Politização das Polícias
06/06/2020 19:58 - Atualizado em 06/06/2020 20:37
No último domingo, dia 31/05, várias manifestações pró e contra o atual governo foram realizadas no país, em mais um capítulo da escalada de tensões e riscos de ruptura institucional que têm sido abertamente discutidas. Porém, o que merece ser destacado é que as polícias militares foram tragadas para o olho do furacão da crise política e ressurgem como protagonistas que podem contribuir tanto para a solução constitucional de garantia da ordem social democrática quanto para insuflar rupturas e respostas violentas. Essa última situação é preocupante e merece destaque.
Muitas críticas foram feitas sobre a forma como policiais trataram os diferentes protestos, sendo muito citado, tendo destaque o que ocorreu na cidade de São Paulo. Enquanto manifestantes pró Bolsonaro tiveram sua manifestação protegida, os manifestantes contra o governo foram duramente reprimidos com bombas de gás lacrimogênio e de efeito moral. Segundo o comando da Polícia Militar, os policiais reagiram à provocações. No entanto, relatos de jornalistas e pessoas presentes contestam essa informação e afirmam que o ato era pacífico até o início da repressão por policiais.
Ontem, 05/06 a repressão violenta se repetiu dessa vez na cidade de Campos dos Goytacazes/RJ. Cerca de 15 manifestantes participavam de um protesto pacífico contra o racismo no centro da cidade quando policiais chegaram e dispersaram os manifestantes com o uso de bomba de gás lacrimogênio. Novamente, segundo relatos de pessoas presentes, a manifestação era pacífica até a ação dos policiais. Nos protestos pró governo que aconteceram na cidade nas últimas semanas não houve repressão similar. Os diferentes tipos de abordagem geraram muitas críticas.
Neste momento, é mais do que nunca necessária a adoção de mecanismos de valorização profissional dos policiais e a separação absoluta entre polícia e política, duas dimensões fundamentais da vida pública de qualquer país. As polícias brasileiras não contam com salvaguardas institucionais que as protejam de interesses político-partidários e muitos políticos são oriundos dessas instituições, tendo muitas vezes grande influência sobre seus integrantes. Isso provoca uma perversa autonomização das instituições e recoloca o risco da perda de controle daquela que é, na prática, a única instituição que pode impor a ordem no território nacional em tempos de paz.
As estruturas policiais precisam estar preparadas para, ao mesmo tempo, garantir os direitos dos policiais e resistir às cooptações e projetos políticos de Poder. Se o bolsonarismo encontra forte eco entre os policiais, eles não podem adotá-lo como referência para a definição do que é legal ou ilegal; do que merece ou não a atenção das polícias. Reiteramos a necessidade de as polícias brasileiras manterem neutralidade político-institucional do debate ideológico para que possam atuar nos estritos termos da legislação, seguindo as boas práticas nacionais e internacionais. Valorizar as polícias implica em fortalecer as estruturas que garantem a atividade policial de forma eficiente e efetiva e, ainda, blindá-las dos cantos das sereias que os políticos, mesmo que oriundos das forças policiais, ecoam.

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    Roberto Uchôa

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