Felipe Manhães: Opinião jurídica
Felipe Manhães - Atualizado em 16/04/2025 13:52
Felipe Manhães
Felipe Manhães / Reprodução
Você sabia que se quiser comprar certas coisas no Brasil, o lojista pode se recusar a vender para você, simplesmente por ser quem você é?
Parece absurdo, discriminação, e é. E infelizmente isso ainda acontece.
Mesmo estando longe do alcance de muitos consumidores brasileiros, lojas como a Hermès e a Ferrari não vendem todos os seus produtos para quem quiser comprá-los, mesmo tendo dinheiro suficiente para pagar, à vista, inclusive.
Essas lojas, que operam no Brasil, fazem uma seleção daqueles clientes que podem comprar certos de seus produtos, levando em consideração a pessoa que indicou, quantos produtos você já comprou da marca, etc.
Na Ferrari, por exemplo, que possui loja oficial em São Paulo, alguns modelos só podem ser vendidos para quem já comprou 3 ferraris, nos últimos 2 anos.
E qual é o problema disso tudo? O Código de Defesa do Consumidor brasileiro prevê, em seu art. 39, IX, que é vedado ao fornecedor recusar a venda de bens, ou a prestação de serviços, diretamente a quem se disponha a adquiri-los mediante pronto pagamento. E considera isso uma prática abusiva.
Ou seja, nenhum lojista no Brasil pode se recusar a vender um produto para você, por qualquer motivo que seja, muito menos por razões discriminatórias, que vão além da prática abusiva e adentra a seara ilicitude.
Imagine uma consumidora dentro da loja da Hermès vendendo uma linda bolsa na prateleira, onde uma vendedora atende uma outra senhora mostrando a mesma bolsa. O consumidor pergunta o preço, olha, e diz que vai comprar uma bolsa. No entanto, a vendedora afirma, na presença de outro cliente, que ela não pode comprar a bolsa pois não é um cliente elegível para ela. Vejam o tamanho do constrangimento.
Além de poder obrigar a loja a vender o produto, o consumidor certamente poderá pleitear danos morais pela humilhação que passou, inclusive na presença de terceiros.
Toda empresa que desejar operar no Brasil deve ter representação aqui, ou seja, um CNPJ, um endereço. É lei. Um dos motivos é que as empresas que cumprem a lei brasileira e os consumidores prejudicados têm como exigir seus direitos de forma eficaz.
Se nos países de origem dessas marcas as leis que protegem o consumidor não tratam como abusivas essas práticas, aqui no Brasil é assim, e elas devem cumprir para operar aqui.
Trazendo para mais próximo da nossa realidade de consumo, é comum ver nos mercados os seguintes cartazes promocionais: “Produto limitado a 2 unidades por CPF”.
No fundo, é o mesmo descumprimento do Código de Defesa do Consumidor, as limitações de venda para quem quer comprar. Mesmo não tendo discriminação quanto à pessoa, o fornecedor não pode, de forma injustificada, decidir quantos produtos cada um vai levar. Essa prática é comum para que os produtos promocionais não sejam vendidos tão rápido, atraindo mais clientes para a loja durante um período de tempo maior.
Apenas quando o estado (União, Estado ou Município) permite o racionamento ou fracionamento da venda de determinados produtos, o fornecedor pode/deve fazê-lo. Sejam em casos de calamidade pública (água, alimentos) ou pandemias, por exemplo, como vimos no caso do álcool em gel.
Caso o consumidor queira adquirir uma Ferrari especial, uma bolsa da Hermès ou 3 caixas de leite condensado, quando forem permitidas apenas duas por CPF, peça ao fornecedor o exemplar do CDC, que deve ser visível e ao alcance dos clientes, e mostre o art. 39, inciso IX, parágrafo ele.

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