham inclinações muito semelhantes. Como a questão do aborto, pautas que trabalhavam a questão da educação sexual ou não. E eles estavam alinhados. Agora, curiosamente, o público religioso, cristão, ele está mais inclinado para pautas que trabalham esses planos mais populares, como a Bolsa Família e coisas similares, em que os congressistas parlamentares se distanciavam nas suas votações.”

Crescimento dos evangélicos – “Nós temos visto nos dias atuais uma possibilidade muito ampla para que a pessoa possa se identificar com a sua religiosidade, com o seu campo, enfim, com a sua espiritualidade. Não à toa que não apenas os evangélicos tiveram um crescimento, mas um crescimento tímido. É importante também salientar isso porque algumas pessoas estavam aguardando um crescimento numérico mais substantivo. Nós não tivemos isso. Foi um crescimento tímido da igreja evangélica. Embora o campo pentecostal seja o campo que mais tem um crescimento no país.”

Sem religião – “Nós temos também o crescimento dos sem religião. São as pessoas que podem até mesmo ter alguma fé, ter alguma crença, mas não estão apenas localizadas categoricamente como pessoas agnósticas, como os ateus, mas são pessoas que também são desinstitucionalizadas. Ou seja, não frequentam templos religiosos, lugares sagrados, vivem a sua fé de forma mais fragmentada. Então, alguns pontos que eu gostaria de trazer sobre esse assunto revela para gente a possibilidade que hoje nós temos de enxergar uma pluralidade que já existia de certa forma, mas hoje numericamente vai ganhando novos tons.”

Católicos e evangélicos – “Há um pesquisador chamado Paul Freston, em que ele diz que os católicos não serão a metade junto com os evangélicos. Isso não vai acontecer. Vai acontecer uma retomada, um fortalecimento da instituição, da Igreja Católica aqui na América Latina, aqui no Brasil. Portanto, dentro desse campo dos números, das pesquisas, há projeções, mas não há bola de cristal. Nós não sabemos porque, assim como a gente tinha, de certa forma, certa inclinação a acreditar num avanço mais substantivo dos evangélicos, isso não aconteceu.”

Teologia da prosperidade – “Olhando, por exemplo, para outros países, dificilmente a gente teria pessoas que frequentariam reuniões de oração, por exemplo, pedindo cura, emprego ou riqueza se o sistema de saúde estivesse funcionando, se tivéssemos em larga escala possibilidade de emprego. Então, tudo depende muito do fator político também. O fator político acaba permitindo ou não certas teologias, certas visões teológicas.”

Guerra cultural – “Guerra cultural é um sistema de crença, que funciona dentro de uma massa, dentro de um determinado grupo, como uma espécie de cimento ideológico. Por que cimento ideológico? É uma finalidade para poder criar uma coesão interna de certa forma, com pautas muito bem estabelecidas, com inimigos muito bem identificados. Esse bloqueio interno é uma espécie de impedir a divergência. É aquilo que o Leon Festinger, já em 1957, vai falar sobre a dissonância cognitiva. É importantíssimo também mencionar esse conceito aqui, porque isso lembra muito a questão das bolhas nos dias atuais. São bolhas criadas em que os sujeitos só vão administrar, absorver, consumir conteúdos que lhe apetecem. Então, qualquer elemento dentro desse grupo que pensar diferente será visto como um traidor desse grupo, dessa bolha.”

Intelectuais responsáveis – “O Norberto Bobbio vai dizer o seguinte: “Não, a gente não precisa mais tocar nesse assunto do intelectual orgânico, porque pode ser que esse intelectual orgânico não consiga enxergar criticamente o seu próprio grupo”. E ele não está nem discutindo, propriamente, a questão do identitarismo. Mas vale, teoricamente, pensar isso. E o que nós precisamos nos dias de hoje? Intelectuais responsáveis. Porque o intelectual responsável também pode falar de dentro, mas ele não idolatra o seu grupo. Ele é capaz de enxergar os vácuos, é capaz de enxergar criticamente o seu grupo para que não haja, portanto, criação de novos ídolos, e também legitimação de equívocos políticos. Então, tratar a linguagem identitária, de crença, de fé, como linguagem acadêmica, é um perigo que nós hoje estamos lidando e é uma realidade que já está sendo vista no ambiente acadêmico.

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